O plano de ação industrial para o setor automóvel europeu: Aspetos energéticos
Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros
Foi apresentada em 5 de março uma comunicação da Comissão Europeia (CE) sobre o Plano de Ação Industrial para o setor automóvel europeu. Esta comunicação aborda, naturalmente, muitos aspetos, mas vamo-nos centrar nos aspetos mais “energéticos” desse plano.
A indústria automóvel é um dos principais motores da prosperidade europeia e até, pode dizer-se, uma parte essencial da identidade da Europa, proporcionando 13 milhões de postos de trabalho e contribuindo com 7 % para o PIB da UE, atualmente representando um pouco acima de mil biliões €. Em 2024 verificou-se que, globalmente, um quinto dos automóveis comercializados eram já elétricos. Esta indústria enfrenta atualmente riscos na cadeia de abastecimento e dependência de algumas matérias-primas e da importação de baterias. Mas é essencial que recupere a liderança neste setor.
A procura de veículos elétricos a bateria na Europa tem sido mais baixa do que antecipado. Embora tenha crescido cerca de seis vezes entre 2019 e 2023 esta decresceu quase 6% entre 2023 e 2024.
A disponibilidade de pontos de carregamento e de infraestruturas de reabastecimento de hidrogénio é uma das condições para o sucesso dos veículos de emissões-zero. Para isso a CE propõe-se a trabalhar com os Estados Membros, por exemplo, numa Iniciativa Corredor de Transporte Limpo Europeu, nomeadamente para veículos pesados, em corredores logísticos, nós urbanos e terminais multimodais. E nos últimos dois anos a capacidade de carregamento cresceu 30% acima do número de veículos que entraram no mercado.
Um aspeto também importante é a informação, pois é necessário que os consumidores possam comparar, de forma transparente, os preços dos carregamentos e consigam facilmente aceder à localização da infraestrutura disponível.
Dado que o custo de uma bateria ronda os 30-40% de um automóvel elétrico típico, é necessário que a Europa aposte na produção de baterias de custo competitivo, o que também está relacionado com investimentos à escala europeia a nível da mineração do material necessário e da sua refinação (toda a cadeia de valor) in-house. Pretende-se acelerar os processos de autorização da refinação destes materiais e ainda financiar sistemas de reciclagem. A CE apoiará também o desenvolvimento de baterias de nova geração atrás da Parceria BATT4EU. Adicionalmente, o plano propõe o estabelecimento, em 2025, de uma Entidade para Acesso a Matérias-primas para Baterias, com o objetivo de auxiliar os fabricantes de automóveis a obter os materiais de que necessitam de forma segura e estável.
A CE também atualizou a lista dos resíduos para promover a economia circular e assegurar que as baterias e os seus valiosos componentes permaneçam na UE durante mais tempo. Assim, classificou o resíduo de baterias trituradas, conhecido como “massa negra” como um resíduo que não pode ser exportado para países não-OCDE, ou seja, terá que ser reciclado e usado dentro da UE, de forma a apoiar a autonomia estratégica e a segurança do abastecimento a nível das matérias-primas relacionadas.
Vão também ser tomadas medidas para melhorar o desempenho e a reparação das baterias dos veículos elétricos, de forma a apoiar as empresas ligadas à manutenção automóvel.
Um aspeto lateral, mas associado a tudo isto, tem a ver com a aposta na produção de veículos mais baratos e acessíveis para os consumidores, de forma a aumentar a sua procura. Para isso a CE promoverá a adoção de esquemas de leasing social no seguimento das recomendações relacionadas com a pobreza nos transportes.
Sabe-se que a partir de 2025, o limite legal para as emissões de CO2 dos automóveis cairá quase um quinto, para cerca de 94 gramas por quilómetro. Os fabricantes também terão de cumprir novos objetivos anuais para as emissões dos seus veículos, uma medida que Bruxelas espera venha a incentivar a venda de veículos com zero ou baixas emissões.
Paralelamente a tudo isto uma forma de acelerar a descarbonização da mobilidade seria não optar exclusivamente pela via da eletrificação, mas sim apoiar também a utilização de combustíveis de base renovável e sustentável permitindo uma transição social e economicamente mais suave e, eventualmente, até globalmente mais ambientalmente ”amigável”.
Afinal de contas não queremos que a indústria automóvel europeia, que está “entalada” entre Estados Unidos e China, faça paragens de produção ou mesmo encerramentos!