Gases de origem renovável e garantias de origem
Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros
Estamos neste momento numa fase de arranque da emissão de garantias de origem (GO) para os gases de origem renovável, o que está a cargo da Entidade Emissora das Garantias de Origem (EGGO). E para quem não está dentro destes assuntos perguntar-se-á: o que são garantias de origem? E gases de origem renovável?
Ora bem, de acordo com o DL nº15/2022 de 14 de janeiro, “garantias de origem” trata-se de um documento eletrónico que prova ao consumidor que uma dada quota ou quantidade de energia foi produzida a partir de fontes de energia renováveis (FER). É de referir que a legislação nacional prevê a certificação de quatro tipos de energia: 1) a energia elétrica produzida a partir de FER, 2) a energia para aquecimento e arrefecimento produzida a partir de FER, 3) a energia elétrica produzida em instalações de cogeração que operam em regime eficiente ou de elevada eficiência, e 4) gases de origem renovável e de baixo teor de carbono.
Os gases de origem renovável são uma designação ampla daqueles que geralmente se referem a biogás, biometano, hidrogénio verde, metano sintético, entre outros, que são produzidos a partir de fontes renováveis de energia, e que são relativamente fáceis de armazenar e podem ser produzidos em diferentes quantidades e em diferentes períodos. Estes gases são vetores de energia que podem ser injetados na atual rede de gás natural, permitindo assim a descarbonização da mesma. Acresce a vantagem de que a produção destes gases de origem renovável poder ser realizada de forma descentralizada promovendo a economia regional.
Um produtor de gases de origem renovável e de baixo teor de carbono, é uma entidade registada para o exercício da atividade de produção de gases renováveis (os combustíveis gasosos produzidos a partir de processos que utilizem energia de fontes renovável) e/ou de gases de baixo teor de carbono (os combustíveis gasosos produzidos a partir de um processo que utilize energia de fontes de origem não renovável, mas cujas emissões de carbono sejam inferiores a 36,4 g CO2-eq/MJ), nos termos do Decreto-Lei n.º 62/2020, de 28 de agosto.
Assim, a Rede Elétrica Nacional S.A. (REN) assumiu o papel de EGGO (liquidação física de leilões, controlo e gestão de carteiras), tendo começado no mês de julho já a poder emitir certificados para gases de origem renovável (hidrogénio e biometano), à semelhança do que já acontece com a eletricidade. Este processo será internacionalizado até ao final do ano com a adesão, no setor do gás, à Associação de Entidades Emissoras (AIB), o que irá permitir a importação e exportação destas GO no espaço europeu.
A EEGO está ligada aos restantes países europeus através da AIB. A AIB tem como objetivo desenvolver, utilizar e promover um sistema padronizado de certificação energética e os seus membros podem negociar GO entre diferentes países sem riscos de dupla contagem/atribuição.
A emissão destes certificados para os gases de origem renovável (hidrogénio e biometano) injetados nas infraestruturas de serviço público de gás já se terá iniciado, estando prevista a certificação de energia autoconsumida até outubro. Até ao final do ano, o sistema EEGO deverá estar ligado ao da AIB, permitindo o início das operações internacionais de GO de gases de origem renovável. Embora alguns esquemas de certificação de gases renováveis já estejam operacionais em alguns países da União Europeia e de ocorrerem mesmo algumas trocas bilaterais entre países, não existe ainda um mercado europeu de GO para este setor.
Segundo a REN, para o próximo ano, está previsto o arranque da emissão de Garantias de Origem para instalações de armazenamento, gases off-grid e não renováveis de baixo teor de carbono, assim como o arranque dos leilões de Garantias de Origem para gases de origem renovável. Até ao final do ano prevê-se também a conclusão da adesão formal ao mecanismo europeu de GO (EECS – European Energy Certificate System).
A REN/EEGO assegura o registo e a gestão dos participantes, assim como o registo das instalações, executa a aferição do regime de funcionamento da cogeração e desenvolve ações de fiscalização e auditorias das instalações e equipamentos, sendo que são cobradas taxas para os vários procedimentos. A emissão das GO para as FER é feita em processamento automático com base nos valores das contagens e para a cogeração com base nas declarações de produção submetidas.
A nível europeu, 5 países já emitem GO e concluíram a adesão à AIB. 7 países incluindo Portugal já iniciaram a emissão de GO e deverão concluir o processo de adesão à AIB até ao fim de 2024. A grande maioria dos países emite GO apenas para o biometano, apenas 6 emitem para hidrogénio e 4 para todos os tipos de gases. Alguns países aguardam ainda publicação de legislação específica.
Sendo que o mecanismo de funcionamento da EEGO está ainda dependente da publicação de normas regulamentares, algumas dependentes de alterações legislativas e transposições de diretivas, é muito importante que se acelerem esses passos. É também necessário proceder à contratação de auditores habilitados e aumentar o grau de coordenação com todas as entidades envolvidas. Só assim se chegará a bom porto neste domínio…