As histórias e o imaginário infantis dizem que a Lua é feita de queijo mas foi recentemente desfeito o ‘mistério’ do que está no seu interior: um estudo confirmou que a Lua possui um núcleo interno sólido, com uma densidade semelhante à do ferro. A descoberta poderá esclarecer um dos debates mais persistentes sobre a estrutura interna do satélite natural da Terra e fornecer uma visão mais precisa da sua evolução e, consequentemente, da história do Sistema Solar.
A investigação foi conduzida por uma equipa liderada pelo astrónomo Arthur Briaud, do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) de França, e publicada na revista Nature. O estudo confirma que o núcleo da Lua é composto por uma camada externa fluida e um núcleo interno sólido, à semelhança da Terra.
“Os nossos resultados questionam a evolução do campo magnético da Lua, graças à demonstração da existência do núcleo interno, e apoiam um cenário de inversão global do manto que fornece informações substanciais sobre a cronologia do bombardeamento lunar nos primeiros mil milhões de anos do Sistema Solar”, escreveu a equipa de Briaud.
A análise revelou que o núcleo externo tem um raio de aproximadamente 362 quilómetros, enquanto o núcleo interno mede cerca de 258 quilómetros de raio, correspondendo a cerca de 15% do raio total da Lua. A densidade do núcleo interno foi estimada em cerca de 7.822 quilogramas por metro cúbico, um valor muito próximo ao do ferro.
Confirmação de uma hipótese antiga
Determinar a composição interna da Lua tem sido um desafio, uma vez que os dados sísmicos recolhidos pelas missões Apollo, na década de 1970, apresentam resolução insuficiente para distinguir com precisão o estado do núcleo. Sabe-se que existe uma camada fluida, mas a estrutura exata do seu interior permaneceu incerta durante décadas.
Para resolver esta questão, Briaud e a sua equipa recorreram a dados de missões espaciais e experiências de medição por laser, que analisam a deformação da Lua devido à interação gravitacional com a Terra, as variações da sua distância e a sua densidade global. Com base nestas medições, os cientistas desenvolveram modelos computacionais para testar diferentes composições do núcleo lunar.
Os modelos mais fiéis aos dados observacionais indicaram a presença de uma atividade convectiva profunda no manto lunar. Este processo, em que materiais mais densos migram para o centro enquanto os menos densos sobem à superfície, já tinha sido proposto para explicar a composição química de certas regiões vulcânicas da Lua. O estudo agora publicado reforça essa hipótese.
Curiosamente, os resultados de Briaud coincidem com uma investigação de 2011, liderada pela cientista planetária Renee Weber, da NASA Marshall. Na altura, a equipa de Weber usou técnicas sísmicas de última geração para analisar os dados das missões Apollo e encontrou indícios de um núcleo interno sólido com um raio estimado de 240 quilómetros e uma densidade aproximada de 8.000 quilogramas por metro cúbico.
Implicações para a história da Lua
Estas descobertas ajudam a esclarecer um dos mistérios sobre a Lua: o desaparecimento do seu antigo campo magnético. Sabe-se que, nos primeiros tempos da sua formação, a Lua possuía um campo magnético forte, que começou a enfraquecer há cerca de 3,2 mil milhões de anos. Esse campo era gerado por processos de convecção no núcleo, tal como ocorre na Terra. Assim, compreender a estrutura do núcleo lunar é fundamental para perceber porque é que esse campo desapareceu.
Com as novas missões espaciais previstas para os próximos anos, incluindo o regresso da humanidade à Lua, espera-se que futuros estudos sísmicos possam fornecer confirmação direta destas descobertas. A confirmação de um núcleo interno sólido na Lua reforça ainda mais a sua semelhança estrutural com a Terra e contribui para a compreensão da evolução dos corpos celestes no Sistema Solar.














