Os danos colaterais da pandemia e da invasão Russa: a blocalização e a partenogênese

Por Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

Para além da tragédia que causou a pandemia, com inúmeras vítimas mortais á semelhança da Invasão Russa, existiu um dano colateral que ninguém imaginava que existisse: a “morte” da globalização e a emergência da blocalização. Os constrangimentos das cadeias de “supply chain”, os lockdowns, a dependência extrema de alguns mercados fornecedores de produtos “commodities” e baixo preço mas que já são agora de valor elevado, a utilização da economia como arma política, a cibersegurança, … Tudo isto provocou o encerramento da economia global e transformou-a em blocos. Á semelhança do que aconteceu no apogeu da guerra fria e mesmo em menor escala, na crise de 2008 (com medo do risco de contágio das economias). O mercado livre está a desaparecer e estamos a entrar numa nova era. E nem o mundo digital impedirá esta tendência. Até porque as regras para as grandes empresas do mundo digital já não são iguais em todo o mundo, sendo os EUA mais liberais (e protetores) das suas empresas (Meta, Twitter, Google, etc), a Europa mais conservadora (devido á proteção de dados e risco de “fake news”) e a China mais invasora. Portanto até o mundo digital está blocalizado. Estão criados 6 blocos, em minha opinião, compostos por:

Bloco 1: composto pela América do Norte (EUA, Canadá, México, Uk,Israel);

Bloco 2: países Chinófolos (China e países da sua influência);

Bloco 3: países Europeus e alguns países do Norte de África como Marrocos e Argélia,;

Bloco 4: países da AustralÁsia e fortes ligações ao bloco 1 (Austrália, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Japão , Taiwan);

Bloco 5: países BIATINA e já não os BRIC ( Brasil, Índia, Arábia Saudita, Turquia, Indonésia, Nigéria e África do Sul), com um volume de população e PIB elevado, com aproximações a alguns blocos mas essencialmente “não alinhados”;

Bloco 6: composto pelos países desblocalizados (países de africa, América centro e sul, Ásia), países sem bloco (federação russa, Coreia do Norte, Sudão, entre outros) e multiblocais (que se continuarão a relacionar com vários blocos como a Suíça).

Tudo isto porque os Países que passaram de valorizar a sua segurança económica e agora voltaram a valorizar a sua segurança física. Os trade-offs são grandes pois passámos da liberalização e abertura ao fecho e fratura em blocos, num mundo “chat GPT” que pensava que os algoritmos resolviam tudo. O “suply chain” já não é “deslocalizado”, “low price e off shore”; mas passou a “near e friendly shore”. Por outro lado a tentativa do fim da supremacia do dólar por alguns blocos nas transações internacionais e tentativa de surgimento de outras moedas como forma de moeda base para estas transações (por exemplo, o renminbi; a moeda Chinesa) é uma forma de militarização da economia e da moeda (pois é um movimento financeiro forçado, dado que desde os acordos de “Bretton Woods” em 1944 e do “Nixon shock” em 1971 que o dólar americano se tornou a moeda de reserva fiduciária e base das transações internacionais). Provavelmente sem sucesso mas com danos colaterais certamente. Claro que há um risco à blocalização, que é o da retaliação Chinesa que pode ser uma caixa de pandora, com o confisco de bens estrangeiros no seu país ou pelo menos restrições governamentais ao livre comércio.

Em suma, a economia, a sociedade e a história do globo vão mudar de forma radical, como danos colaterais. Uma espécie de partenogênese (que significa “partos virgens” de alguns lagartos que se reproduzem de maneira assexuada) dos equilíbrios e sistemas mundiais que conhecíamos até Fevereiro de 2022.

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