Governo quer integrar trabalhadores domésticos no regime de proteção social
O Governo está a analisar alterações no regime de proteção social aplicável aos trabalhadores domésticos, um grupo que enfrenta condições contributivas que limitam o acesso a direitos como o subsídio de desemprego e resultam em reformas de baixos valores. A ministra do Trabalho e da Segurança Social, Rosário Palma Ramalho, confirmou recentemente que recebeu um estudo sobre o tema e que uma reavaliação do regime em vigor está a ser ponderada.
De acordo com dados oficiais de abril de 2024, existem atualmente 226.380 trabalhadores domésticos registados na Segurança Social, um aumento atribuído à entrada em vigor da Agenda do Trabalho Digno. Desde 1 de maio de 2023, a não declaração de trabalhadores domésticos passou a ser considerada crime, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, o que incentivou os registos.
Apesar do aumento, apenas 10% dos trabalhadores domésticos tinham acesso ao subsídio de desemprego em 2022, segundo o Livro Branco para o Trabalho Doméstico Digno, apresentado pelo Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Atividades Diversas (Stad).
O regime atual oferece duas opções de descontos: sobre a remuneração real, com base no salário mínimo nacional (870 euros em 2025), ou sobre a remuneração convencional, calculada com base no Indexante dos Apoios Sociais (522,5 euros).
Contudo, o acesso ao subsídio de desemprego é limitado a trabalhadores que atuem em regime de contrato mensal a tempo completo e que descontem com base na remuneração efetiva. Este modelo exclui a maioria, já que muitos trabalhadores domésticos prestam serviços a tempo parcial ou à hora para múltiplos empregadores.
“Estas condições limitam drasticamente o universo de beneficiários de subsídio de desemprego entre os trabalhadores domésticos”, refere o Livro Branco.
Paulo Pedroso, um dos coordenadores do Livro Branco, defende alterações significativas no regime. Para além de incluir os trabalhadores domésticos no Código do Trabalho (atualmente regidos por um regime próprio), Pedroso sugere alargar o acesso ao subsídio de desemprego e responsabilizar os empregadores que alegam insuficiência económica para dispensar trabalhadores.
Em declarações ao jornal Público sociólogo destaca ainda os valores baixos de descontos efetuados sobre a remuneração convencional, atualmente fixados em 2,17 euros por hora, muito aquém dos 3,58 euros se o cálculo fosse baseado no salário mínimo. “Os descontos são muito baixos e vão originar pensões muito baixas. Em 2022, o valor médio mensal de desconto era de 89,58 euros, um quarto da média nacional [382,33 euros]”, sublinha.
Pedro Perista, investigador do Centro de Estudos para a Intervenção Social (Cesis), reforça a necessidade de ampliação do acesso ao subsídio de desemprego para todos os trabalhadores domésticos, independentemente de terem contrato escrito ou trabalharem a tempo parcial. Perista defende também a promoção de iniciativas públicas para recolher dados sobre o trabalho doméstico e avaliar o impacto de medidas de combate ao trabalho não declarado no setor.
Em linha com as preocupações identificadas, o Bloco de Esquerda apresentou, no início de janeiro, quatro iniciativas legislativas na Assembleia da República para reformar o regime do serviço doméstico. Entre as propostas estão a inclusão desta atividade no Código do Trabalho, a integração no regime geral da Segurança Social e a garantia de “responsabilidade solidária” entre seguradoras em casos de acidentes de trabalho em residências.
As propostas têm como objetivo assegurar direitos básicos, como o subsídio de desemprego, para todos os trabalhadores domésticos, independentemente do regime contratual, e reforçar a proteção em situações de acidentes laborais.
O Ministério do Trabalho e da Segurança Social não avançou prazos para a eventual reavaliação do regime, mas garantiu estar a analisar as conclusões do estudo recebido, realizado sob pedido do anterior executivo.