Fim do contrato de gás com a Rússia vai complicar o inverno nestes três países da UE
Com o fim do contrato de fornecimento de gás russo através da Ucrânia previsto para o final deste ano, a Europa prepara-se para uma reconfiguração do seu mercado energético. Embora muitos países da União Europeia (UE) já tenham conseguido alternativas ao gás russo, países como a Áustria, a Eslováquia e a Hungria enfrentam um dilema mais complexo, com custos elevados associados à transição para novas fontes de energia.
Desde o início da invasão russa à Ucrânia, a dependência europeia do gás russo tornou-se um problema central. Em resposta, a Europa rapidamente adaptou-se, aumentando a capacidade de importação de gás natural liquefeito (GNL) de países como os Estados Unidos e estabelecendo novos contratos para diversificar as fontes de abastecimento. Em 2023, o gás vindo da Rússia representava apenas 8% das importações da UE, uma queda drástica face aos mais de 40% registados em 2021.
No entanto, para a Áustria, Eslováquia e Hungria, a situação é diferente. Estes países continuam a depender significativamente do gás russo, em grande parte devido à ligação crucial que o gasoduto ucraniano tem fornecido. Com o fim iminente deste contrato, novas alternativas precisam de ser encontradas, mas a transição não será fácil nem barata.
Embora a UE como um todo tenha conseguido reduzir drasticamente a sua dependência do gás russo, o gasoduto que atravessa a Ucrânia tem permanecido como uma rota essencial para alguns países da Europa Central e de Leste. Em 2023, este gasoduto representou apenas 5% das importações totais de gás da UE, mas para a Áustria, Eslováquia e Hungria, ele continua a ser vital.
Samantha Gross, diretora da Iniciativa de Segurança Energética e Clima da Brookings Institution, sublinha em entrevista ao Politico a importância desta rota para os países afetados: “Não é uma grande parte do abastecimento global de gás europeu, mas é uma fonte realmente importante para onde vai.”
A Áustria, por exemplo, continua a depender quase exclusivamente do gás russo, com 98% das suas necessidades energéticas a serem supridas por esta fonte em 2022. Na Eslováquia, o gasoduto também tem fornecido bilhões de metros cúbicos de gás, enquanto a Hungria, embora receba menos gás por esta via, mantém uma dependência profunda da energia vinda de Moscovo.
Alternativas e os custos da transição
Com o fim do contrato em vista, os países afetados terão de recorrer a novas soluções, o que implicará custos significativos. Embora os mercados de GNL estejam mais acessíveis, e países como a Eslováquia e a Áustria já tenham começado a explorar alternativas, como acordos com países vizinhos, a Hungria poderá prolongar a sua dependência do gás russo, canalizado agora através da Sérvia.
Samantha Gross destaca as dificuldades desta transição e explica: “Se esse gás for cortado, estes países estão conectados ao resto da Europa, [então] é possível obter fornecimento. Mas, em vez de estarem na frente do gasoduto… vão estar no fim da linha.” Isso significa que, para a Áustria e a Eslováquia, a obtenção de gás será possível, mas a preços mais elevados. O GNL, por exemplo, tende a ser consideravelmente mais caro do que o gás transportado por gasoduto a partir da Rússia.
Christoph Halser, analista de gás e GNL da RystadEnergy, sublinha que o verdadeiro impacto será sentido nos custos. “É mais uma questão de preço, menos de volume”, considera. Ou seja, enquanto o abastecimento pode ser mantido, o preço a pagar será mais elevado, com as infraestruturas existentes a serem pressionadas a operar mais intensamente, o que também poderá gerar um efeito de escassez no mercado europeu.
O papel da Ucrânia e a incerteza do futuro
Apesar das dificuldades, o gasoduto ucraniano poderá continuar a operar, mesmo após o fim do contrato com a Rússia. A Ucrânia tem mantido negociações com o Azerbaijão, um país rico em combustíveis fósseis, para assumir o controlo do fornecimento através deste gasoduto. No entanto, há questões em aberto sobre a capacidade do Azerbaijão para produzir gás suficiente para substituir os volumes anteriormente fornecidos pela Rússia.
Aura Săbăduș, especialista em mercados de gás da ICIS, alerta ao mesmo jornal que é improvável que o gás vendido como proveniente do Azerbaijão seja inteiramente de origem azeri: “É altamente improvável que qualquer gás vendido como originário do Azerbaijão seja, de facto, de origem azeri.” A produção do Azerbaijão não é suficiente para atender à procura na Europa Central e de Leste, e é igualmente improvável que a Rússia permita a utilização da sua rede de gasodutos para transitar gás através deste território.
Mesmo que o gás continue a fluir através da Ucrânia, os preços deverão aumentar, beneficiando inevitavelmente a Rússia, que poderá continuar a lucrar indiretamente com a venda de gás na Europa, seja através de intermediários ou rebranding.