O serviço de informações militares da Rússia, conhecido como GRU, terá recebido ordens para levar a cabo uma missão de caráter “ultra urgente” na Europa, com o objetivo de identificar e recolher dados sobre personalidades críticas do regime de Vladimir Putin. A revelação foi feita esta terça-feira, 29 de abril, pelo Centro Dossier, uma unidade de investigação independente em língua russa, financiada pelo opositor exilado Mikhail Khodorkovsky.
Através de uma publicação no Telegram, o Centro Dossier afirma que agentes do GRU foram incumbidos, no início de 2025, de “compilar urgentemente” informações detalhadas sobre líderes de opinião europeus que se manifestam contra o governo russo, incluindo políticos, jornalistas, bloggers, figuras culturais e outras personalidades de destaque. O objetivo? Segundo o centro, preparar possíveis “ações hostis”, com base nos dados recolhidos.
“É provável que estejam a ser planeadas ‘medidas ativas’ contra estas pessoas”, refere a organização investigativa, sublinhando que a campanha russa poderá incluir tentativas de recrutamento pontual de criminosos ou membros de grupos de extrema-direita para executar tais ações.
Até ao momento, o Ministério da Defesa russo não respondeu aos pedidos de esclarecimento sobre estas alegações.
Assassinatos e sabotagem entre os métodos suspeitos
Embora o tipo específico de “ações hostis” não tenha sido descrito na publicação do Centro Dossier, a organização menciona informações de inteligência que indicam uma alegada tentativa de assassinato contra Alexander Shvarev — administrador do canal de Telegram VChK-OGPU, conhecido por divulgar informações comprometedoras sobre os bastidores do Kremlin e dos serviços de segurança russos.
A publicação de 23 de abril do Dossier remete também para ataques suspeitos em solo europeu, atribuídos à Rússia, como o incêndio num centro comercial na Polónia e outro numa loja Ikea em Vilnius, na Lituânia, ocorridos no ano passado.
O centro identificou o oficial Denis Smolyaninov como um dos líderes das operações do GRU. De acordo com meios de comunicação britânicos, Smolyaninov terá sido um dos mentores de uma alegada conspiração para enviar bombas disfarçadas em encomendas transfronteiriças. Em julho de 2024, uma dessas encomendas incendiou-se na área de carga da DHL no aeroporto de Leipzig, na Alemanha. Incidentes semelhantes foram registados em aeroportos de Varsóvia e do Reino Unido, incluindo um incêndio num centro logístico da DHL em Birmingham, a 22 de julho.
Outro caso de grande visibilidade foi o plano, também associado a Moscovo, para assassinar Armin Papperger, CEO do grupo alemão de armamento Rheinmetall, uma das principais fornecedoras de equipamento militar à Ucrânia.
GRU intensifica campanha de sabotagem no Ocidente
As revelações do Centro Dossier surgem num contexto de crescente alarme entre os países ocidentais relativamente à atividade dos serviços secretos russos. Um relatório do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), publicado a 25 de março de 2025, indica que entre 2023 e 2024 triplicaram os ataques atribuídos à Rússia, e critica os países ocidentais por ainda não terem desenvolvido uma estratégia eficaz de resposta.
“A Rússia está envolvida numa campanha agressiva de subversão e sabotagem contra alvos europeus e norte-americanos, que complementa a sua brutal guerra convencional na Ucrânia”, alertou o CSIS.
Em setembro de 2024, os diretores dos serviços de informações britânicos (MI6), Richard Moore, e norte-americanos (CIA), Bill Burns, classificaram a ofensiva russa como uma campanha de sabotagem “imprudente”, com ataques à infraestrutura, disseminação de desinformação, incêndios criminosos e outras formas de desestabilização. Moore alertou que os líderes europeus devem estar preparados para um agravamento destas ameaças no futuro próximo.
Europa sob pressão crescente
A amplitude e sofisticação da operação do GRU agora denunciada reforça a perceção de que a Rússia está a conduzir uma guerra híbrida contra o Ocidente, em paralelo com o conflito armado na Ucrânia. A recolha de dados pessoais — incluindo moradas, locais de trabalho e fontes de financiamento de personalidades públicas — levanta sérias preocupações sobre a segurança de vozes críticas ao Kremlin espalhadas pela Europa.
A gravidade das alegações e o historial de ações encobertas por parte dos serviços russos — como o envenenamento de dissidentes ou os ciberataques contra infraestruturas críticas — acentuam os receios de que estas operações não se limitem à vigilância, mas incluam medidas concretas de intimidação, sabotagem ou eliminação física.
Enquanto as autoridades ocidentais reforçam os seus sistemas de contraespionagem e proteção de figuras públicas, a revelação do Centro Dossier vem confirmar que a guerra de Moscovo vai muito além do campo de batalha na Ucrânia, e está, cada vez mais, a ser travada nas sombras da política, da comunicação e da opinião pública europeia.














