Meios analógicos, treinos no Irão e manobras militares para despistar: Hamas preparou ataque a Israel durante dois anos

Egito ainda alertou Telavive sobre “movimentos invulgares” dentro do aparelho militar do Hamas, algo que Israel sempre negou – os agentes da Mossad relataram manobras de treino de determinados grupos ao ar livre, sendo que os superiores não dessem muita importância porque, afinal, “os do Hamas estão sempre em manobras”

Francisco Laranjeira
Outubro 28, 2023
11:20

Não houve nada de espontâneo no ataque do Hamas, no passado dia 7: os líderes do grupo terrorista planearam o ataque cuidadosamente durante dois anos, tendo mobilizado mais de 1.500 homens, treinando-os e armando-os até aos dentes, com instruções para matar civis e militares israelitas em pontos muito específicos em Israel.

Segundo fontes de inteligência dos Estados Unidos, citadas pelo jornal ‘El Español’, o Hamas dividiu os seus homens em dois grupos: um teria atuado continuamente ao longo destes dois anos na clandestinidade, nos túneis na Cidade de Gaza. Com telefones fixos ligados entre si por cabos com quilómetros de extensão, esta equipa dedicou-se a planear cada detalhe do ataque, aguardando pelo último momento para deixar as instruções aos terroristas que iriam agir. Assim, foi possível ao Hamas evitar que a Mossad e a CIA intercetassem as suas comunicações, o que responde a uma das grandes questões do dia do ataque: como foi possível que uma agência de espionagem desta magnitude não tivesse qualquer aviso da invasão? Fácil: estavam a olhar para onde não estava.

O Egito ainda alertou Telavive sobre “movimentos invulgares” dentro do aparelho militar do Hamas, algo que Israel sempre negou – os agentes da Mossad relataram manobras de treino de determinados grupos ao ar livre, sendo que os superiores não dessem muita importância porque, afinal, “os do Hamas estão sempre em manobras”.

Era o segundo grupo, o encarregado de executar a barbárie no dia 7, que devia ter concentrado as atenções dos serviços de espionagem. Parte da sua formação teve lugar em Gaza… mas apenas a última fase de uma formação que decorreu no Irão. Cerca de 500 homens do Hamas e da Jihad Islâmica passaram várias semanas em setembro sob o comando de oficiais da Força Quds, um ramo da Guarda Revolucionária Islâmica, embora não soubessem qual seria a sua verdadeira missão.

A Força Quds está na dependência exclusiva do ayatollah Ali Khamenei e é o braço armado do Irão em conflitos internacionais. Foi formado durante a guerra entre o Irão e Iraque na década de 1980 e durante mais de 40 anos participou ativa ou passivamente na guerra civil libanesa, na guerra na Bósnia, na insurreição síria e na luta contra o Estado Islâmico. O líder da Força Quds foi, durante bastante tempo, o general Qasem Soleimani, assassinado pelos Estados Unidos em janeiro de 2020, numa operação especial encomendada pelo presidente americano, Donald Trump. Desde então, o Irão jurou vingança.

Além do treino militar, o Irão terá ajudado o Hamas com drones para atacar postos de vigilância israelitas, o que permitiu que os terroristas atravessassem a fronteira em parapentes e motocicletas, métodos habitualmente utilizados pela Força Quds mas nunca pelo Hamas, o que acabou por confundir a inteligência israelita.

A ameaça do Irão está por detrás de qualquer movimento de Israel em território palestiniano, mas o ayatollah está a avaliar até que ponto se pode envolver sem prejudicar o seu próprio país. Tanto o Irão como o Hezbollah garantiram que se iriam envolver se Israel pisasse em Gaza, algo que os israelitas já fizeram sem qualquer consequência – na madrugada de terça para quarta-feira, tanques israelitas entraram no norte de Gaza para atacar alvos ligados ao Hamas, o que Telavive chamou de “preparação para a invasão terrestre”.

O trabalho diplomático continua para evitar a escalada do conflito: os Estados Unidos tentam acalmar a ansiedade do seu aliado, enquanto procuram evacuar ou defender as suas bases no Médio Oriente. A Rússia demonstrou o seu apoio ao Hamas ao receber uma delegação do grupo terrorista em Moscovo. Recorde-se que o Irão é aliado da Rússia e um dos poucos países que colaborou militarmente com Putin na sua invasão da Ucrânia – talvez por isso o Kremlin se sinta obrigado a apoiar o lado palestiniano, um gesto que Telavive já deixou claro que não esquecerá no futuro.

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