Porque é que o cobre, o alumínio e o aço estão nas fundações da ideologia MAGA de Trump?

Longe de serem meras medidas económicas, estas taxas aduaneiras refletem uma estratégia política mais vasta, centrada na recuperação de sectores industriais outrora dominantes nos EUA e no reforço do apoio da sua base eleitoral operária.

Pedro Gonçalves
Agosto 4, 2025
13:36

As tarifas de 50% sobre as importações de cobre, aço e alumínio, recentemente impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, estão a transformar o mercado global dos metais e a abalar as indústrias norte-americanas. Longe de serem meras medidas económicas, estas taxas aduaneiras refletem uma estratégia política mais vasta, centrada na recuperação de sectores industriais outrora dominantes nos EUA e no reforço do apoio da sua base eleitoral operária.

“Grande parte da motivação para estas tarifas sobre matérias-primas como o cobre é de natureza política”, afirmou David Stritch, analista sénior de câmbio na Caxton, em declarações à Euronews. Segundo Stritch, Trump está “frustrado com o colapso da produção norte-americana destes três materiais — um sector que liderava a nível mundial até aos anos 1980 — e com a ascensão de países como o Chile no cobre e a China no aço e alumínio”.

O regresso à retórica industrial: “Sem aço, não há país”
A retórica protecionista de Trump não é nova. Já em 2018, durante o seu primeiro mandato, sublinhou a importância estratégica das indústrias metalúrgicas: “Uma indústria forte de aço e alumínio é vital para a nossa segurança nacional. Absolutamente vital.” Na altura, Trump defendeu que os EUA tinham sido alvo de práticas comerciais desleais durante décadas, com fábricas a encerrar, milhões de trabalhadores despedidos e comunidades inteiras destruídas. “Isso vai acabar, certo? Vai acabar”, prometeu.

Agora, em plena campanha para a reeleição, Trump retoma a mesma narrativa — mas de forma mais agressiva. Os novos impostos aduaneiros abrangem todo o aço, alumínio e cobre importados, numa tentativa de proteger a produção nacional e estimular o investimento doméstico.

Contudo, a medida teve efeitos imediatos e inesperados. O preço do cobre nos EUA, que tinha disparado em julho após o anúncio das tarifas, caiu 20% no final de julho, situando-se nos 4,55 dólares (cerca de 3,94 euros) por libra, a maior queda intra-diária de sempre. A queda deu-se depois de Trump ter anunciado uma exceção de última hora: os produtos de cobre em estado bruto — como concentrado e cátodos — ficariam isentos das tarifas. Apenas os produtos semi-acabados, como fios, tubos e folhas de cobre, serão taxados.

No caso do aço e do alumínio, as tarifas subiram dos anteriores 25% para uns inéditos 50%, provocando uma escalada nos preços internos e volatilidade no mercado. Aumentos no custo das matérias-primas e a menor disponibilidade estão a forçar empresas norte-americanas a repensar cadeias de abastecimento e a considerar relocalizar a produção.

Mas se o objectivo declarado é reavivar a produção doméstica, os dados mostram que medidas similares falharam no passado. Entre 2017 e 2024, após as primeiras tarifas de Trump, a produção de aço nos EUA caiu 1%, enquanto a de alumínio baixou quase 10%.

Segundo análises recentes, estas novas tarifas poderão aumentar os custos de fabrico até 4,5%, afetando de forma particularmente grave sectores de margens reduzidas, como os dos electrodomésticos ou veículos elétricos. O impacto poderá também travar investimentos em zonas industriais chave.

A decadência industrial americana e a promessa de ressurreição
Durante grande parte do século XX, os EUA lideraram a produção mundial de cobre, aço e alumínio. Mas essa hegemonia foi sendo corroída por transformações económicas e tecnológicas globais.

No caso do cobre, o Chile assumiu a liderança global nas últimas décadas, afastando os EUA do topo da cadeia de produção. Quanto ao aço, o pico foi atingido nos anos 1970, antes de um colapso prolongado provocado por recessões, concorrência externa — sobretudo do Japão, Coreia do Sul e Europa — e pela ineficiência de fábricas obsoletas, com altos custos laborais e exigências ambientais crescentes. Já no alumínio, o domínio norte-americano foi ultrapassado pela China nos anos 2000, beneficiando esta de eletricidade barata e procura interna robusta.

As consequências sociais dessa queda ainda são visíveis. As cidades siderúrgicas do “Rust Belt” — desde Nova Iorque até ao Midwest — foram devastadas pelo declínio industrial. Trump procura agora capitalizar politicamente esse ressentimento, prometendo reindustrializar a América.

“Os maiores prejudicados por essa deslocalização foram os homens de classe operária sem formação superior — precisamente a base eleitoral mais fiel de Trump”, notou David Stritch.

Um tiro no pé para os sectores verdes?
A nova vaga de tarifas representa também um desafio crítico para sectores considerados estratégicos para a transição energética. Cobre, aço e alumínio são componentes essenciais na produção de painéis solares, baterias de veículos elétricos, turbinas eólicas e infraestruturas de energia limpa.

“Os três materiais são amplamente usados em tecnologias verdes, por isso será provavelmente a base industrial dos EUA — que se pretende proteger — a sofrer as maiores consequências”, advertiu Stritch.

Com lucros médios de apenas 5% e uma cadeia de fornecimento ainda frágil, os fabricantes de veículos elétricos poderão ser os mais afetados. “A indústria dos carros elétricos está num momento delicado. Tarifas elevadas, custos acrescidos e incerteza no mercado podem travar o crescimento e os investimentos no sector”, explicou o analista.

As tarifas de Trump são mais do que uma ferramenta económica: são uma arma política. Ao atacar as importações de metais, o presidente reforça a sua visão nacionalista e a promessa de devolver à América o controlo sobre sectores chave.

Resta saber se o impacto prático acompanhará a retórica. A história recente mostra que as tarifas nem sempre revitalizam a produção nacional — e podem, pelo contrário, penalizar os consumidores, travar investimentos e desacelerar a inovação.

Partilhar

Edição Impressa

Assinar

Newsletter

Subscreva e receba todas as novidades.

A sua informação está protegida. Leia a nossa política de privacidade.