Vivemos uma era em que a velocidade da mudança ultrapassa muitas vezes a capacidade de adaptação das organizações. A transformação tecnológica, os novos comportamentos sociais, a crescente pressão por sustentabilidade e a globalização de mercados estão a reescrever os modelos de negócio — e, inevitavelmente, a redefinir também o papel dos líderes.
Já não basta comandar equipas e assegurar resultados. O líder contemporâneo é chamado a inspirar, a criar propósito, a orquestrar redes complexas, a equilibrar razão e emoção e a antecipar cenários num ambiente onde a volatilidade é a nova norma.
Em entrevista à Executive Digest, Luís Rasquilha, Presidente do Conselho Superior da TBS | The Business School, analisa as grandes transformações no perfil dos líderes, as competências que se tornaram essenciais na última década e as tendências que irão moldar o futuro da liderança e da gestão nas organizações.
A liderança está a mudar — quais são, na vossa perspectiva, as maiores transformações no papel dos líderes nas organizações?
O papel dos líderes nas organizações está a passar por uma transformação profunda, impulsionada por mudanças tecnológicas, sociais, culturais e ambientais.
Hoje, liderar é menos sobre controlo e direcção e mais sobre inspirar, orientar e adaptar. E as maiores transformações no papel dos líderes são a nosso ver:
- De “chefes” para curadores de propósito: Antes o líder era a autoridade máxima, focado em resultados, comando e execução. Agora é um guardião do propósito, que dá sentido ao trabalho e conecta as pessoas a uma missão maior.
Exemplo: líderes que falam menos sobre metas trimestrais e mais sobre impacto social, legado e propósito organizacional.
- De gestores de pessoas para líderes de ecossistemas: O ambiente de trabalho expandiu-se: freelancers, IA, parceiros, comunidades. O líder precisa orquestrar redes e influenciar sem autoridade directa. Competência central: gestão de stakeholders e colaboração transversal.
- De racionais a emocionalmente inteligentes: A liderança moderna requer empatia, escuta activa e vulnerabilidade. O líder passa a ser um facilitador de emoções e bem-estar, não apenas de tarefas. Ferramenta essencial: inteligência emocional e social.
- De planeadores a aprendizes adaptativos: Num mundo volátil, o plano perfeito não existe. O líder precisa de ser curioso, aprender rapidamente e ajustar estratégias em tempo real. Capacidade-chave: desaprender o que não serve e experimentar o novo.
- De decisores individuais a mediadores entre humanos e tecnologia: A IA, automação e dados estão redefinindo decisões e poder. O líder agora actua como ponte entre humanos e máquinas, garantindo ética, confiança e propósito tecnológico. Nova competência: literacia digital e pensamento crítico sobre o uso da tecnologia.
- De local a global e sustentável: As fronteiras entre mercados, culturas e causas desapareceram. O líder precisa pensar globalmente e agir com responsabilidade ambiental e social. Exemplo: decisões de negócio alinhadas aos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
- De líder do presente a visionário do futuro: O líder precisa pensar cenários, foresight e tendências, antecipar o que vem. É um narrador de futuros possíveis, capaz de mobilizar pessoas para se prepararem e inovarem antes da mudança chegar.
- De figura pública a espelho da cultura: O comportamento do líder define a cultura da empresa. Mais do que nunca, as equipas esperam coerência entre discurso e prática. Valor emergente: autenticidade.
Que competências de liderança se tornaram críticas nos últimos anos e que antes não eram tão valorizadas?
Nos últimos anos, o contexto de incerteza, transformação digital e mudança social fez emergir novas competências de liderança que antes eram secundárias (ou até irrelevantes) — e que hoje são críticas para o sucesso.
- Adaptabilidade e aprendizagem contínua: Antes valorizava-se estabilidade, planeamento e previsibilidade. Agora, o líder precisa ser flexível, curioso e capaz de desaprender. Aprende com erros e feedback. Ajusta o rumo rapidamente sem perder o propósito. Promove uma cultura de experimentação. Competência associada: mentalidade de crescimento (growth mindset).
- Inteligência emocional e empatia: Antes a liderança era “racional”, centrada em métricas e autoridade. Agora a liderança tem de ser humana, que entende emoções e contextos. Saber ouvir genuinamente. Demonstrar vulnerabilidade e empatia. Gerir conflitos com sensibilidade e respeito. Competência associada: empatia activa e segurança psicológica.
- Gestão de diversidade e inclusão: Antes as equipas eram homogéneas e com hierarquias rígidas. Agora as equipas são mais diversas e plurais – cultural, geracional, cognitiva e geograficamente. Valorizar perspectivas diferentes. Criar ambientes inclusivos. Combater viés inconsciente e promover equidade. Competência associada: liderança inclusiva.
- Pensamento sistémico e complexo: Antes o foco era no departamento e na execução. Agora o líder precisa de entender a organização como um sistema interdependente, onde tudo se conecta. Capacidade de ver o “todo” e antecipar impactos cruzados. Decidir considerando contexto, interdependência e consequências. Competência associada: visão holística e análise de cenários.
- Ética, transparência e consciência social: Antes, o foco era o lucro e o desempenho. Agora há também pressão por propósito, responsabilidade e ética. Tomar decisões alinhadas a valores. Integrar ESG (ambiental, social e governança) na liderança. Ser transparente e coerente. Competência associada: integridade e propósito.
- Literacia digital e colaboração com a tecnologia: Antes a tecnologia era “tema do IT”. Agora o líder precisa compreender e integrar IA, dados e automação nas decisões. Saber usar tecnologia como aliada estratégica. Garantir uso ético da IA e da informação. Competência associada: pensamento digital e tecnológico.
- Capacidade de co-criação e facilitação: Antes o líder tinha as respostas. Agora precisa criar espaços para que outros co-criem as soluções. Conduzir grupos, alinhar ideias e energizar equipas. Trabalhar com dinâmicas de co-criação, design thinking e foresight. Competência associada: facilitação e liderança colaborativa.
- Gestão da energia e bem-estar: Antes a produtividade era medida por horas e esforço. Agora é medida por energia, equilíbrio e qualidade. Promover saúde mental e física. Gerir o ritmo da equipa. Liderar pelo exemplo, com autocuidado e resiliência. Competência associada: liderança regenerativa e empática.
Em síntese, o líder do futuro é menos um comandante e mais um curador de energia, propósito e aprendizagem.
O que motivou a criação da The Business School em Portugal, e quais foram os principais desafios na fundação de uma escola de negócios com uma ambição internacional?
A The Business School nasceu em Portugal com uma convicção forte: o mundo está a mudar mais rápido do que as organizações e os executivos estão a aprender.
Vivemos uma era marcada por transformações profundas — geopolíticas, tecnológicas, sociais, humanas e ambientais — que estão a redefinir a forma como se faz gestão, como se lidera e como se cria valor. Nesse contexto, sentiu-se a necessidade de uma escola de negócios diferente, contemporânea, prática e global, capaz de preparar na prática líderes, shareholders e board members para repensar a gestão e reinventar o futuro das empresas.
Portugal foi escolhido não apenas pela sua localização estratégica – entre a Europa, África e América Latina -, mas também por representar um ecossistema de inovação emergente, aberto ao mundo e com uma forte ligação à língua portuguesa e às economias em crescimento. A TBS surge, portanto, com o propósito de formar lideranças de futuro, oferecendo experiências de aprendizagem transformadoras, ligadas à realidade empresarial e ao contexto internacional com forte aplicação prática, patente na nossa assinatura: “A teoria. Na prática.”
O desafio não era criar “mais uma escola de negócios” (até porque existem escolas de altíssima qualidade e competência), mas sim uma plataforma de conhecimento e foresight voltada para o futuro da gestão. Foi preciso desenhar uma proposta de valor que combinasse visão estratégica e foresight, inovação pedagógica e uma ligação directa ao mundo corporativo real. Criar uma escola de alto nível exige reunir líderes, professores e especialistas que partilhem uma visão comum de futuro.
O desafio foi atrair profissionais que não apenas ensinam, mas vivem o que ensinam – executivos, board members e especialistas com experiência global e prática e que estão presentes no nosso Conselho Superior, que tem nomes incontornáveis da sociedade, do mercado e das empresas.
Qual é a visão de longo prazo da escola em termos de crescimento e impacto internacional?
Patente na nossa missão (formar para a aplicação prática das teorias, modelos e conceitos da gestão) e na nossa visão (ser a melhor Business School, com foco na prática) a visão de longo prazo reflecte ambição, propósito e diferenciação internacional, mostrando como pretende crescer e impactar o ecossistema global de liderança e gestão. A actualidade de conteúdos, dinâmicas colaborativas e de co-construção e, principalmente, a aplicação prática dos temas, que se querem actuais, inovadores e relevantes, alinhados com o contexto actual, moldam a nossa visão. Em 10 a 15 anos, a TBS | THE Business School gostaria de ser reconhecida internacionalmente como uma plataforma de desenvolvimento de líderes estratégicos e transformadores, com programas inovadores, presença global e impacto directo em organizações e sociedades, sendo um farol de excelência e propósito de origem portuguesa.
Como escolhem o corpo docente e os mentores para os vossos programas?
Esta etapa de construção considerou naturalmente as pessoas que conhecemos e com quem nos relacionamos, os amigos de longa data, que comungam das mesmas dores e visões. Aliado, claro, à experiência e à competência dos temas tratados. Sem querer ser clichê, a competência, a reputação e a credibilidade são os eixos principais da decisão e da formalização dos convites, que todos aceitaram sem pestanejar porque compraram a ideia do projeto.
Qual o papel da experiência prática dos docentes no desenvolvimento dos participantes?
O papel da experiência prática dos docentes na TBS | THE Business School (e em qualquer escola de negócios de alta performance, direi eu) é fundamental e transformador, porque é o que diferencia uma formação teórica de uma formação realmente aplicável e impactante.
- Conectar teoria e prática: Docentes experientes trazem vivência real de mercado: liderança em crises, gestão de mudanças, decisões estratégicas complexas, fusões e aquisições, transformação digital, entre outros. Isso permite que os participantes compreendam como aplicar conceitos teóricos em contextos reais, evitando abstrações e fórmulas genéricas.
- Gerar aprendizagem experiencial: A experiência prática dos docentes transforma aulas em laboratórios de decisão: estudos de caso, simulações, role-playing e debates estratégicos. Os participantes não apenas ouvem ou leem sobre gestão, mas vivem situações semelhantes às do seu dia a dia profissional, acelerando a aprendizagem.
- Inspirar confiança e credibilidade: Líderes que compartilham histórias de sucesso e, principalmente, de fracassos e aprendizagens, criam uma conexão autêntica com os participantes. Isso gera respeito, credibilidade e segurança para que os executivos testem novas ideias.
- Estimular pensamento crítico e tomada de decisão: A experiência prática permite que os docentes apresentem dilemas complexos, mostrando múltiplas perspectivas e consequências. Os participantes desenvolvem capacidade de análise, julgamento estratégico e flexibilidade mental, essenciais para liderança moderna.
- Facilitar o networking e as oportunidades de mentorias: Docentes experientes muitas vezes trazem acesso a redes globais e oportunidades reais de mercado. Podem actuar como mentores estratégicos, conectando participantes a insights, parceiros e projectos internacionais.
- Modelar comportamentos de liderança: Através do seu estilo, ética e abordagem prática, os docentes funcionam como modelos de referência. Os participantes não aprendem só conteúdo, mas formas de pensar, aplicar, agir e liderar em cenários complexos e ambíguos.
A experiência prática dos docentes transforma a aprendizagem de uma experiência teórica para uma experiência estratégica, vivencial e inspiradora, onde os participantes desenvolvem competências reais de liderança, capacidade de decisão e visão global, alinhadas com os desafios contemporâneos das organizações.
Como medem o impacto dos vossos programas na carreira dos participantes e nas suas organizações?
Estamos no início da jornada e, portanto, só agora a lançar as primeiras turmas, mas acreditamos que a medição precisa ser estruturada, multidimensional e baseada em evidências, tanto a nível individual (carreira) quanto organizacional. Considerar e demonstrar esse impacto credibiliza a marca e naturalmente o projecto. Mas esse é um tema que ainda está a dar os primeiros passos uma vez que é uma escola nova. Ainda assim a experiência acumulada nos participantes do conselho superior e dos professores, a sua reputação e a história que os precede já deixa antever a elevada competência na entrega e claro na evolução dos nossos participantes. Educação é antes de tudo confiança e credibilidade.
Que tendências futuras de liderança e gestão estão a preparar os vossos programas para enfrentar?
O contexto em que a TBS | THE Business School nasce motiva a criação de programas que estão desenhados para antecipar e preparar líderes para as mudanças mais relevantes do mundo dos negócios e da sociedade.
Na nossa opinião, estas são as tendências futuras de liderança e gestão que inspiram os programas da TBS:
- Liderança adaptativa e ágil. As organizações operam em ambientes VUCA (Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade). Portanto temos de apostar no desenvolvimento de capacidade de adaptação rápida, pensamento estratégico em cenários incertos e tomada de decisão ágil. Para tal vemos como competências chave a resiliência, criatividade, mindset de crescimento.
- Inteligência emocional e liderança humana. Equipas exigem cada vez mais autenticidade, empatia e bem-estar. Há que considerar e aplicar exercícios de inteligência emocional, coaching e liderança empática. Isso fortalece a escuta ativa, a comunicação eficaz, a gestão de conflitos e construção de confiança.
- Gestão baseada em dados e tecnologia. A IA, o analytics e automação transformam decisões estratégicas. É preciso operar ferramentas de data-driven decision making, integração de tecnologias emergentes e avaliação ética do uso da IA que fortaleçam o pensamento analítico, a literacia digital e o foresight tecnológico.
- Liderança responsável e sustentável. ESG e propósito organizacional são cada vez mais imperativos estratégicos. O desenvolvimento de estratégias sustentáveis, ética corporativa e governança responsável vão potenciar a consciência social, a tomada de decisão ética e o impacto sustentável.
- Colaboração e cocriação em redes globais. Liderar não é mais apenas gerir pessoas internas, mas é orquestrar redes globais e ecossistemas complexos. Projetos colaborativos internacionais, workshops de design thinking e cocriação desenvolvem influência sem autoridade, negociação intercultural, liderança colaborativa.
- Aprendizagem contínua e capacidade de foresight. Mudanças rápidas exigem líderes capazes de antecipar tendências e aprender constantemente. Módulos de cenários futuros, análise de tendências globais e estratégias de inovação vão acelerar a curiosidade, o pensamento estratégico e a visão sistémica.
- Cultura de inovação e transformação. Organizações precisam de líderes que promovam inovação e transformação contínua. Estudos de caso, simulações e labs de inovação que desenvolvem a capacidade de liderar mudanças disruptivas vão fortalecer a gestão da mudança, o mindset de experimentação e a liderança transformadora.
Em resumo, os programas da TBS querem e têm como objetivos preparar os líderes não apenas para os desafios de hoje, mas para os cenários de amanhã, desenvolvendo competências em adaptabilidade, tecnologia, sustentabilidade, empatia, foresight e inovação. É uma abordagem holística, onde estratégia, cultura e pessoas se encontram para formar líderes prontos para um mundo em constante transformação.













