Vamos lá dar uma ajuda ao Biometano

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

O Plano de Ação para o Biometano (PAB 2024‑2040), que foi aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2024, de 15 de março, estabelece uma estratégia integrada e sustentada, para o desenvolvimento do mercado do biometano em Portugal. O objetivo do PAB é o de substituir 9% do consumo do gás natural por biometano até 2030 e 18,6% até 2040 Este plano é um vetor de desenvolvimento sustentável e uma oportunidade para o país que se pode vir a transformar numa vantagem competitiva. Torna-se agora necessário acelerar a implementação do PAB de forma a atingir a concretização dos seus objetivos de forma mais célere e condizente com a calendarização dos investimentos previstos Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) permitindo uma boa exploração destes fundos.

Existem atualmente já duas unidades de produção de biometano, nomeadamente para utilização na mobilidade, dando origem aos primeiros dados factuais sobre a descarbonização obtida por essa via, sendo, segundo o Diretor Executivo da empresa em causa, já possível comparar o desempenho efetivo comparado com o caso da mobilidade elétrica. Tomando essa divulgação de há poucos dias como verdadeira, esses dados, segundo este mesmo responsável, apontam para que, apenas com 19 postos de abastecimento de biometano, a descarbonização por esta via da mobilidade rodoviária foi equivalente a mais de 1/3 da obtida pela via da mobilidade elétrica a nível nacional, que conta com muito mais de 5600 postos públicos de carregamento (>10000 pontos de carregamento) e, estimativamente, cerca de cem mil postos de carregamento privados dos consumidores (empresas, residências…).

Agora imaginemos isto a uma escala maior, sem grandes alterações nem novos e avultados investimentos a nível das frotas, sem mudanças de hábitos para os consumidores e partindo de recursos endógenos!

Em novembro passado, uma empresa internacional a nível da sustentabilidade e eficiência energéticas, nomeadamente para o edificado, divulgou também um artigo em que era referido que o biometano era mais eficiente que a eletrificação total do consumo térmico para descarbonizar os edifícios. Sabe-se que os edifícios representam uma parte muito importante do consumo de energia final, pelo que assim se evidencia o relevo desta constatação.

Reportando-se ao caso espanhol, que tem 30% da energia final consumida pelos edifícios e em que os combustíveis fósseis são usados para 63% do consumo dos edifícios (sobretudo aquecimento e águas quentes sanitárias), verifica-se que a sua procura e uso são muito sazonais. Essa sazonalidade supõe um baixo custo para o armazenamento do vetor energético. O armazenamento de gases tem um baixo custo, em comparação com o armazenamento de eletricidade necessário se se eletrificasse (ex. bomba de calor) o correspondente ao uso dos combustíveis fósseis nos edifícios. E a eletrificação dos edifícios provocaria o aumento da procura em ponta da eletricidade, e em determinadas alturas do ano, com os problemas daí emergentes, entre outros motivos devidos à intermitência dos principais componentes renováveis do sistema elétrico.

Este estudo, para a situação de referência, concluiu que o biometano era o combustível mais barato por unidade de energia, se se considerarem as necessidades de armazenamento sazonal, quando se considera a comparação com a eletrificação total.

Ficam aqui estas duas abordagens – outras poderão ser feitas, evidentemente – que pretendem ser esclarecedoras relativamente às potencialidades do estabelecimento de uma cadeia de valor e de um mercado alargado para este gás renovável.

Um dos aspetos a ter também em linha de conta é o preço futuro do gás natural (GN) que interessa para uma análise económica comparativa que pode ter influência para o mercado do biometano. Existem muitas teorias e especulações relacionadas com as questões geopolíticas. Estas incógnitas determinam uma grande volatilidade na disponibilidade e no preço. Com o biometano, dada a produção endógena, essa volatilidade deverá ser muito menor, conferindo uma maior confiança aos operadores e consumidores.

Voltando ao PAB, verifica-se que, se tivermos em linha de conta o potencial técnico (cenário mais provável e realista) do biometano em Portugal, cerca de 73% desse potencial pode ser conseguido através da digestão anaeróbia dos vários resíduos e efluentes considerados acrescido da gaseificação de resíduos florestais. Estes processos correspondem também a tecnologias com os TRL mais elevados e em parte estão relacionados com instalações já existentes para a produção de biogás. Por isso será por esta via que se deverá apostar desde já para se avançar com a brevidade que se impõe.