Nem tudo o que reluz é ouro… exceto talvez nas árvores da Lapónia onde as bactérias ‘cultivam’ o metal precioso

Estudo, publicado na revista ‘Environmental Microbiome’, sugere que estas árvores podem literalmente “crescer” ouro — e que o fenómeno poderá abrir novas vias para a prospeção mineira sustentável

Francisco Laranjeira
Outubro 12, 2025
12:30

Parece o enredo de um filme natalício passado no Ártico, mas é ciência: investigadores da Universidade de Oulu, na Finlândia, descobriram que certas bactérias que vivem nas agulhas dos abetos-da-noruega conseguem transformar ouro dissolvido no solo em nanopartículas metálicas. O estudo, publicado na revista ‘Environmental Microbiome’, sugere que estas árvores podem literalmente “crescer” ouro — e que o fenómeno poderá abrir novas vias para a prospeção mineira sustentável.

A equipa finlandesa recolheu 138 amostras de agulhas de 23 abetos-da-noruega (‘Picea abies’) encontrados nas imediações da mina de Kittilä, a maior mina de ouro da Europa, situada na região da Lapónia. Em quatro dessas árvores foram detetadas nanopartículas de ouro incrustadas nas agulhas, envolvidas por biofilmes bacterianos.

A sequenciação genética revelou a presença predominante de grupos bacterianos como P3OB-42, Cutibacterium e Corynebacterium — apontados como a chave do processo. “Os nossos resultados sugerem que as bactérias e outros micróbios que vivem dentro das plantas podem influenciar a acumulação de ouro nas árvores”, explicou a investigadora Kaisa Lehosmaa, autora principal do estudo.

Segundo a cientista, o ouro, originalmente presente no solo em forma líquida e solúvel, é transportado pela água através das raízes e do caule até às agulhas. Ali, os micróbios convertem esse ouro solúvel em partículas sólidas nanométricas, formando minúsculas pepitas invisíveis a olho nu.

Embora as partículas sejam demasiado pequenas para ter valor económico direto, a descoberta pode transformar a forma como se procura ouro. De acordo com a ‘New Scientist’, uma empresa australiana de exploração mineral, a Marmota, já tinha utilizado folhas de eucalipto para identificar depósitos subterrâneos ricos em ouro — um método que levou à descoberta de um filão com 3,4 gramas de ouro por tonelada de solo em 2019.

O fenómeno não é totalmente novo, mas o estudo finlandês fornece pela primeira vez uma explicação microbiológica para a biomineralização do ouro. O ‘The Guardian’ recordou que processos semelhantes foram observados em árvores australianas, cujas raízes ultrafinas penetram profundamente em camadas sedimentares. No entanto, o papel das bactérias até agora permanecia em grande parte um mistério.

“Esta descoberta é útil, uma vez que a procura destas bactérias nas folhas das plantas pode facilitar a exploração do ouro”, sublinhou Lehosmaa. Os investigadores acreditam que identificar estas comunidades microbianas poderá servir como ferramenta biológica de prospeção — mais barata, precisa e ecológica do que as técnicas tradicionais.

Em suma, o ouro da Lapónia pode afinal não vir apenas das minas. As árvores, com a ajuda das suas bactérias invisíveis, podem estar a esconder nas agulhas o segredo de novas fortunas.

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