Gerir para uma sociedade mais resiliente

Por José Galamba, Presidente da Associação Portuguesa de Seguradores

Vivemos tempos de mudança acelerada que colocam novos desafios aos líderes e gestores empresariais.

Para além dos desafios macroeconómicos e geopolíticos muito evidentes nos tempos de hoje e que ocupam em grande medida as agendas das lideranças empresariais, não podemos deixar de continuar a prestar atenção aos grandes desafios estruturais da nossa sociedade, nomeadamente aqueles decorrentes das alterações climáticas, do inverno demográfico e do uso cada vez mais intensivo das novas tecnologias, que nos convocam enquanto gestores, à tomada de consciência da evolução dos riscos associados a estas tendências e à necessidade de desenvolver novas respostas e soluções que mitiguem esses riscos.
Relativamente às alterações climáticas, é inequívoco que o que vamos observando é uma maior frequência e severidade de eventos catastróficos, como tempestades, incêndios, inundações, etc. Este risco ambiental, sendo certo que é mais prevalente numas indústrias que noutras, começa a ser finalmente tomado em consideração pelos líderes e gestores empresariais, nos processos de tomada de decisão.
Sobre o inverno demográfico, uma situação onde Portugal se destaca, assistimos a uma evolução demográfica adversa – uma muito baixa de natalidade, enquanto se constata uma maior longevidade das gerações mais seniores. Esta realidade, se por um lado coloca grandes desafios ao financiamento das pensões futuras ou até dos custos de saúde muitas vezes associados a tratamentos inovadores que a evolução da ciência vai disponibilizando para darem resposta à previsível maior prevalência de doenças crónicas, com impactos na disponibilidade financeira das famílias, por outro a bem-vinda longevidade dos mais seniores traz novas oportunidades para novas ofertas de produtos e serviços para esta nova realidade social (emergência da economia “grisalha” ou “prateada”).
Por último, a presença das novas tecnologias e o seu uso crescente em todos os aspetos da nossa vida, quer pessoal, quer profissional, criam muitas oportunidades de comodidade e bem-estar para a nossa vida em sociedade. De facto, a utilização de modelos preditivos e ferramentas de inteligência artificial abrem novas oportunidades para criar produtos com preços e características ajustadas à necessidades e ansiedades dos consumidores, no tempo certo, essenciais para melhorar a experiência dos clientes. Mas esta evolução na utilização dos dados, trás novos desafios e novos dilemas e implica um reforço na necessidade de agir de forma ética nesta era digital e muito especialmente na necessidade de se encontrar um equilíbrio entre o direito do individuo à sua privacidade e as necessidades especificas da atividade económica. Mas não agarrar a oportunidade que estas novas tecnologias disponibilizam, é colocar em risco a própria inovação. Inovação que tem de assentar em códigos e valores éticos, pois só assim se consegue um impacto positivo para a comunidade de consumidores e no final do dia, na construção de sociedades mais resilientes. Cabe ainda salientar, que também resultante dos níveis de interconexão que estas novas tecnologias permitem, eles criam um nível de exposição cada vez maior aos riscos cibernéticos, com potencial de impacto sistémico se não for convenientemente mitigado.
Construir uma sociedade mais resiliente e sustentável, que acomode os grandes desafios estruturais enunciados, é um assunto incontornável nos tempos em que vivemos. É um tema que tem uma projeção cada vez maior ao nível da opinião pública e que, consequentemente, está cada vez mais presente na agenda não só dos decisores políticos, mas também dos líderes e gestores empresariais.
Embora sejam as questões ambientais, em particular as alterações climáticas, as principais impulsionadoras deste movimento global, não nos podermos esquecer que os objetivos de desenvolvimento sustentável, tal como definidos pelas Nações Unidas e geralmente aceites pela sociedade em geral, abarcam também preocupações sociais e de governação, áreas que no seu conjunto são designadas por ESG.
Isto transforma a Sustentabilidade numa temática de espectro de atuação muito largo, com um dinamismo muito próprio e onde se assistem a desenvolvimentos de fontes muito diversas que irão inevitavelmente ter impactos diretos e indiretos no mundo das empresas e dos negócios.
Em todo o caso, uma gestão adequada das questões ESG, nos processos de tomada de decisão, fortalecerá a contribuição de cada um para a construção de um sistema resiliente, inclusivo e sustentável. Sendo certo que os desafios ambientais e sociais são muito abrangentes e complexos, é necessário o empenho de toda a sociedade para a promoção e desenvolvimento de soluções inovadoras com impactos a longo prazo. E tal só será conseguido se, por um lado, todos os setores económicos agirem de uma forma concertada e que, em conjunto, contribuam para a transição para uma economia mais sustentável; e, por outro, se existirem compromissos fortes, quer por parte dos governos, consubstanciadas em políticas públicas, quer por parte das empresas, para o desenvolvimento de projetos alinhados com os objetivos da sustentabilidade.
E nunca o papel de uma gestão responsável foi tão importante – nos tempos desafiantes que vivemos, os líderes e gestores empresariais têm responsabilidades acrescidas na promoção de uma sociedade sustentável com desenvolvimento económico e social para todos. Nesse sentido, devem aplicar novos referenciais nos seus processos de decisão, incorporando novos critérios e objetivos, que deem respostas aos desafios da sociedade.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 210 de Setembro de 2023


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