Empresas estão a perder a paciência com o teletrabalho e já estão a ameaçar trabalhadores para regressarem aos escritórios

A pandemia da Covid-19 veio acelerar a digitalização em vários setores, especialmente nas empresas, e permitiu que muitos trabalhos passassem a ser feitos remotamente, instituindo a possibilidade de teletrabalho em várias funções que, até então, nunca tinham laborado neste modelo. No entanto, volvidos dois anos do levantamento de medidas, as empresas já não sabem o que fazer para que os trabalhadores voltem a adotar as ‘velhas rotinas’ e regressem ao escritório regularmente.

Primeiro houve muitas que aliciaram os funcionários com benefícios ‘extra’, como comida ou fruta no escritório, serviços de lavandaria, ioga, ginásios ou outras regalias, mas agora há quem já esteja a recorrer a ameaças, para forçar os trabalhadores a abdicar da flexibilidade a que se habituaram.

Mesmo grandes empresas do setor da tecnologia, outrora ‘campeãs’ do trabalho remoto, estão agora a tentar mudar o paradigma – verificando grande resistência. A Zoom, recentemente pediu aos funcionários que vivem a 80 quilómetros de um escritório da empresa que voltem pelo menos duas vezes por semana ao espaço enquanto a Meta, dona do Facebook, recentemente atualizou a política de regresso ao escritório, e comunicou aos funcionários que arriscam despedimento de não começarem a aparecer nas instalações da empresa pelo menos três dias por semana, já a partir de hoje.

O Washington Post relata também o caso da Amazon, em que os funcionários que ainda estavam em teletrabalho (por opção) têm de escolher entre mudar para o escritório, ou abandonar o emprego, perante um aumento do custo de vida. Andy Jassy, presidente-executivo da Amazon terá dito recentemente numa reunião que, se um funcionário não puder comprometer-se em ir ao escritório pelo menos três dias por semana “então provavelmente não vai funcionar na Amazon”.

Alguns executivos argumentam que este novo modelo que popularizou o teletrabalho está agora a originar uma diminuição na produtividade e uma redução de oportunidades de colaboração espontânea, orientação e construção de relações interpessoais e profissionais.

“O pendulo mudou e os funcionários passaram a ter todo o poder. Durante a pandemia, tínhamos vendedores a atender chamadas no topo das montanhas, durante caminhadas. Mas isso agora já não está a funcionar”, aponta Matt Cohen fundador e sócio-gerente da Ripple Ventures, um fundo de risco em Toronto, no Canadá.

Danielle Stickler, porta-voz da Zoom defende que uma abordagem “híbrida estruturada” é mais eficaz, enquanto a Meta quer que as equipas priorizem o tempo juntas para promover “uma colaboração mais forte e uma cultura empresarial vibrante”. Já a Amazon assegura estar a fornecer “apoio à relocalização” de funcionários que são convidados a mudar de hábitos, assinalando que representam “uma percentagem relativamente pequena” de toda a sua força laboral.

Nos EUA, mesmo com milhões de trabalhadores a receberem pedidos para voltarem aos escritórios, nas 10 principais áreas metropolitanas do país, a ocupação efetiva dos escritórios estava, no mês passado em 47,2%, menos de metade e pouco acima dos 44% registados há um ano.

Cerca de 52% dos trabalhadores norte-americanos com capacidade para fazerem teletrabalho têm acordos híbridos, segundo Gallup, enquanto menos de um terço (29%) desenvolvem funções exclusivamente através de forma remota. E mesmo que muitos argumentem a quebra de produtividade, dados do Gabinete de Estatísticas do Trabalho mostram que a produtividade do trabalho aumentou 3,7% nos EUA, no segundo trimestre de 2023, e atingiu um valor 1,3% superior ao mesmo trimestre do ano passado.

Por outro lado, também o trabalho remoto está a ser cada vez mais difícil de encontrar: nos EUA, apenas cerca de 8% de todas as ofertas de emprego anunciam trabalho remoto ou híbrido, segundo a Even Hiring Lab, uma queda face aos 9,7% do ano passado.

O problema já chegou até à Casa Branca: Biden apelou recentemente para que os funcionários do Gabinete do Presidente dos EUA regressassem aos escritórios já este outono. Os casos multiplicam-se noutros organismos federais: os dados de julho revelam que 17 das 24 agências federais tinham uma utilização de edifícios média de 25% ou menos, ou seja, só perto de um quarto dos escritórios governamentais estão de facto a ser usados pelos funcionários.