Prioridades climáticas: Europa vs. África

Por Maria Godinho, analista da Systemic

Não é segredo que somos nós, países do Norte, os maiores responsáveis pelas alterações climáticas, embora as suas consequências recaiam principalmente sobre os países do Sul Global.

A desigualdade entre os países do Norte e do Sul Global em relação às alterações climáticas é um tema central no debate sobre justiça climática.

Não é segredo que somos nós, os países de Norte, os maiores responsáveis pelas alterações climática e historicamente responsáveis pelo aumento das emissões de gases de efeito estufa. Somos também nós, países do Norte, que temos maior capacidade em mitigar as emissões de GEE e nos adaptar às consequências que os impactes das alterações climáticas nos podem trazer.

Por outro lado, embora contribuindo muitíssimo menos para o aquecimento do planeta, os países do Sul Global, são desproporcionalmente mais vulneráveis aos impactes mais severos causados pelas alterações climáticas como catástrofes naturais ou insegurança alimentar. Eventos esses derivados daqueles que mais emitem GEE, ou seja, nós: os países do Norte.

Como se enquadra nesta realidade o financiamento verde da União Europeia?

As exigências relacionadas com a mitigação das alterações climáticas no acesso a capital são cada vez mais rigorosas a nível europeu e com consequências a nível mundial. Impulsionados pelo Pacto Ecológico Europeu, investidores e instituições financeiras valorizam empresas com estratégias claras de redução de emissões, metas de neutralidade de carbono, transparência nas divulgações ambientais e a integração de critérios ESG nas suas operações. Empresas que não atendem a essas exigências enfrentam maiores dificuldades em garantir financiamento competitivo e atrair investidores. Tudo isto faz sentido numa Europa onde a tecnologia está disponível, as infraestruturas existem e a segurança ainda está presente.

Mas como se enquadram estas exigências nas empresas que operam em África? Onde não está disponível a tecnologia ou infraestrutura para optar por veículos elétricos ou alternativas de maior eficiência energética. Onde o custo do transporte de certas tecnologias ainda inviabiliza o modelo de negócio ocidental? Onde a prioridade reside na necessidade que uma estrada consiga resistir às inundações cada vez mais frequentes; e na urgência que as plantações agrícolas consigam adaptar-se aos novos padrões de precipitação.  Onde a manutenção é inexistente e a prioridade é o presente: salvar vidas hoje e no futuro.

Neste contexto Africano, a adaptação aos impactes das alterações climáticas torna-se fundamental e prioritária. E por isso, a inclusão do fator resiliência e capacidade de adaptação, devem ser também fatores decisivos na análise do risco presente e futuro. Enquanto no Norte muitas das práticas “verdes” são de mitigação sendo isso que se valoriza pelos investidores, na realidade, no Sul as práticas mais “verdes” são as de adaptação, para as quais o Norte ainda não consegue incorporar nos seus modelos.

Há que adaptar as exigências da transição verde ao contexto local em causa. África é diferente da Europa. As boas práticas verdes Europeias não são, necessariamente, as melhores práticas verdes em contextos Africanos. Há que ajustar as exigências à realidade. Sem isso, não só não é justo, mas o custo social é demasiado elevado.

Em África é a resiliência às alterações climáticas que importa.

E isso também conta.