Israel tem um plano para redesenhar o mapa do Médio Oriente… mas ninguém sabe bem qual é

Israel está a levar a cabo uma campanha militar multifacetada no Médio Oriente, que começou em Gaza e rapidamente se expandiu para o Líbano, com ameaças de que poderá chegar ao Irão. No entanto, os planos concretos do governo israelita, liderado por Benjamin Netanyahu, sobre o futuro da região continuam envoltos em incerteza, especialmente no que toca a Gaza. Desde o ataque terrorista de 7 de outubro do ano passado, que marcou o início deste conflito, os objetivos declarados de eliminar o Hamas e libertar os reféns mantidos pelo grupo não foram plenamente alcançados.

A destruição massiva em Gaza, que já resultou numa catástrofe humanitária com cerca de 42 mil vítimas, e a ocupação de facto da região por forças israelitas, traçam um cenário sombrio para a população local. Sem um plano claramente consensual com a comunidade internacional, Israel está a debater várias soluções para o futuro de Gaza. Entre as teorias que circulam no debate público israelita, surgem ideias que vão desde a anexação total do território até à sua reconstrução sob controlo de Israel. Algumas propostas mais radicais, como o reassentamento forçado de palestinianos ou o chamado “Plano dos Cinco Dedos”, que visa fragmentar Gaza em várias áreas controladas por Israel, estão a ganhar força. No entanto, essas propostas violam resoluções internacionais e poderiam configurar crimes de guerra, embora a capacidade da comunidade internacional para intervir permaneça limitada.

Para além de Gaza, Israel tem-se envolvido em ações militares intensas no sul do Líbano e na capital, Beirute, com o objetivo de debilitar as capacidades militares do Hezbollah. Este grupo, aliado do Irão, tem sido um alvo central na estratégia israelita, que pretende redefinir o equilíbrio de forças na região. O próprio Netanyahu já advertiu que o Líbano poderia “transformar-se numa nova Gaza” caso o Hezbollah não recuasse.

No entanto, esta ofensiva militar não se limita ao Líbano. Israel está em conversações com os Estados Unidos sobre possíveis ataques a alvos específicos no Irão. Washington e Telavive veem nesta conjuntura uma oportunidade para remodelar o Médio Oriente, enfraquecendo a capacidade militar do Hezbollah e, de forma mais ampla, a influência do Irão na região. Segundo analistas, esta é uma tentativa de degradar o chamado “Eixo da Resistência”, uma aliança liderada por Teerão que se opõe à hegemonia dos EUA e de Israel no Médio Oriente.

Divisões no governo israelita e pressão dos EUA
Apesar do consenso em torno da necessidade de confrontar o Hezbollah e o Irão, há divisões dentro do próprio governo israelita. Netanyahu e o ministro da Defesa, Yoav Gallant, estão em desacordo sobre a escala e o alcance de um eventual ataque ao Irão. Netanyahu, mais agressivo, proibiu Gallant de viajar para os EUA para discutir o plano antes que o gabinete israelita aprovasse os alvos e a extensão da ofensiva. Por outro lado, os Estados Unidos, embora apoiem os esforços de Israel, têm pressionado para que não sejam atacadas instalações nucleares iranianas, temendo uma escalada que poderia levar a um conflito de maiores proporções.

Segundo relatos da imprensa israelita, os EUA chegaram mesmo a propor um “pacote de compensação” a Israel, oferecendo proteção diplomática abrangente e um acordo de armas, caso o governo de Netanyahu se abstivesse de atingir determinados alvos no Irão.

Consequências regionais
Um ataque israelita ao Irão teria repercussões profundas na região. Teerão já deixou claro que responderia de forma contundente, muito mais severa do que fez em retaliação a ataques anteriores. Em 1 de outubro, o Irão lançou um ataque com mísseis balísticos em resposta ao assassinato de altos líderes do Hezbollah e do Hamas por Israel, tendo alguns dos mísseis atingido bases militares israelitas.

O ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Abbas Araghchi, alertou Israel para “não testar” a determinação do Irão, enquanto prossegue uma campanha diplomática no Golfo Pérsico, destinada a evitar uma maior escalada na região. Araghchi tem procurado evitar que países do Golfo cooperem com Israel, advertindo que tal os tornaria cúmplices e os sujeitaria a possíveis retaliações.

O papel dos EUA e o cessar-fogo com o Hezbollah
Embora os EUA inicialmente tenham apoiado uma operação militar limitada no Líbano, as suas posições evoluíram para um apoio mais explícito às ações de Israel, vendo nelas uma oportunidade para reconfigurar o cenário geopolítico no Médio Oriente. A administração norte-americana já não está a pressionar por um cessar-fogo com o Hezbollah, apesar de o governo interino do Líbano, liderado por Najib Mikati, ter expressado a disposição de implementar a Resolução 1701 da ONU, que pede o fim das hostilidades entre Israel e o Hezbollah.

Analistas acreditam que esta postura faz parte da estratégia dos EUA e de Israel para enfraquecer o Eixo da Resistência, liderado pelo Irão. Moun Rabbani, analista luso-palestiniano, afirmou ao Mondoweiss que “há uma crescente crença em Israel, apoiada pelos EUA, de que esta é uma oportunidade real para redesenhar o mapa político do Médio Oriente, mudando a equação estratégica da região e desmantelando o Eixo da Resistência”.

Violência contínua e impasse na Cisjordânia
Enquanto a atenção internacional se foca nos combates em Gaza e no Líbano, a violência na Cisjordânia também se intensifica. Na passada segunda-feira, um menino palestiniano de 12 anos foi morto por soldados israelitas perto do posto de controlo de Qalandia, entre Ramallah e Jerusalém, e um idoso palestiniano foi espancado até à morte por soldados israelitas em Hebron.

Com a região cada vez mais próxima de uma guerra abrangente, Israel continua as suas operações no norte de Gaza, alegando que o Hamas está a reconstruir as suas infraestruturas na área. Netanyahu está a aplicar o chamado “Plano do General”, que inclui a criação de uma zona tampão no norte de Gaza e a imposição de um bloqueio à entrada de ajuda humanitária, enquanto hospitais continuam a ser alvo de ataques.

Apesar da confiança do governo israelita na vitória, antigos responsáveis, como o ex-chefe do Conselho de Segurança Nacional de Israel, Giora Eiland, têm advertido que nem o Hamas nem o Hezbollah podem ser derrotados facilmente, e que prolongar uma guerra em duas frentes poderá não ser do interesse de Israel.

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