Boris Nadezhdin, o político veterano agregador da oposição a Putin e à guerra

Boris Nadezhdin é quase um veterano da política russa, mas graças à sua mensagem contra Vladimir Putin e a guerra na Ucrânia a sua candidatura às eleições presidenciais russas de março vem reunindo apoios e gerando entusiasmo popular.

Com o mais destacado oposicionista russo, Alexei Navalny, detido numa prisão de alta segurança, e o mais jovem Vladimir Kara-Murza condenado no ano passado a 25 anos de cadeia, a oposição ao Kremlin debate-se com dificuldades para encontrar uma figura de referência, papel que cabe cada vez mais a Nadezhdin.

Nadezhdin anunciou na terça-feira que já recolheu mais de 100 mil assinaturas, número necessário para se registar oficialmente como candidato às eleições, e o site informativo russo Bloknot considera-o o primeiro teste verdadeiramente sério de força da oposição russa a Vladimir Putin, dentro do país e também a exilada. 

“Quase todos se uniram num apelo para assinar por Nadezhdin, mesmo que para isso tivessem de ‘tapar o nariz’. Ele é o único que defende abertamente o fim da guerra, o que já é bom”, refere o site. “Dizem que ele é o primeiro candidato que irá realmente recolher assinaturas em seu apoio usando dinheiro não de algumas grandes fundações e corporações, mas de ‘dezenas de milhares’ de russos que lhe enviam dinheiro ganho com o suor do rosto para custear a sua campanha”, adianta a mesma fonte acerca do candidato da Plataforma Cívica.

Nadezhdin possui destacada formação académica, em áreas tão distintas como Direito, Física e Matemática. Hoje com 60 anos, era já visto como um veterano, tendo integrado o governo russo em 1997-1998: primeiro, como assistente do então vice-primeiro-ministro, Boris Nemtsov; depois, como secretário do primeiro-ministro, Serguei Kirienko, que agora é o responsável por toda a política interna do país, incluindo as eleições presidenciais de março.

Em dezembro de 1999, Nadezhdin foi eleito para a Duma Estatal pela União das Forças de Direita, uma formação em que militavam Nemtsov, a actual mulher de negócios Irina Khakamada, bem como personalidades hoje leais ao Kremlin, casos de Anatoli Chubais e Serguei Kirienko.

Em 2003, não conseguiu ser reeleito para a Duma Estatal e, como ele mesmo diz, assumiu a oposição a Putin, após a prisão do oligarca Mikhail Khodorkovsky, recorda o Bloknot.

Nemtsov foi assassinado em 2015, nas imediações do Kremlin, juntando-se o seu nome ao de dezenas de oposicionistas que ao longo dos mandatos de Putin como Presidente ou primeiro-ministro (desde 1999 até hoje) foram desaparecendo em circustâncias misteriosas – baleados, envenenados ou em quedas de grandes alturas qualificadas pelas autoridades como “suicídios”.

Depois de deixar a Duma Estatal, era popular apenas na localidade de Dolgoprudni, perto de Moscovo, onde foi deputado municipal durante muitos anos. E também em debates televisivos, aparecendo regularmente como representante da ala liberal, até ao ano passado.

De acordo com o Bloknot, Nadezhdin tentou retornar à política de diferentes maneiras – desde tentativas fracassadas de reviver a União das Forças de Direita, até à participação nas primárias da Rússia Unida e à cooperação com os Socialistas Revolucionários.

Hoje, destaca-se dos demais candidatos por considerar necessária a saída de Putin da Presidência russa e por se opor à guerra na Ucrânia, que afirma estar a conduzir o país ao “isolamento, autoritarismo e militarização”.

“A minha tarefa é travar o deslize da Rússia nessa direção”, afirmou.

Nas cidades russas e também nas do estrangeiro onde há grandes comunidades russas, há filas de pessoas que querem deixar assinaturas em seu apoio. “E, pela primeira vez desde o início da ‘operação militar especial’ [designação usada pelo Kremlin para a invasão da Ucrânia], os ‘bloggers’ da oposição uniram-se para garantir que Nadezhdin angarie as assinaturas necessárias para ser registado pela Comissão Eleitoral Central”, adiantou o Bloknot.

Os que quiseram subscrever a sua candidatura “formaram longas filas, não apenas nas grandes cidades, como Moscovo, São Petersburgo ou Novossibirsk, mas também nos principais ‘ninhos’ da nova emigração russa, como as cidades bálticas, Tbilissi, capital da Geórgia, ou Ierevan, capital da Arménia”.

Isto é possível, já que, de acordo com a lei, a Comissão Central Eleitoral não verifica onde se localizam os autores das assinaturas.

Nadezhdin está a contar com assinaturas de milhares de russos que fugiram para a vizinha Geórgia após a invasão da Ucrânia. Segundo a agência noticiosa espanhola EFE, que cita Maxim, coordenador da associação de russos na Geórgia (Frame), as assinaturas recolhidas serão, posteriormente, enviadas para Moscovo para serem entregues às autoridades eleitorais.

Maxim, 42 anos, é um dos cerca de 60 mil russos que, segundo dados do Ministério do Interior da Geórgia, chegaram ao país depois de 24 de fevereiro de 2022, quando o Presidente russo, Vladimir Putin, enviou tropas para a Ucrânia.

“Saí de São Petersburgo, a cidade onde nasci, em protesto contra a guerra”, diz o coordenador do Frame, que sublinha que a candidatura de Nadezhdin é uma “oportunidade para mostrar que há alternativas a Putin”.

Mas, dado o controlo do aparelho eleitoral pelo Kremlin e a grande disponibilidade de meios – que contrasta com a escassez dos da oposição – prevalece nos media russos a opinião de que Nadezhdin não irá longe.

Para ser registado, o candidato do partido Iniciativa Cívica deve apresentar 100.000 assinaturas às autoridades eleitorais até 31 de janeiro. Segundo o portal da Iniciativa Cívica, foram recolhidas assinaturas em 75 regiões da Rússia.

No domingo, Mikhail Khodorkovsky, magnata da oposição russo exilado, apelou a todos os opositores do Kremlin para que apoiem a candidatura de Nadezhdin antes das eleições de março.

Segundo Khodorkovsky, outrora o homem mais rico da Rússia até ser detido e posteriormente condenado a 10 anos de prisão em 2003, esta é uma forma de os russos expressarem a sua posição anti-guerra, mesmo que não gostem de Nadezhdin como político.

A figura de Nadezhdin foi apoiada por vários opositores russos e também pela jornalista Yekaterina Duntsova, a quem a Comissão Eleitoral Central da Rússia negou a pré-seleção como candidato presidencial.

O destino do opositor, bem como dos outros oito candidatos que recolhem assinaturas, ficará claro depois de 31 de janeiro, quando a Comissão Eleitoral encerra a aceitação de candidaturas e “dará início à depuração das assinaturas”. “Provavelmente, Nadejdin sofrerá com isso”, afirma o Bloknot