IA e Relações Públicas: quando a confiança encontra o algoritmo

Opinião de Raquel Máximo, Communications Manager, Enlitia

Executive Digest
Setembro 22, 2025
12:30

Por Raquel Máximo, Communications Manager, Enlitia

Nos últimos anos, a Inteligência Artificial (IA) tornou-se uma ferramenta imprescindível e, para os profissionais de comunicação não foi exceção. Estas tecnologias permitem automatizar tarefas, antecipar tendências, personalizar conteúdos à escala e acelerar processos. Têm ainda potencial para amplificar o impacto das estratégias de comunicação, sobretudo em contextos de sobrecarga informativa. Ignorá-la seria ingenuidade, recusá-la, um erro estratégico, porém, aceitá-la sem espírito crítico é talvez o maior risco de todos. Mas será que a confiança pode ser automatizada? Será possível construir relações genuínas, a base das Relações Públicas (RP), com ferramentas que, por mais sofisticadas que sejam, não têm consciência nem vivências?

O que a IA traz às RP (e o que não traz)

Com modelos generativos e algoritmos de análise de sentimentos, já é possível mapear a reputação de uma marca quase em tempo real, identificar padrões de comportamento, antecipar crises e produzir conteúdos ajustados a diferentes canais e audiências. Estes ganhos de eficiência não podem ser ignorados. Mas há limites claros: um algoritmo pode detetar palavras-chave numa menção negativa, mas não compreende ironia, dor ou indignação verdadeira. Pode prever alcance, mas não sabe se o conteúdo está alinhado com os valores da marca ou com o momento cultural. Exemplos de outros setores, como o da energia, mostram como agentes de IA conseguem assumir tarefas complexas sendo capazes de monitorizar ativos, antecipar riscos e propor planos de ação em tempo real. Mas será possível transpor esta lógica para as RP? Ter agentes a gerir crises, antecipar impactos reputacionais e responder ao público em tempo real? A prática mostra que não e a realidade é outra. Várias companhias aéreas, por exemplo, usam chatbots para responder rapidamente aos clientes, no entanto responder rapidamente é diferente de responder bem, e a maior parte dos passageiros, particularmente em momentos de stress, exigem o contacto humano.

Nas RP, as decisões resultam de intuições informadas, da leitura do ambiente, de escutar os silêncios, analisar linguagem corporal, interpretar subtextos e responder com empatia. Nenhum sistema, por mais avançado, tem essa capacidade de discernimento moral ou social, por isso, a tecnologia dá eficiência mas a confiança nasce da relação. Além disso, a integração da IA traz riscos substanciais como viés algorítmico, excesso de dependência em sistemas automatizados, ameaças à cibersegurança entre outros, que podem levar a decisões desumanizadas.

IA sim, mas com consciência crítica

Não sou contra a IA, mas contra a sua aplicação irrefletida. A tecnologia deve servir os profissionais de RP, não moldar a sua consciência nem reduzir o seu papel a criadores de prompts. A inteligência artificial veio para ficar e há definitivamente espaço para todos. Agentes que monitorizam tendências, automatizam relatórios e apoiam processos? Sim. Mas substituir a escuta ativa, o contacto humano e a construção de narrativas autênticas? Não. O verdadeiro desafio é saber quando usar a IA para ampliar o nosso trabalho e ao mesmo tempo quando a desligar para escutar, observar, pensar e sentir. Encontrar este equilíbrio pode ser mais desafiante do que parece e cabe aos profissionais garantir que não perdem a essência da profissão no entusiasmo pela novidade e pela geração desenfreada de conteúdos.

Relações Públicas, são muito mais sobre empatia e autenticidade e muito menos sobre precisão ou rapidez. É o resultado de interações que, ao longo do tempo, criam credibilidade entre pessoas e instituições e nenhuma IA, por enquanto o pode genuinamente fazer, apenas simular.

Tal como um GPS ajuda a chegar mais rápido ao destino, a IA serve-nos para antecipar obstáculos e otimizar rotas. Mas só o condutor decide quando parar porque encontrou um colega, mudar de caminho para ver o novo jardim da cidade ou aproveitar o desvio para absorver o pôr do sol. É essa escolha consciente que dá sentido à viagem e, nas RP, que preserva a autenticidade da relação com os públicos. O futuro da comunicação será, sem dúvida, mais tecnológico mas continuará, acima de tudo, a ser profundamente humano.

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