A urgência da qualificação e requalificação da força de trabalho

Por Raul Neto, CEO da Randstad Portugal

O mercado de trabalho está em acelerada transformação. A revolução digital, a crescente automação e a inteligência artificial (IA) estão a redefinir as competências necessárias para prosperar na economia do século XXI

Neste contexto, os conceitos de upskilling, enquanto aperfeiçoamento de competências, e reskilling, no sentido de requalificação de trabalhadores, emergem como pilares fundamentais na definição estratégica da política laboral para as organizações. Mais do que uma necessidade individual dos trabalhadores, são um imperativo para assegurar a competitividade empresarial, seja do ponto de vista económico, ou num enquadramento de coesão social.

O estudo Workmonitor 2025 da Randstad, demonstra esta nova realidade de forma objetiva, já que 44% dos trabalhadores referem que não aceitariam um emprego sem oportunidades de desenvolvimento de competências futuras, e que paralelamente, 41% estariam dispostos a sair da sua empresa caso não tivessem acesso a programas de formação e desenvolvimento. Estes números mostram-nos que a qualificação contínua já não é encarada como um benefício extra, mas sim como um critério preferencial no momento de escolher um emprego ou continuar no emprego atual. Contudo, apenas 44% dos colaboradores confiam que os seus empregadores investirão significativamente em processos de upskilling, Esta realidade é ainda materializada pela opinião do lado empresarial ,uma vez que de acordo com o mesmo estudo, 90% das empresas reconhecem que a requalificação dos seus trabalhadores é uma responsabilidade sua, mas 58% admitem não saber como implementar uma estratégia eficaz.

A urgência do upskilling e reskilling não se justifica apenas pela necessidade de adaptação à tecnologia, mas também pela transformação profunda de alguns setores. Muitos dos empregos de hoje não existirão amanhã, mas ainda que algumas profissões ou funções sejam substituídas por máquinas, outras novas surgirão, nas áreas da saúde, ciências de dados, serviços digitais ou energias renováveis. A tecnologia sempre teve a capacidade de criar e destruir emprego, mas seja qual for o saldo deste processo, exigirá sempre uma requalificação da força de trabalho. A esta realidade acresce o já existente diferencial entre as competências existentes e as reais necessidades das empresas, como resultado de um desinvestimento na formação técnica nos últimos anos. Isto significa que o upskilling e o reskilling são fundamentais já hoje, e serão uma realidade até para os trabalhadores mais qualificados, ao longo de toda a vida profissional.

RESPOSTAS CONCERTADAS PARA UM PROBLEMA GLOBAL

Também o Relatório Draghi, apresentado em 2024, identifica a escassez de competências como um dos desafios mais urgentes da União Europeia. De acordo com o relatório, 54% das empresas na Europa reportam dificuldades em encontrar trabalhadores com as qualificações necessárias, um problema que se agrava com o envelhecimento da população ativa, a fraca mobilidade laboral e a inadequação dos sistemas educativos face às novas exigências do mercado. A recomendação central do relatório é clara: os Estados-Membros devem adotar uma abordagem estratégica ao upskilling e reskilling, investindo em formação contínua, reformando o ensino profissional e criando um sistema comum europeu de certificação de competências. Só assim será possível garantir uma transição digital e ecológica que seja economicamente sustentável e socialmente justa.

A questão que se impõe é como concretizar estas recomendações e transformar a requalificação da força de trabalho numa prioridade real e eficaz.

Algumas ideias são mais ou menos consensuais. O investimento em programas de reskilling internos deve tornar-se parte integrante das estratégias empresariais, com incentivos públicos para as organizações que implementem planos robustos de qualificação dos seus trabalhadores. Também a aposta no microlearning, cursos modulares e aprendizagem digital deve ser incentivada para garantir que trabalhadores com diferentes níveis de disponibilidade e contexto profissional possam aceder a oportunidades de upskilling. E a criação de um sistema europeu de certificação de competências permitiria maior mobilidade laboral entre os Estados-Membros, reduzindo barreiras à contratação e facilitando o reconhecimento de qualificações adquiridas nos diferentes países.

O futuro da formação profissional deve assentar numa colaboração estreita entre os vários stakeholders, das empresas às instituições de ensino, dos organismos públicos aos governos, garantindo que a formação disponibilizada reflete as reais necessidades do mercado. O upskilling e o reskilling não são apenas instrumentos para evitar o desemprego tecnológico, são a chave para o crescimento económico sustentável e a inclusão social. Empresas que investem na qualificação dos seus trabalhadores não só retêm talento como fortalecem a sua competitividade num mercado global em constante evolução.

Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 229 de Abril de 2025