ISCTE Executive Education: “A formação é um investimento. Não é um custo”
O Iscte Executive Education tem um propósito bem definido: formação com impacto e com um enorme compromisso transformacional para as organizações. Em entrevista à Executive Digest, José Crespo de Carvalho, fala sobre a estratégia da instituição na preparação dos líderes para os desafios futuros.
Que tendências de oferta e procura estão agora a ser introduzidas nos programas de formação de executivos? Vai haver novidades para o segundo semestre do ano?
Tendências em formatos e em tecnologia. Em formatos com menos aulas convencionais e mais hackatons, bootcamps, speed challenges, simulações, teatro, entre tantos outros. E em tecnologia com a introdução de inteligência artificial em praticamente todos os programas.
Uma tendência transversal, que vem de muito longe, é procurar manter a proximidade docente-aluno e manter o espírito relacional e a criação de network. Queremos o primado humanista a funcionar.
Para além disso, vamos sempre dar importância à internacionalização que é o pilar número um em termos estratégicos bem como ao Executive MBA porquanto é o nosso flagship program. Não por ser mais importante que outros. Mas porque é um primeiro emblema do que queremos para os nossos programas: acreditado, ranked by Financial Times e com um perfil de construção de conhecimento e de pessoas, seres humanos, pretendendo nós uma experiência transformacional a sério.
E como estamos do ponto de vista dos formatos? Os programas customizados continuam a ter um peso substancial do ponto de vista da procura?
Nos programas customizados o formato é mandatório, claro. Se bem que como sempre digo há empresas muito interessadas no formato, o que é bom porquanto querem impactar as suas pessoas, e há outras mais interessadas no conteúdo o que, per si, e hoje em dia, é menos impactante. Mas há lugar para todas.
Agora, o formato faz cada vez mais sentido ser pensado com cuidado, adaptado à cultura a desenvolver e estruturado por forma a que se possa ter impacto. Não estamos na formação a metro. Estamos na formação com impacto e com um enorme compromisso transformacional para as organizações. Isso implica que os formatos são decisivos. E se tivermos de ser um bocadinho intrusivos para construir melhores pessoas, não iremos deixar de o fazer. Colocar o coração de todos do lado certo.
Quais são os novos desafios da formação para encontrar o equilíbrio inter-geracional que já existe nas empresas?
O equilíbrio é isso mesmo. É misturar gerações. É o que há de mais rico. Ter um cohort com pessoas de 60 anos ao mesmo tempo de pessoas de 30 é muitíssimo rico. Passados diferentes, experiências diferentes, percepções do mundo diferentes, necessidades diferentes. Essa exigência e multidimensionalidade é fundamental para criar riqueza. Turmas homogéneas é actualmente um princípio que deve ser combatido porquanto não é isso que o mundo nos oferece.
Agora há coisas muito interessantes e que valorizamos muito. Para além das diferenças culturais inter-geracionais – que valorizamos – queremos também as diferenças culturais internacionais – que igualmente valorizamos. Estaremos sempre mais satisfeitos quanto maior for o melting pot de pessoas e cultural. E estaremos tanto mais comprometidos quanto soubermos que estamos a percorrer esse caminho. Porque é o caminho que faz sentido para uma escola de negócios num país como Portugal. Pequeno e aberto ao exterior.
E continuando no tema do envelhecimento da população, há uma procura acrescida por parte das pessoas mais “experientes”? E em que áreas/temas?
Claro que há. E acho que o mais espantoso de tudo é que os mais experientes querem as áreas mais novas como a inteligência artificial, por exemplo. Temos alunos na faixa dos 70 anos. E isso é fantástico. Prova de que a aprendizagem é para toda a vida. E talvez as pessoas mais experientes, precisamente pela experiência, percebam melhor isto que os mais novos. Não precisamos de últimas bolachas do pacote. Precisamos de seres humanos de todas as idades. E procuramos sempre combater o idadismo como forma de exclusão.
E o tema dos fluxos migratórios já está a impactar nas vossas acções? Já estão a ser pedidos acções específicas pelas empresas?
Para terem um número, nós não trabalhamos apenas com Portugal porquanto 40% da nossa facturação em 2023 veio de fora de Portugal, do internacional. Isto significa, antes de responder à questão, que estamos muito habituados a lidar com muitas nacionalidades e com um mundo global. Os fluxos migratórios e a retenção são uma questão, mas os outros fluxos migratórios, ou intra-migratórios, também são uma questão por causa da necessária aculturação. E, por isso, o importante não são os fluxos. Os fluxos e a ida para fora ou a entrada em Portugal é normal. Ir para fora é sinal de que fazemos o nosso trabalho, nas universidades, bem feito. E que as empresas internacionais se interessam pelo nosso “produto”. O que nos deve preocupar é antes a retenção, de portugueses e não portugueses, a aculturação e o trabalho de cultura e cola cultural em ambientes cada vez mais multiculturais.
Os objectivos para os próximos anos são absolutamente críticos e o fundamental de tudo isto é sabermos estar muito atentos às tendências, incorporá-las e tirar partido das oportunidades que trazem.
Há quem diga que em Portugal, um mercado pequeno, tudo se centra muito à volta da liderança, deixando um pouco de lado as competências mais técnicas, o pensamento crítico, a resolução de problemas complexos ou até a criatividade. Qual a vossa visão sobre este assunto?
A visão do mercado pequeno só é ultrapassada quando vamos para fora. Repito, 40% da nossa facturação em 2023 veio de fora. Queremos mais. Não queremos e não podemos viver só de Portugal. E bastará uma análise simples para perceber que se as universidades ficarem por Portugal – lendo as pirâmides etárias e sua evolução – daqui a muito poucos anos não terão mercado. Terão de se fundir – e isso devia acontecer com ou sem mercado – ou pelo menos criarem pontes e ligações e colaborações fortes e complementares para desenvolverem de forma mais sustentada o hub de ensino superior em Portugal que esteja projectado para o mundo.
Quanto à liderança como tema focal ele tem, de facto, um espaço muito particular em Portugal e entre nós. Lá fora também tem mas há um equilíbrio maior entre formação mais técnica e liderança. Qual a minha opinião sobre isto? Tem tudo a ver com duas vertentes: retenção (difícil em Portugal, talvez mais difícil pelos baixos salários que se pagam), pelo que se precisam de líderes que sejam capazes de reter e fazer convergir pessoas para objectivos comuns, e referências e valores, sintoma de que a cola cultural nem sempre está bem trabalhada. Isto para além de uma questão muito crítica a ser endereçada que é a do trabalho remoto.
Nesse sentido, o que pode ser feito pela vossa instituição para aumentar a percepção do valor acrescentado na formação?
A formação é um investimento. Não é um custo. Deve ter um impacto e um payback. E é assim que devemos e queremos ser avaliados. Tudo o resto é poesia. Fazer formação a metro e sem medir impacto não é para nós. Preferimos fazer menos e melhor do que muito e sem impacto. Impacto na retenção, impacto na capacidade de decisão, impacto na autonomia, impacto no lado humanos das pessoas que nos procuram.
A percepção do valor acrescentado, porém, deve ser aquilo que é. Ou seja, nem mais alta nem mais baixa do que o que oferecemos. Não dizemos aos nossos participantes que são a última bolacha do pacote. Mas dizemos-lhes, por exemplo, que se quiserem podem fazer a diferença enquanto seres humanos. E se a isso somarem mais autonomia e capacidade decisional pois teremos mais motivos para nos orgulharmos disso mesmo.
E como se encontram os processos e projectos de exportação de programas para executivos?
É o ponto 1. da nossa estratégia. Internacionalizar, internacionalizar, internacionalizar. Para a semana, para lhe dar um exemplo, teremos franceses, ingleses, brasileiros, sírios, chineses e indianos no nosso edifício. E todas as semanas queremos ter mais e mais nacionalidades.
Portugal é um país com as características fantásticas que conhecemos. Temos de as saber aproveitar para chamar pessoas de todo o mundo para a nossa formação. Cada player com as suas idiossincrasias, mas a realidade é esta: nós temos tudo, tudo mesmo, para ser um dos melhores players mundiais na área de edução. E o caminho que fizemos de há uns anos a esta parte claramente o demonstra. A comprovação para isto? Somos grandes exportadores do nosso produto, os nossos alunos, e as grandes empresas multinacionais vêm-nos buscar. Portanto, isso significa, queira-se ou não, que o ensino superior e a formação de executivos ligada às universidades estão a fazer um bom trabalho. Podemos fazer mais? Claro que podemos. E devemos. >> José Crespo de Carvalho, presidente do Iscte Executive Education
Este artigo faz parte do Caderno Especial “MBA, pós-graduações & formação de executivos”, publicado na edição de Maio (n.º 218) da Executive Digest.