Por Javad Hatami, CEO e Fundador da Builtrix
Em Portugal e na Europa, o ESG tornou-se a linguagem dominante da sustentabilidade. Os conselhos de administração discutem o assunto, os consultores aconselham e quase todos os eventos corporativos incluem agora pelo menos um painel sobre relatórios ESG ou a Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa (CSRD).
Nos setores imobiliário, hoteleiro e retalhista, o tema nunca foi tão visível. Os gestores de ativos falam sobre neutralidade de carbono, os hotéis promovem o turismo sustentável e os retalhistas anunciam novos compromissos ambientais.
Mas quando chega a hora de investir, a conversa muda discretamente. Os orçamentos continuam a ser destinados a projetos que poupam energia e não àqueles que simplesmente melhoram os relatórios. Em suma: o ESG ganha a atenção, mas a eficiência ganha as ordens de compra.
O boom do ESG
Nos últimos cinco anos, a sustentabilidade deixou de ser um tema secundário para se tornar um tema central nos negócios.
Regulamentações como a CSRD e a Taxonomia da UE tornaram a divulgação de informações ambientais uma responsabilidade do conselho de administração. Os investidores e os bancos exigem cada vez mais transparência e setores voltados para o público, como hotelaria e retalho, reconhecem que o desempenho ESG influencia a reputação e o financiamento. Neste contexto, os gestores de sustentabilidade estão sob pressão para «falar ESG». Eles devem produzir dashboards, KPIs e reports anuais. Isto cria um apetite constante por conhecimento, ferramentas e insights, explicando por que o conteúdo ESG atrai tanta atenção nos media do sector, newsletters e conferências.
Na Builtrix, observámos o mesmo padrão em toda a nossa comunicação, relatórios e interações com clientes: no sul da Europa, particularmente em Portugal, a atenção gravita em torno de temas ESG e de sustentabilidade, mas as aprovações orçamentais ainda dependem do ROI e da eficiência. É um mindset cultural moldado pelo pragmatismo financeiro.
Em contraste, no norte da Europa, a compliance, a transparência e a governança de dados são valorizadas em igualdade de condições com a eficiência. Nestes países, investir em sistemas ESG é visto como uma questão de credibilidade e gestão de risco, não apenas de retorno. Essa diferença destaca como a maturidade da sustentabilidade varia na Europa, desde o foco nos custos no Sul até o foco na compliance e na governança no Norte.
A realidade da eficiência
No entanto, atenção não é o mesmo que ação. Quando as organizações decidem onde gastar, a lógica financeira e operacional assume o controle. Os custos de energia continuam a ser uma das maiores despesas controláveis em edifícios. Gestores de instalações, proprietários de ativos e diretores financeiros tomam decisões de investimento com base no ROI mensurável, ou seja, na rapidez com que uma atualização se paga. Uma redução de 10% nas contas de eletricidade é tangível e imediata, melhores relatórios ESG não são.
Em Portugal, esta dinâmica é especialmente visível. Hotéis, gestores de ativos e retalhistas reconhecem a importância da sustentabilidade, mas a maioria dos orçamentos continua a ser aprovada para iniciativas que proporcionam poupanças operacionais claras como instalações solares, atualizações LED ou sistemas de dados que identificam o desperdício. Entretanto, muitas soluções ESG ainda são vistas como ferramentas de compliance ou reputação, em vez de instrumentos de desempenho financeiro.
O resultado é um desfasamento estrutural onde as empresas falam de ESG, mas agem com base na eficiência.
Por que existe essa discrepância?
Essa contradição não é hipocrisia é um sintoma de como as organizações e os mercados evoluem.
- Responsabilidades divididas: os departamentos de ESG lidam com estratégia e comunicação, enquanto as equipas operacionais gerem contas e orçamentos. Nem sempre compartilham as mesmas métricas ou cronogramas.
- Fraca fiscalização: Embora os relatórios ESG sejam obrigatórios para grandes empresas, as penalidades por não conformidade permanecem pouco claras. Em contrapartida, a ineficiência energética prejudica todos os meses através de custos mais elevados.
- Lógica de financiamento: os incentivos nacionais e da UE, desde o PRR até empréstimos verdes, ainda priorizam resultados tangíveis de descarbonização, como redução do consumo ou das emissões. Os projetos devem comprovar impacto mensurável, não apenas governança de dados.
- Enquadramento psicológico. «ESG» soa a ambicioso; «eficiência energética» soa a prático. Os executivos abrem e-mails sobre ESG por curiosidade, mas assinam contratos que reduzem despesas.
Em conjunto, estes fatores explicam por que razão a sustentabilidade em Portugal e no sul da Europa é frequentemente mais avançada na comunicação do que na implementação.
O caminho a seguir
O caminho a seguir é claro: todas as soluções ESG devem demonstrar um impacto real na eficiência. Sem um ROI mensurável e redução de custos, torna-se difícil justificar qualquer iniciativa ESG, particularmente no sul da Europa e, especialmente, em Portugal, onde o desempenho financeiro continua a ser o principal fator de decisão.
Para que as estratégias ESG prosperem neste contexto, devem mostrar, simultaneamente, quanta energia é poupada, qual a redução de custos e quanta pegada de carbono é evitada, apoiando diretamente as metas de descarbonização da organização.
Quando os dados ESG ligam estas três dimensões, os gestores de sustentabilidade, conselhos de administração, diretores financeiros e equipas de manutenção passam finalmente a falar a mesma língua. É aí que o ESG deixa de ser um exercício de reporte e se torna uma verdadeira ferramenta de gestão.
A oportunidade de Portugal
Portugal tem todos os ingredientes certos para liderar esta integração. Combina metas climáticas ambiciosas com uma forte base hoteleira e imobiliária e um acesso significativo ao financiamento da UE para a transformação verde. No entanto, muitas organizações ainda dependem da recolha manual de dados, folhas de cálculo e faturas dispersas, tornando quase impossível traduzir a ambição em progressos mensuráveis. Se Portugal quiser acelerar a sua descarbonização, deve simplificar o acesso aos dados ambientais e garantir que cada euro gasto em eficiência também reforça a capacidade de reporte ESG.
Nos próximos anos, os requisitos ESG da UE vão expandir-se às pequenas e médias empresas e os grupos portugueses que colmatarem esta lacuna antecipadamente terão uma vantagem competitiva – tanto em termos de preparação para o cumprimento como de desempenho em termos de custos.




