Desvendada a causa da hepatite aguda infantil de origem desconhecida

Uma reação anormal do sistema imunitário que ocorre normalmente na presença do vírus AAV2 é a causa da hepatite aguda que afetou mais de mil crianças em 35 países no último ano e cuja origem tem sido, até agora, um enigma.

Contudo, foram hoje apresentadas três investigações independentes e distintas feitas no Reino Unido e nos Estados Unidos da América (EUA), os dois países mais afetados, num artigo publicado na revista Nature, cujos resultados mostram que o vírus AAV2 encontra-se em quase todas as crianças que foram contagiadas e apenas numa pequena percentagem de crianças saudáveis.

O AAV2 deve ser acompanhado por uma infeção com outros vírus e, em muitos casos, por uma predisposição genética, para desencadear a hepatite, segundo a análise. A coincidência entre o aumento dos casos de hepatite infantil com o fim das restrições pandémicas, e o seu declínio nos meses seguintes, sugere que a Covid-19 pode ter contribuído para o fenómeno.

O vírus AAV2 pode ser necessário, mas não suficiente para desencadear a hepatite. “Novos casos deixaram de aparecer há meses”, relatou a hepatologista do hospital Vall d’Hebron em Barcelona, Maria Buti, citada pelo jornal La Vanguardia.

Os primeiros casos tornaram-se conhecidos em abril do ano passado, quando crianças com menos de cinco anos foram internadas em hospitais no Reino Unido com transaminases anormalmente elevadas, frequentemente com icterícia, por vezes com vómitos e algumas progrediram para insuficiência hepática aguda.

Dos 1.010 casos notificados à Organização Mundial de Saúde (OMS) até ao dia 8 de julho de 2022, 46 receberam um transplante de fígado e 22 morreram. Em Espanha, foram notificados 40 casos, um dos quais recebeu um transplante.

A primeira hipótese apontou o adenovírus 41 como uma possível causa para estes casos de hepatite após a presença deste patogéneo em crianças afetadas ter sido analisada, no entanto, esta possibilidade não foi confirmada.

As três novas investigações realizaram uma análise metagenómica, que consiste em sequenciar todo o material genético de uma amostra sem assumir que patogéneo pode ser encontrado, o que torna possível a identificação de vírus que não são suspeitos a priori.

Num primeiro estudo conduzido pela Universidade de Glasgow, o vírus AAV2 foi detetado em 81% das crianças afetadas e em 7% em crianças saudáveis, provando assim que o facto de existirem casos com AAV2 e sem hepatite mostra que o microrganismo não é suficiente para causar a doença.

Cerca de 93% das crianças doentes apresentaram uma variante genética que as predispôs a doenças autoimunes relacionadas com a célula T. A presença do vírus AAV2 em células hepáticas alteradas rodeadas por células T imunitárias indica que o vírus tem um papel fundamental na hepatite aguda.

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