Voltas e reviravoltas legislativas

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

O tema em discussão está relacionado com a utilização da biomassa para fins energéticos. Mais especificamente, o que todos pretendemos é uma utilização sustentável da biomassa florestal residual (BFR). Para isso existe todo um edifício legislativo criado. Mas que por vezes se contradiz. E isto não é bom para os agentes económicos e os cidadãos em geral.

A Resolução da Assembleia da República (RAR) nº 42/2021 de 3 de fevereiro recomendou ao Governo a reformulação do modelo de apoios públicos a atribuir às centrais de biomassa florestal em função da utilização sustentável e ecológica da BFR. Esta resolução baseou-se na auscultação de vários especialistas cujo diagnóstico era o de que não havia BFR suficiente para alimentar o crescimento de centrais a biomassa, referindo-se mesmo que a indústria consumia bastante acima daquilo que a floresta portuguesa podia fornecer de forma sustentável.

Talvez por isso o Decreto-Lei (DL) 64/2017 de 12 de junho, no seu artigo 2º prevê que as centrais a biomassa possam usar material proveniente das chamadas culturas energéticas. Estas são culturas florestais de rápido crescimento cuja produção e gestão florestal aponta para rotações inferiores a seis anos e dedicada à produção de energia elétrica ou térmica.

Porém a citada RAR recomenda que se zele para que a licença de exploração deste tipo de centrais seja apenas atribuída àquelas cujo aprovisionamento não recorra a estas culturas energéticas. Isto logo no seu início, mas no seu ponto 5 já refere que se deve assegurar que as centrais em funcionamento utilizem maioritariamente BFR excedentária… pois, o diabo está nos pormenores! E, apesar de ter havido uma alteração posterior ao DL 64/2017, esta realidade não parece ter sido considerada.

Se não se querem culturas energéticas, porque não considerar a utilização das espécies invasoras? E as árvores com pragas e doenças que ficam na floresta a contaminar a restante população?

Também a referida RAR avançou no sentido de promover sistemas agroflorestais resilientes nos quais uma parte da BFR possa ser incorporada ou mantida nos solos, como matéria orgânica fundamental para a fixação de carbono, formação de habitats, evitar a erosão hídrica, evitando o desequilíbrio dos ecossistemas. Esta ideia tinha por base a noção de que com a política anterior toda a BFR deveria ser retirada e valorizada economicamente, o que era uma impossibilidade prática.

Alguns agentes políticos consideram haver uma competição entre diferentes fileiras pela BFR. A legislação ziguezagueia. Assim estamos nós!

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