Randstad Insight: Felicidade segundo a segundo
Por José Miguel Leonardo | CEO Randstad Portugal
“Há tempo para tudo”. É assim que enganamos as crianças que abdicam de brincar para estudar ou simplesmente fazer os trabalhos de casa.
O tempo não é dominável, tentamos controlá-lo, pará-lo com as mãos ou ultrapassar o seu conceito quando nos inundamos de conteúdos em simultâneo ou justificamos que somos multitasking, mas ele mantém-se estável. O ponteiro dos segundos não anda mais depressa por ser digital e não pára porque, simplesmente, lhe tiramos a pilha.
E é neste caminho de segundo após segundo que temos de encaixar a nossa vida: a família, o trabalho, os amigos, nós e todos os imprevistos, fora os momentos mais básicos e fundamentais como comer ou dormir. O desafio da gestão do tempo exige alguma disciplina mas, mais ainda, a clara definição das prioridades tendo em vista um objectivo maior, a felicidade.
É verdade, é mesmo a felicidade que nos move e não pode ser nada diferente disso. Poderá ter acoplado o sucesso, o amor e até o dinheiro, mas, no fundo, estamos sempre nesta busca pela felicidade. E se partirmos a nossa vida em três percebemos que em cada um dos pilares ela deve e tem de estar presente.
A família, não se escolhe, tem-se, nasce-se com. Mas provavelmente, se pudéssemos escolher, escolheríamos os mesmos. Aqueles que nos deram colo, que estiveram lá sempre, com quem partilhamos anos e momentos que são parte da nossa identidade. Mesmo que o primo seja mais chato ou que naquela idade os pais pareçam os inimigos, a família é e deve ser sempre sinónimo de felicidade. Quando não o é, estamos perante excepções e comportamentos desviantes de violência que, infelizmente, tanto destaque têm tido recentemente e que temos de conseguir travar.
Nós. A noção do eu. A célebre imagem de eu olhar para o espelho e dizer o slogan “se eu não gostar de mim, quem gostará”. Outra verdade. Esta capacidade de nos amarmos, um amor equilibrado, com autoconhecimento sobre as nossas competências. Um conhecimento que nos deixe ser cada vez mais humanos. Rir e chorar ou mesmo chorar a rir, mas termos a capacidade de estarmos bem connosco próprios. Reconhecermos que se pudéssemos ser outra pessoa, seríamos sempre nós próprios, mesmo que numa versão melhorada. Reconhecer a nossa capacidade de superação, de pedir desculpa, de criar e de ir cada vez mais longe. Tirar proveito daquilo que nos distingue enquanto espécie e assumir todos os dias o compromisso de que “hoje vou ser feliz”.
Por fim, o trabalho. Não necessariamente no fim, mas não obrigatoriamente no início. O equilíbrio dos três pilares nas sequências dos segundos da nossa vida são fundamentais. Por isso, esqueçamos a ordem e olhemos para o trabalho. Trabalho não no sentido de contrato ou de emprego instituição, mas no sentido de contributo, de troca e de experiência. Onde eu partilho e aprendo, onde evoluo e conheço. Onde sei e vou saber. Ser útil, entregar e receber. Ser reconhecido, recompensado. Errar para fazer certo e crescer nestes músculos que são as competências e que todos os dias se treinam nos nossos trabalhos.
Felicidade em acordar cedo? Em trabalhar cinco dias e descansar dois? Sim, felicidade em fazer parte de uma equipa, em contribuir no propósito de uma organização, em ser relevante na sociedade e contribuir para um mundo melhor. Se quisermos ver mais pequeno, felicidade de ter para onde ir, o que fazer e, independentemente da função ou da posição hierárquica, contribuir para o todo. Conhecer novas pessoas, trabalhar com tantas outras e surpreender com o que entregamos.
O tempo pode ser sempre o mesmo. 60 que se transformam em minutos ou horas, mas neste caminho que não muda cabe-nos a responsabilidade de que seja o nosso tempo. Não devemos fechar os olhos e deixá-lo simplesmente passar, lamentando que não chega. Devemos, em cada segundo, aproveitá-lo garantindo que estamos neste caminho de felicidade, neste compromisso equilibrado entre três pilares. Porque, só assim, o tempo chega para tudo, só assim chega para sermos felizes.
Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 155 de Fevereiro de 2019.