Atenção ao usar estas três especiarias muito comuns! Há risco de interferirem com medicamentos, alerta especialista

Efeitos colaterais podem surgir em combinação com anticoagulantes, medicamentos para a diabetes ou tratamentos oncológicos.

Pedro Gonçalves
Maio 17, 2025
17:30

Uma pitada de canela no arroz doce, um pouco de curcuma no caril ou um toque de gengibre nos biscoitos: estas três especiarias são comuns em cozinhas por todo o mundo, apreciadas não só pelo sabor como também pelas suas supostas propriedades medicinais. Mas será que podem interferir com a eficácia de medicamentos? A resposta é sim — especialmente quando consumidas em grandes doses ou sob a forma de suplementos.

De acordo com a especialista em Farmácia Prática, Dipa Kamdar, da Kingston University, em conselhos dados ao The Conversation, embora estas especiarias tenham sido tradicionalmente valorizadas na medicina ayurvédica e chinesa pelas suas propriedades terapêuticas, há evidências de que, em determinadas circunstâncias, podem comprometer tratamentos farmacológicos.

Canela: benefícios conhecidos, riscos escondidos
A canela, extraída da casca das árvores do género Cinnamomum, é rica em compostos ativos como cinamaldeído, eugenol e cumarina. Em pequenas quantidades, oferece antioxidantes, propriedades anti-inflamatórias e benefícios na regulação da glicemia e da função cerebral. Porém, um estudo recente da Universidade do Mississippi veio levantar preocupações.

Em experiências laboratoriais, o cinamaldeído revelou-se capaz de ativar recetores que aceleram o metabolismo e a eliminação de fármacos do organismo. Esta ação pode, potencialmente, reduzir a eficácia de determinados medicamentos. Embora os resultados ainda não tenham sido testados em humanos, abrem a porta a novas investigações sobre interações entre a canela e fármacos modernos.

Importa também distinguir os tipos de canela. A mais comum nos supermercados é a canela cássia, proveniente de partes da Ásia e com níveis mais elevados de cumarina — uma substância que, em grandes quantidades, pode ser hepatotóxica e interfere com anticoagulantes como a varfarina. Já a canela do Ceilão, oriunda do Sri Lanka e geralmente mais cara, tem menores concentrações deste composto.

Segundo Kamdar, “existem alguns relatos clínicos que sugerem que suplementos de canela podem aumentar o risco de hemorragias quando tomados juntamente com anticoagulantes”. Isso acontece porque a cumarina interfere com as enzimas hepáticas responsáveis pela metabolização de fármacos como a varfarina.

Outros medicamentos que poderão sofrer interferência incluem analgésicos, antidepressivos, fármacos oncológicos e antidiabéticos. No entanto, sublinha-se que os riscos decorrem sobretudo do consumo elevado — por exemplo, através de suplementos — e não do uso moderado na culinária.

Curcuma: propriedades anti-inflamatórias com precauções
A curcuma, ou açafrão-da-índia, é valorizada tanto pela sua cor vibrante como pelas propriedades anti-inflamatórias atribuídas ao seu principal composto ativo: a curcumina. Estudos laboratoriais e em animais apontam para efeitos positivos na saúde, mas também para potenciais interações com medicamentos.

A curcumina pode interferir com enzimas hepáticas, afetando o metabolismo de antidepressivos, anti-hipertensores, antibióticos e fármacos de quimioterapia. Tal como a canela, a curcuma apresenta propriedades anticoagulantes, podendo potenciar os efeitos de medicamentos como a varfarina ou o ácido acetilsalicílico.

“Estudos em animais sugerem ainda que a curcuma pode reduzir os níveis de açúcar no sangue, o que pode amplificar os efeitos de medicamentos antidiabéticos ou da insulina”, alerta Kamdar. Esta especiaria poderá também reduzir a tensão arterial, o que, combinado com fármacos anti-hipertensores, pode levar a hipotensão.

Apesar de tudo, as evidências em humanos continuam limitadas e a maioria dos efeitos adversos está associada ao uso em doses elevadas, sobretudo através de suplementos.

Gengibre: efeitos positivos e precauções semelhantes
Utilizado há séculos contra náuseas e inflamações, o gengibre é outro ingrediente que suscita interesse científico. O composto ativo gingerol pode, tal como os anteriores, influenciar o metabolismo de medicamentos no organismo.

O gengibre atua como um anticoagulante ligeiro, e por isso, o seu consumo em excesso pode aumentar o risco de hemorragias em pessoas que tomem anticoagulantes. Quanto ao impacto na diabetes, os dados são contraditórios: há estudos que indicam que pode reduzir os níveis de glicemia, mas a investigação é ainda insuficiente para se tirarem conclusões definitivas sobre a sua interação com medicamentos antidiabéticos.

Kamdar reforça que os riscos mais significativos advêm do uso de suplementos concentrados, e não da utilização ocasional destes ingredientes na cozinha do dia-a-dia. “Se estiver a tomar medicamentos, especialmente anticoagulantes, antidiabéticos ou fármacos para o cancro, é aconselhável falar com o seu médico ou farmacêutico antes de iniciar qualquer suplemento à base de plantas.”

No entanto, para a maioria das pessoas, uma pitada de canela, um pouco de curcuma ou um toque de gengibre continua a ser uma forma saborosa e, potencialmente, benéfica de enriquecer a alimentação.

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