A decisão do Governo português, liderado por Luís Montenegro, de admtir reconhecer formalmente o Estado da Palestina em setembro, durante a próxima Assembleia Geral das Nações Unidas, gerou reações imediatas e divergentes entre os principais candidatos à Presidência da República. Para alguns, trata-se de uma medida há muito esperada e inevitável; para outros, o gesto chega tarde e reflecte uma falta de coragem política por parte do Estado português ao longo dos últimos anos.
Luís Marques Mendes, candidato apoiado pelo PSD, foi o primeiro a pronunciar-se publicamente sobre o anúncio do executivo. Numa publicação na rede social X (antigo Twitter), poucas horas após a revelação da medida, Marques Mendes afirmou congratular-se com a decisão e classificou-a como “inevitável”. Sublinhou ainda que o mais importante, neste momento, é “debelar a crise humanitária chocante que se mantém em Gaza”. Este posicionamento não é novo: em declarações ao jornal Público no sábado anterior, o antigo líder social-democrata já havia criticado o que considera ser um “silêncio e inacção” da União Europeia no conflito israelo-palestiniano e defendeu que está na hora de a UE, “em conjunto, reconhecer o Estado da Palestina, em concordância com a doutrina internacional da consagração de dois Estados”.
António José Seguro, antigo secretário-geral do PS e também candidato presidencial, manifestou igualmente apoio à decisão do Governo. Em declaração escrita enviada ao Público, Seguro descreve o reconhecimento do Estado palestiniano como “um passo simbólico, mas profundamente político e moral”, defendendo que este gesto visa impedir a destruição definitiva dos fundamentos de um Estado palestiniano e reativar um processo de paz mais amplo no Médio Oriente, com vista a tornar viável a solução de “dois Estados”. Para o ex-dirigente socialista, reconhecer a Palestina significa “estar do lado do direito internacional, da dignidade humana e da paz”, acrescentando que este é “um passo que honra os valores da nossa democracia e projecta Portugal como país comprometido com soluções justas, equilibradas e construtivas”.
Por outro lado, António Filipe, candidato apoiado pelo PCP, apresentou uma visão mais crítica e exigente quanto ao papel de Portugal no conflito. Em declarações à agência Lusa, lamentou que o país só agora tome esta posição e considerou que “Portugal já devia ter feito isso há muito tempo”. Filipe defende que a decisão de reconhecer o Estado da Palestina deve ser imediata e tomada de forma soberana, sem subordinação a outros países. Mais do que um gesto simbólico, sustenta que Portugal deve assumir uma posição firme e inequívoca perante o que descreve como “a tragédia que se está a passar com o povo palestiniano às mãos do Estado sionista de Israel”. Acrescentou ainda que Portugal “deve exigir o fim do genocídio sobre o povo palestiniano” e sair “de uma verdadeira lista da vergonha”.
Já Henrique Gouveia e Melo, ex-chefe do Estado-Maior da Armada e também candidato à Presidência da República, não respondeu ao pedido de comentário do Público. No entanto, há uma semana, em entrevista ao canal Now, já se havia pronunciado sobre o tema, embora sem assumir uma posição clara sobre se Portugal deve ou não reconhecer a Palestina. Na altura, afirmou que esta é uma questão que compete ao Governo e que, se fosse Presidente da República, estaria “aberto a todas as propostas”. Ainda assim, não deixou de criticar a actuação de Israel na Faixa de Gaza, sublinhando que a resposta israelita já ultrapassou os limites do que pode ser considerado uma operação militar. “Há uma coisa que me impressiona em Israel: neste conflito recente que teve com o Irão, de alguma forma compreendo as razões das posições israelitas, [mas] não consigo compreender o que está a acontecer na Faixa de Gaza. Acho que passou para lá do limite do que é uma operação militar”, afirmou Gouveia e Melo.
Este debate insere-se num contexto internacional marcado por um agravamento dramático da situação humanitária nos territórios palestinianos e por uma pressão crescente sobre os governos europeus para tomarem posição. Recentemente, países como a Noruega, a Irlanda e a Espanha formalizaram o reconhecimento da Palestina como Estado soberano, desafiando a tradicional neutralidade europeia e relançando a discussão em várias capitais do continente. A decisão do Governo português surge assim numa conjuntura de forte polarização, tanto a nível internacional como interno, e promete marcar a agenda da campanha presidencial. Se para uns representa um compromisso com a justiça e a paz, para outros é apenas o fim tardio de uma omissão prolongada. A corrida a Belém ganha, assim, um novo foco político: o papel de Portugal no Médio Oriente e o grau de firmeza com que deve ou não intervir no cenário internacional.













