Profissões com qualificações média e alta têm maior risco de automatização digital

As profissões com nível de qualificação média e alta são aquelas que apresentam maior risco de automatização digital, revelou um estudo do Observatório Social da Fundação La Caixa, que analisou o mercado de trabalho em Portugal.

“Uma das principais conclusões é o facto de as profissões com maior risco de automatização digital serem as profissões com nível de qualificação médio e alto: técnicos e trabalhadores do apoio administrativo. Isto vem contrariar o que ouvimos com alguma frequência de que são as profissões com menor nível de qualificação que estão mais sujeitas à ‘destruição’ do emprego pela digitalização”, lê-se no documento a que a Lusa teve acesso.

Coordenada por Luís Manso, do coLABOR, o Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social, com a participação de Rui Roberto Ramos e Tiago Santos Pereira, da mesma instituição, a investigação visou aferir do impacto da digitalização nas profissões em Portugal, partindo de uma amostra representativa de 2.000 trabalhadores no ativo.

No estudo, os autores explicam que a automatização digital “refere-se, sobretudo, à automatização de tarefas de trabalho resultantes do processo de transição digital”.

“Ficou ainda demonstrado que os técnicos e os trabalhadores do apoio administrativo (profissionais altamente qualificados e profissionais com qualificações médias, respetivamente) estão mais expostos à automatização digital, representando, em 2021, aproximadamente 22% da força de trabalho portuguesa”, assinalam.

“Isto vem apoiar o argumento dos autores de que a automatização digital em Portugal não é necessariamente um fenómeno resultante de um enviesamento pelas competências”, reafirmam.

Apesar da exposição à automatização digital ser mais elevada entre os técnicos e os trabalhadores de apoio administrativo, os autores observam que estes processos “não vão acontecer da noite para o dia” e que a digitalização “não é um processo exclusivamente destrutivo”.

“A digitalização pode, naturalmente, estar na origem da automatização de algumas tarefas, tornando determinados grupos de tarefas obsoletos. No entanto, é de esperar que venha a gerar uma procura por novas tarefas e profissões”, alegam os investigadores.

Os dados da pesquisa revelaram ainda que, não obstante uma “grande maioria” dos inquiridos estar “otimista” quanto ao futuro do seu posto de trabalho, os trabalhadores com baixos níveis de qualificação são aqueles que se mostram “mais preocupados” sobre aquilo que o impacto da tecnologia pode representar para eles no futuro.

Os autores explicam que os trabalhadores mais qualificados estão mais bem preparados para lidar com as transformações decorrentes das mudanças tecnológicas, estando mais familiarizados com estas “e, portanto, menos pessimistas”.

“Pelo contrário, como os trabalhadores com baixo nível de qualificação interagem menos com a tecnologia, revelam maior ansiedade e suspeição face às mudanças tecnológicas”, afirmam.

Outra das conclusões do estudo aponta para o desenvolvimento de políticas face às mudanças tecnológicas, notando que, “embora a automatização digital tenha acelerado nos últimos anos, é improvável que os seus impactos na destruição de postos de trabalho ocorram subitamente”.

Os investigadores do coLABOR consideram que, “embora as políticas públicas devam promover condições para a atualização tecnológica das organizações, e respetiva transformação digital, devem também apoiar a inovação complementar nos processos organizacionais e a adaptação e formação do capital humano” face às mudanças tecnológicas.

“O objetivo destas políticas deverá ser a mitigação dos impactos negativos dos avanços tecnológicos no trabalho e no emprego, promovendo, ao mesmo tempo, os benefícios que decorrem deste processo”, defenderam.

O investigador Luís Manso, que é especialista na área da segurança social, admitiu à Lusa a necessidade de o Estado social estar permanentemente ligado aos processos de transição digital.

“Os sistemas de proteção social, no que respeita à automatização e ao impacto destrutivo no trabalho, serão, talvez, os mais importantes para mitigar estes impactos”, argumentou.