O azeite é presença assídua nas mesas dos portugueses, e a subida do preço desde produto afetou muitas carteiras e as decisões de consumo em território nacional.
Para analisar o cenário atual do setor, realiza-se esta semana o 7º Congresso Nacional do Azeite organizado pelo CEPAAL, em parceria com a Câmara Municipal de Valpaços, no âmbito da Feira Nacional de Olivicultura – Olivalpaços, e que irá ter lugar dia 17 de maio, no Pavilhão Multiusos em Valpaços.
A Executive Digest falou com Gonçalo Morais Tristão, Presidente do CEPAAL – Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo para entender o porquê da subida do preço do azeite, quais as perspetivas para o futuro e o que esperam que o novo Governo faça pelo setor.
Porque é que o azeite está mais caro?
O azeite, hoje em dia, é uma commodity em que o preço é formado no mercado internacional. E nos mercados funciona a lei da oferta e da procura. Em relação à produção de azeite, a oferta está muito dependente das produções olivícolas dos países europeus mediterrânicos, sobretudo de Espanha que, só por si, em termos médios, é responsável por quase 50% da produção mundial. Nas 2 últimas campanhas ocorreram quebras muito significativas na produção, em particular em Espanha. Isso originou uma redução dos stocks que, por sua vez, contribuiu para a alta de preços.
Por outro lado, nos últimos anos, em resultado de alguns estrangulamentos das cadeias de abastecimento, houve um grande aumento dos custos de produção do sector agrícola em geral.
Outro fator que potenciou um incremento dos preços dos azeites.
De qualquer forma, importa lembrar que os preços de há uns anos, em que a fasquia não ultrapassava os 2,5 €/Kg, eram bastante injustos para a produção pois dificilmente cobria os custos.
Há previsões para uma baixa?
As condições climatéricas neste início de campanha, com as chuvas de fevereiro e março, alimentam as expectativas dos olivicultores e dos lagares para uma boa campanha. A floração correu bem. Logo veremos se o vingamento dos frutos e o enchimento dos mesmos resultam numa boa campanha de produção, superior às anteriores.
Se isso acontecer, é natural que os preços possam ter uma tendência para a baixa. Mas nunca irão atingir valores abaixo dos 3 euros. É pelo menos isso que nos dizem os especialistas em mercados.
De qualquer forma, neste mundo do azeite, é muito difícil fazer previsões. Há 2 anos, era impensável o preço ultrapassar a fasquia do 6 euros e o que é certo é que se atingiu praticamente 9 euros, sem uma quebra no consumo nas mesmas proporções.
Qual é a contribuição da indústria do azeite para a economia nacional?
O sector olivícola tem-se destacado no crescimento do investimento agrícola que tem ocorrido nos últimos anos. Este aumento do investimento verificou-se sobretudo na zona de Alqueva, por causa do acesso à água mas também noutras regiões do País. Estes investimentos dinamizam economias locais mas também trazem resultados para a economia nacional.
Segundo um estudo apresentado em dezembro de 2023, as exportações de azeite português aumentaram, nos últimos 20 anos, 12 vezes em volume e 18 vezes em valor.
No mesmo estudo, constata-se que, no ano de 2022, o setor olivícola contribuiu com um saldo positivo de 515 milhões de euros para a balança comercial de Portugal. Não sabendo os valores de 2023, é fácil prever uma saldo positivo ainda maior, tendo em conta que em 2023 as exportações do azeite nacional ultrapassaram, pela primeira vez, a barreira dos mil milhões de euros, atingindo o valor de 1.159 milhões de euros.
Só para se ter a noção da extraordinária performance do setor olivícola, este valor foi superior ao valor das exportações de vinho. É certo que este valor se conseguiu, em parte, pelos preços altos do azeite mas não há dúvidas sobre a dinâmica económica deste sector.
Como é que a indústria do azeite influencia outros setores económicos locais, como turismo, agricultura e comércio?
Os investimentos que têm sido feitos no setor olivícola português caracterizam-se muito por terem introduzido nos olivais e nos lagares os processos mais modernos e com muita inovação, o que tem um efeito replicador nos restantes setores da agricultura. Por exemplo, a cultura da amêndoa, tal como ela hoje está instalada nas regiões do Alentejo e da Beira Baixa, e apesar das suas particularidades, recebeu muita influência do olival moderno.
Noutra vertente, a instalação e a produção dos novos olivais, fez desenvolver um certo número de negócios que orbitam à volta: projetistas da instalação dos sistemas de rega, empresas que vendem a aramação, empresas que dedicam à plantação, viveiros de plantas, empresas vendedoras dos sistemas de rega, empresas fornecedoras de todo o tipo de equipamentos, empresas de venda ou aluguer de tratores e máquinas de colheita, etc.
Finalmente, também o turismo tem beneficiado do dinamismo do sector. Restaurantes e hotéis, nas zonas de maiores investimentos, têm “agradecido” o aumento de circulação de pessoas ligadas direta ou indiretamente ao setor olivícola. Por outro lado, começa a desenhar-se um novo tipo de produto da oferta turística: o olivoturismo ou oleoturismo. Hoje em dia, muitos turistas, estrangeiros e nacionais, já procuram os nossos lagares para os visitarem, conhecer o processo de fabrico do azeite e provarem os magníficos azeites nacionais. Os lagares modernos são hoje concebidos, alguns mesmo com preocupações arquitetónicas, de modo que possam ser visitados pelos turistas que, agora, procuram experiências.
Com a entrada em funções do novo Governo, que medidas considera fundamentais para assegurar a sustentabilidade deste setor?
Em primeiro lugar, é preciso que o novo Governo entenda o setor e perceba a importância dos dados económicos que conquistou. Isso conseguiu-se através de ganhos de produtividade, de eficiência na utilização dos recursos, de inovação e de modernização. Se o governo compreender bem esta importância do setor olivícola, terá de adotar algumas medidas concretas. Talvez a primeira delas, seja o Ministério da Agricultura e a Autoridade de Gestão do PEPAC passarem a incluir os projetos de investimento em novos olivais e lagares nas situações objeto de financiamento comunitário, no âmbito do PEPAC.
Desde há 5 anos que os projetos no setor foram ostracizados e afastados das medidas de apoio ao investimento, por uma decisão influenciada por opiniões de cariz ideológico que diabolizaram completamente a cultura do olival. O Governo tem de pôr termo a isto.
Uma segunda é aumentar o apoio ao olival comummente designado por tradicional. É um tipo de olival que, além do objetivo de produzir azeite, tem também uma função social. De facto, sendo o tipo de olival predominante no país, ele faz parte do sustento de muitas famílias. É tradição, é paisagem, é património. Sendo certo que a produção de um olival tradicional nada tem a ver com a de um superintensivo, têm sido estes olivais que têm preservado as variedades tradicionais portuguesas que, nalguns azeites, lhes conferem determinados atributos muito apreciados pelo consumidor português.
Por outro lado, a dificuldade em mecanizar todo o processo num olival tradicional tem sido um dos maiores entraves à sua manutenção e à viabilização das explorações, pelo que se tem assistido algum abandono. Este aspeto, juntamente com outros, justificaria um maior apoio a este tipo de olivais, sobretudo pela sua função social e ambiental.
Outra medida a ter em conta, seria desbloquear o papel da Associação Interprofissional do sector, a AIFO, e permitir que esta, através de uma portaria de extensão, possa obter o financiamento necessário para a valorização e promoção do azeite português, cá dentro e lá fora. Provavelmente, serão ainda necessárias negociações entre todos os players do setor mas o Governo tem condições para tomar alguma iniciativa neste domínio.
Quais as perspetivas de futuro para o setor do azeite?
Tendo em consideração que o azeite é a gordura mais saudável que existe no mundo e que representa apenas uma percentagem ínfima das gorduras animais e vegetais consumidas no Mundo, dir-se-ia que existe um grande potencial de crescimento do consumo de azeite e, portanto, um futuro prometedor para o setor do azeite em geral.
Esta constatação influencia os investimentos na produção de azeite. No caso português, este sentimento otimista justifica a contínua tendência de instalação de novos olivais, cujas produções, muito provavelmente, se destinarão a mercados externos, aumentando o nível de exportações.
No mercado interno, com o nível de preços dos últimos 2 anos, houve uma quebra de cerca de 11% no consumo de azeite. Ainda assim, o consumidor de azeite resistiu, dado que o aumento percentual do preço do azeite foi muito mais elevado. Mas sem dúvida que precisamos de uma estratégia de apelo ao consumo de modo a quebrarmos uma tendência, que já existia antes da alta de preços, de manutenção ou ligeira quebra no nível de consumo de azeite. Esta tendência verifica-se, em geral, nos outros países europeus mediterrânicos, tradicionais produtores de azeite (Espanha, Itália e Grécia).
Mais uma vez, regista-se que o setor precisa que a sua estrutura interprofissional funcione verdadeiramente, de modo que sejam construídas campanhas de promoção do consumo junto de novos consumidores (jovens), que evidenciem as suas características benéficas para a saúde e a sua forte ligação à Dieta Mediterrânica. A AIFO servirá ainda para apoiar a divulgação da qualidade do azeite nacional, promovendo a marca portuguesa e ajudando à criação de mais valor para a produção nacional. Oxalá este novo governo que agora entrou em funções consiga perceber o papel fundamental e a missão da estrutura interprofissional do sector olivícola.














