Shein, Temu (entre outras…): “concorrência desleal” da China ameaça indústrias do têxtil e calçado nacionais
As indústrias do têxtil e calçado em Portugal atravessam um mau momento: nos primeiros seis meses de 2024, houve um aumento das insolvências, sendo que as empresas destes setores destacaram-se pela negativa. Em causa estão taxas de juro em alta, inflação, dificuldades no acesso a matérias-primas e a concorrência “desleal” das empresas chinesas, destacaram os empresários, citados pelo ‘Jornal de Notícias’ – no entanto, as empresas mais dedicadas ao mercado nacional parecem estar a resistir melhor à crise do que as que se dedicam à exportação.
De acordo com a Direção-Geral das Políticas de Justiça (DGPJ), a percentagem de insolvências decretadas aumentou 9,3%, para 1.054, relativamente ao período homólogo – nos dois setores, houve mais 110 falências decretadas no setor têxtil e moda (mais 178%), a confeção de vestuário exterior com mais 31 (um aumento de 78%) e o fabrico de calçado com mais 587 (um crescimento de 414%).
“O têxtil até cresceu em número de clientes, o problema é que eles fazem encomendas mais pequenas”, indicou Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal e da Euratex – Confederação Têxtil Europeia. “É um problema global, estamos a viver um período com duas guerras, uma na Europa e outra às portas”, sinaliza, salientando que “a União Europeia (UE) baixou as suas importações em 17% e Portugal teve uma diminuição de vendas de 5%. Ou seja, nós até aumentamos a nossa quota de mercado”.
César Araújo, presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e de Confeção (ANIVEC), lembra que as empresas de vestuário e moda “durante a pandemia tiveram de se endividar para evitar despedimentos e manter a paz social”. Essas obrigações estão agora a pesar muito nas contas, destaca, lembrando o aumento do custo das matérias-primas e à inflação. “O aumento dos preços dos bens de primeira necessidade, nomeadamente os alimentares, faz mudar as prioridades das pessoas. Para comprar comida não compra o casaco ou compra um de menor qualidade, diretamente da China, sem pagar impostos.”
No entanto, há outro fator que se destaca: a “concorrência desleal” das empresas chinesas que deve ter resposta da UE, “sob pena de acabar com todo o setor industrial europeu”. “A ‘ultra fast fashion’ entra na Europa através de marcas chinesas como a Temu, sem pagar qualquer imposto e não tendo de cumprir com nenhuma das regras a que nós somos obrigados”.
No setor do calçado, que exporta 90% da sua produção, há um cenário inédito: pela primeira vez, as empresas viradas para o mercado nacional estão a resistir melhor à adversidade. O abrandamento dos mercados internacionais está a arrastar o setor para uma crise (queda de 8,2% das exportações) que alguns classificam como a mais severa dos últimos 30 anos. De acordo com a Associação Portuguesa Indústria do Calçado Componentes Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS), no último trimestre de 2023, 30% das empresas só tinham encomendas para assegurar um mês de trabalho.