Auge e queda do Segway: recorde o veículo que ia mudar o mundo e que acabou um fracasso

Nos últimos anos, a mobilidade urbana enfrentou uma verdadeira revolução, com o surgimento e polarização das trotinetas elétricas: este sistema de transporte elétrico e sustentável tem mudado a forma como nos deslocamos nas cidades, reduzindo os engarrafamentos e encurtando as distâncias.

No entanto, antes das trotinetas, houve outro veículo que tentou conquistar a micromobilidade: o Segway.

Este icónico meio de transporte, recorda a publicação espanhola ‘El Economista’, tentou conquistar o mundo no início do século XXI. Era uma espécie de trotineta giroscópica, elétrica, individual, com duas rodas laterais, com balanceamento automático e aparência futurista. Quando foi apresentado em 2001, as expectativas eram excessivas – foi classificada como uma invenção revolucionária, que poderia até tirar os carros das cidades graças aos benefícios que prometia em termos de sustentabilidade, menor consumo e limitação de espaço.

Por trás deste projeto estava o inventor Dean Kamen, que o desenvolvia desde os anos 90. O CEO da Apple, Steve Jobs, até garantiu que as cidades seriam construídas em torno desse meio de transporte. O investidor John Doerr previu que seria o produto mais rápido a atingir 100 mil milhões de dólares em vendas – para Kamen, seria para o carro o que esteve foi para o cavalo.

O veículo revolucionário foi apresentado no final de 2001. Esses primeiros modelos podiam atingir velocidades de até 16 quilómetros por hora. A expectativa era tanta que os três Segways utilizados no evento foram leiloados na Amazon, e chegaram aos 100 mil dólares cada – a procura esperada era tão alta que projetaram uma fábrica em Bedford com capacidade para produzir até 40 mil unidades por mês.

A deceção

No entanto, o otimismo dura apenas alguns meses: eram esperadas vendas de 40 mil veículos no primeiro ano, quando na realidade venderam-se 6 mil. Tinha dois problemas sérios: o preço, já que cada um custava cerca de 5 mil dólares, e a autonomia, muito abaixo do esperado. E assim que ficou disponível ao público, surgiram mais dúvidas: o que acontece se chover? Onde pode ser deixado? Como faço para carregar as suas baterias?

Ainda assim, e apesar da desilusão e das dúvidas, os investidores privados continuaram a apoiar o projeto, com um financiamento de 90 milhões de dólares.

Teve sucesso relativo nos meios de comunicação social e pode-se ver, por exemplo, o vice-presidente Dick Cheney a passear pela Casa Branca num Segway, quando teve problemas com o calcanhar de Aquiles. Também chega a acordo com a Correos, para que seus entregadores pudessem utilizá-lo, e com a Disney, que o possui nos seus parques de diversões. Mas, realmente, fora destas empresas e de alguns serviços turísticos, não gerou muito interesse.

Problemas de segurança

Se as coisas já iam mal, tudo fica ainda mais complicado por causa da segurança, que foi sempre o seu grande défice. A imagem do presidente americano George W. Bush a cair, numas férias em casa dos pais, não ajudou à imagem da empresa.

E apenas 21 meses após o seu lançamento, ordenaram a retirada voluntária de todos os Segways, devido a um problema de segurança, reconhecendo que, em determinadas circunstâncias, especialmente quando a bateria estava fraca, poderia provocar a queda do condutor. As pessoas ficaram com medo dos Segways.

Os acidentes não foram excecionais: na verdade, mais de 9 mil pessoas por ano ficaram feridas por este veículo, isto só nos Estados Unidos – era um verdadeiro perigo nas calçadas, levando em consideração o seu peso, que ultrapassava os 40 quilos, e a velocidade que conseguia atingir. À medida que aumentam as reclamações sobre acidentes, a pressão aumenta e muitas cidades decidem legislar e limitar o uso de Segways.

Em 2004 as coisas começam a ficar muito más: as vendas não aumentaram e a empresa fica sem dinheiro – numa nova ronda de financiamento, consegue 30 milhões de dólares, e hipoteca a fábrica. Em 2006 lançaram a nova geração de veículos, que tirou muitas dúvidas dos utilizadores, com uma velocidade maior, de até 20 quilómetros por hora. Começam a fabricar modelos específicos para campos de golfe e outros para a polícia. A empresa afirma que as vendas cresceram 50% nesse período.

O acidente

O momento mais trágico para a empresa ocorreu em 2010. Um ano antes, Kamen havia vendido a empresa para Jimi Heselden, empresário britânico que fez fortuna com uma invenção alternativa aos sacos de areia usados ​​pelo exército. No entanto, à frente da empresa há menos de um ano, Hedelsen perdeu a vida num acidente com o seu Segway.

Este acidente não foi o melhor para a imagem da empresa. Com receitas decrescentes e nenhum plano para o futuro, os herdeiros de Heselden venderam a empresa por 9 milhões de dólares a Roger Brown, empresário do Tennessee, que confiou na força de uma marca global com canal de distribuição próprio.

Há uma história curiosa dos primeiros passos de Brown na empresa: numa ida à sede, na primeira semana, decidiu passear pelo escritório num Segway e foi avisado por uma funcionário que circular assim nos corredores, e sem capacete, era perigoso. Brown não teve outra escolha que não dizer-lhe que era o dono da empresa – no entanto, poucas horas depois, recebeu um email do departamento de Recursos Humanos, a lembrar-lhe que era obrigatório o uso de capacete.

Demorou um ano para trazer lucros ao Segway, para a vender em 2015, por cerca de 75 milhões de dólares, para a Ninebot, empresa chinesa com a qual teve diversos conflitos jurídicos, com acusações de desrespeito a patentes e direitos de autor.

No entanto, a chegada das trotinetas elétricas colocou o último prego no caixão do Segway. Ofereceram muitas vantagens aos utilizadores, desde melhor preço, mais conforto, menor risco ou maior facilidade de uso. Se a Segway vendeu 140 mil veículos nos quase 20 anos de vida, a trotineta elétrica vendeu mais de 1 milhão só em 2018. A batalha estava perdida. Dada a baixa procura, em 2020, a empresa anunciou o fim da produção.

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