Um médico, uma professora, um padre e uma cientista: Como fazem a gestão do seu dinheiro e poupam em tempos de crise?
Primeiro a Covid-19, depois a guerra na Ucrânia e agora, ainda com efeitos no horizonte, o conflito em Israel, lançaram uma espiral inflacionista e de aumento do custo de vida que pesa no bolso de muitos portugueses. Perante estes imprevistos, é quando quem se precaveu agradece, e quem não tomou medidas para poupar mais se censura.
No Dia Mundial da poupança, a Executive Digest foi falar com quatro profissionais de áreas diferentes e perceber como fazem a gestão dos seus rendimentos e se têm ou não hábitos de poupança: um padre, uma professora, uma cientista e um médico.
Todos são unânimes: quanto mais cedo se começar a poupar, melhor será, e o ideal é começar a criar hábitos mal se comece a ter rendimentos.
O padre Pedro Leitão, de Santa Comba Dão, que é conhecido por ter criado a banda de pop rock ‘Full Glass’, mantém tanto as contas da paróquia quanto as pessoas ‘afinadas’. “Nas minhas despesas pessoais, não tenho uma tabela desenhada, mas sei os gastos fixos mensais que tenho”, indica.
As maiores despesas com que conta são o gasóleo e a alimentação. “Sei sempre que gasto mais de um depósito por semana… São sempre 100 euros. Em termos de alimentação acaba por ser perto desses valores também”, explica o pároco, de 41 anos.
O padre assume que nunca procurou ferramentas de poupança e de investimento e que estas sempre lhe foram propostas pelos bancos. Tem um plano de poupança devido ao empréstimo que fez, associado ao mesmo banco, e tem outro plano ligado ao seguro do carro.
Apesar de não ter partido se sua iniciativa, admite que é uma mais-valia, mas não é uma garantia por si só. “É importante ter alguma capacidade de previsão de despesas e tentar sempre não cair em contas avultadas. Mantenho também uma ‘almofada’, para qualquer imprevisto’”, explica o religioso, que começou a poupar assim que se tornou independente.
Já Virgílio Fonseca, médico especialista em ortopedia, indica à Executive Digest que gostaria de ter começado a poupar mais cedo. Aos 60 anos, conta que abriu a primeira conta poupança por iniciativa própria quando tinha 40 anos. Tem outra por causa de um empréstimo de crédito à habitação e também investe num plano de poupança-reforma, através de uma seguradora.
Este médico tem despesas fixas, como a prestação da casa, alimentação e créditos, e começou a pensar na necessidade de ter uma ‘almofada’ mais recheada quando começou “a achar que o que chegará mais tarde, na reforma garantida pelo estado, não vai ser o suficiente”.
“É importante ter outras fontes de rendimento que garantam uma melhor forma de gozar a reforma”, avisa Virgílio Fonseca.
Por outro lado, Maria Lopes, professora de Inglês de 59 anos, não tem um plano de poupança-reforma, ainda que admita que teria sido interessante e importante investir nessa valência ao longo da carreira. “Divido as despesas fixas com o meu marido. Acaba por não sobrar muito, mas vou pondo de lado em alguns mealheiros”, conta à Executive Digest.
A docente, com 30 anos de carreira em várias escolas da Margem Sul do Tejo, diz que aprendeu com os pais a ter vários mealheiros ou ‘almofadas’ para qualquer imprevisto, e repete a ‘tradição’ familiar.
“Vou fazendo algumas poupanças, para os meses do pagamento do IMI, e planeio mensalmente as despesas. Vou também tendo ‘almofadas’ para outras despesas que possam surgir, mas como o meu orçamento é curto são ‘mini-almofadas’. Com o aumento do custo de vida que temos estado a sentir, e com os acontecimento dos últimos anos, acho que começámos a perceber que podemos ter uma situação financeira estável e , de repente, tudo ir por água abaixo”, admite a professora.
A docente confessa ter ainda alguma resistência em lidar com novas tecnologias, pelo que não usa muito a app bancária para explorar outras opções. Também admite que a falta de literacia financeira é, para ela, como para muitos portugueses, “um obstáculo” na hora de saber onde e quando investir.
O problema da falta de literacia financeira é referido também por Carolina Gonçalves como uma questão que a travou na hora de poupar dinheiro. A jovem de 27 anos é investigadora na área de saúde e ciência farmacêuticas. Após terminar o estágio e começar a trabalhar teve o ‘choque’ com a realidade: a subida das rendas, da eletricidade, pagar água, telecomunicações, gás,… Assim, opta por ter um plano mensal das despesas fixas e por reservar uma percentagem dos ordenado para poupanças.
“Ando agora a informar-me decentemente sobre planos de poupança-reforma e outras soluções de investimento. Já pensei em investir em ações ou em certificados de aforro, mas acho que há ainda em Portugal uma grande falta de educação e de literacia nessa área. E é um duplo risco: para além de podermos estar a perder oportunidade de ter uma vida melhor no futuro, há muita desinformação e muita gente que se aproveita disso para levar a cabo burlas e enganos. É importante também criarmos um filtro do que é ou não legítimo, e procurar informação em fontes fidedignas. É o que tenho procurado fazer”, relata à Executive Digest a cientista.
Carolina tem-se habituado a tirar 10% do ordenado, mais ou menos, para colocar na conta-poupança, deixando sempre uma parte disso para “qualquer eventualidade, como uma avaria no carro, um problema de saúde grave”, mas admite que, para as perspetivas de futuro que se adivinham, “pode ser pouco”.
“É importante começar logo cedo a pensar e a planear o futuro e de que rendimentos vamos viver. E parece-me que manter uma almofada financeira é boa ideia… Comecei a ver isso com o aumento das despesas mensais, nas compras, no gasóleo, nos últimos anos. Se é uma tendência que se mantém, temos que tomar atitudes para nos precaver, porque cada vez sobra menos dinheiro do salário para conseguirmos tirar qualquer coisa para a reforma”, termina a jovem.