Covid-19 regressa em força (com novas variantes) fora da época habitual. Especialistas deixam alertas e conselhos

Em entrevista à Executive Digest, Bernardo Gomes, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública (ANMSP), explica que este aumento de casos de infeção nos últimos meses não é inesperado.

Pedro Gonçalves
Julho 17, 2025
12:49

Portugal tem registado, desde maio, um aumento sustentado de novos casos de infeção por Covid-19, acompanhado por uma tendência crescente da mortalidade específica, apesar de o impacto no Serviço Nacional de Saúde (SNS) se manter, para já, reduzido. A Direção-Geral da Saúde (DGS) confirma que este crescimento coincide com a deteção de três novas linhagens da variante Ómicron – NB.1.8.1., LP.8.1. e XFG – que têm vindo a ganhar prevalência em território nacional. Em entrevista à Executive Digest, Bernardo Gomes, presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública (ANMSP), explica que este comportamento do vírus não é inesperado.

“O SARS-CoV-2 acabou por reter características de um vírus respiratório sazonal, mas com uma transmissibilidade tão elevada que consegue impor-se fora dos ciclos típicos de inverno”, referiu Bernardo Gomes, sublinhando que, ao contrário de outros vírus respiratórios, a Covid-19 mantém capacidade de gerar ondas secundárias mesmo em períodos menos habituais, como a primavera e o verão. “É algo que é expectável, não é um sinal de alarme”, afirmou.

A realidade portuguesa segue, assim, a tendência já observada noutros países europeus, com o reforço vacinal a manter-se como principal estratégia preventiva. “A maior parte dos países continuam a optar por uma vacinação sazonal de reforço no inverno, sobretudo para proteger os indivíduos mais vulneráveis”, indicou o médico. No entanto, salientou que a eficácia da resposta imunitária pode ser menor em pessoas mais idosas, o que aumenta a probabilidade de infeções mais graves, mesmo fora da época fria.

Sobre a recente identificação de novas linhagens da variante Ómicron, Bernardo Gomes considera que estas alterações são normais no processo evolutivo do vírus. “Os especialistas em biologia evolucionária explicam que a seleção de variantes tende a favorecer aquelas que são mais transmissíveis e que conseguem escapar parcialmente à imunidade anterior. São as que têm maior sucesso em termos populacionais”, frisou. Segundo a DGS, estas linhagens não apresentam, até ao momento, maior gravidade nem comprometem a eficácia das vacinas.

Uma das sublinhagens em destaque é a XFG, também conhecida por Stratos, que tem ganho terreno no Reino Unido e na Europa. Ainda assim, o presidente da ANMSP considera que não há razões para alarme. “A Organização Mundial da Saúde já veio dizer que, apesar de mais transmissível, a XFG não parece provocar doença mais severa e há uma boa sobreposição com a imunidade conferida pelas vacinas. Não vejo motivo de preocupação neste momento, mas sim a necessidade de vigilância”, declarou.

Bernardo Gomes reforça a importância de manter uma “cultura coletiva de evicção de infeções respiratórias”, independentemente da época do ano. “Devemos apostar na boa ventilação dos espaços, evitar contacto quando temos sintomas, e, se necessário, usar máscara. São hábitos que vieram da pandemia e que podem ser reforçados”, defendeu, alertando ainda para as potenciais consequências das infeções respiratórias a médio e longo prazo, especialmente em populações com comorbilidades.

Questionado sobre o impacto que este aumento de casos pode ter no SNS, nomeadamente nas urgências hospitalares durante o verão, o especialista rejeita a ideia de um cenário de pressão acrescida. “Não me parece que seja um grande motivo de preocupação neste momento”, afirmou. “Aliás, a recente onda de calor contribuiu para uma mortalidade superior à média, afetando sobretudo os mais vulneráveis, que também estariam em risco face à Covid. São o que chamamos causas concorrentes.”

Reconhecendo que o SNS vive um momento de tensão, em particular na região de Lisboa e Vale do Tejo, com casos críticos no acesso à ginecologia e obstetrícia, Bernardo Gomes garante que o aumento atual de casos de Covid-19 não deverá agravar substancialmente a situação. “A doença, neste momento, não tem grande concorrência de outros vírus respiratórios, o que permite responder a eventuais picos. E os números não indicam, para já, procura acrescida por estas infeções”, garantiu.

A DGS, por sua vez, mantém a vigilância apertada sobre a evolução epidemiológica. Desde 5 de maio, observa-se um crescimento do número de casos, e desde 26 de maio, uma subida da mortalidade específica por Covid-19. A entidade adverte ainda que a imunidade populacional “pode estar parcialmente diminuída”, devido à baixa circulação do vírus no último inverno e ao tempo decorrido desde a última dose de vacina. “Como consequência, a tendência atual de aumento da atividade viral poderá traduzir-se num acréscimo de internamentos nas próximas semanas, sobretudo entre pessoas idosas e grupos mais vulneráveis”, indicou a autoridade de saúde.

Em linha com esta avaliação, Bernardo Gomes deixa uma mensagem de serenidade, mas também de responsabilidade. “Não é motivo para pânico, mas é essencial mantermos a vigilância e integrarmos a Covid-19 no conjunto das infeções respiratórias a que devemos estar atentos. O trabalho do INSA, da DGS e dos parceiros internacionais é crucial para que possamos reagir atempadamente, se for necessário ajustar estratégias”, concluiu o presidente da ANMSP.

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