
Governança societária no feminino em Portugal: O impacto da diversidade de género na sustentabilidade empresarial
Por Catarina Mendes Ferreira, Dower Law Firm
No atual cenário empresarial, a governança corporativa assume um papel de crescente relevância, impulsionada pela consciencialização sobre a sustentabilidade e as práticas de ESG (Environmental, Social and Governance).
Investidores e consumidores incitam cada vez mais as empresas a adotarem práticas responsáveis, tornando a inclusão de mulheres em posições de liderança um fator crítico para o sucesso e resiliência das sociedades. A diversidade de género nos órgãos de gestão/administração emerge como um fator essencial para uma gestão mais transparente, ética e inovadora.
Portugal tem acompanhado a tendência global de promoção da participação feminina na liderança societária, mas ainda enfrenta desafios significativos.
Propomo-nos, por isso, analisar a interseção entre governança no feminino e ESG, explorando como a legislação societária pode impulsionar a inclusão feminina e fortalecer a sustentabilidade empresarial.
A diversidade de género nos conselhos de administração e órgãos de gestão/administração transcende uma mera questão de equidade, configurando-se como um imperativo estratégico. Dados estatísticos revelam que as sociedades com maior representação feminina na sua gestão apresentam um melhor desempenho financeiro, maior capacidade de inovação e melhor gestão de riscos.
Em Portugal, a representação feminina em órgãos de gestão/administração ainda carece de maior expressão, contrastando com a crescente consciencialização sobre os benefícios da diversidade.
No nosso ordenamento jurídico, a Lei n.º 62/2017 determinou a existência de quotas de 33,3% de mulheres nos órgãos de administração e fiscalização das empresas públicas e cotadas, alinhando-se, assim, com a Diretiva Europeia 2014/95/UE. Contudo, o cumprimento destas quotas é muitas vezes superficial, havendo mulheres que são apenas nomeadas para cargos não executivos, o que não se reflete num impacto real na estratégia empresarial.
A participação feminina nos órgãos de governo das sociedades tem vários impactos positivos, nomeadamente, a tomada de decisões mais equilibradas, uma vez que trazem novos pontos de vista e, portanto, permitem uma avaliação dos riscos de diferentes perspetivas, uma melhoria da transparência e ética empresarial, reduzindo, assim, práticas antiéticas e promovendo um maior compliance e fortalecimento da cultura organizacional, promovendo ambientes mais inclusivos e colaborativos.
A integração de mulheres na governança corporativa está diretamente relacionada aos critérios ESG.
No impacto ambiental, estudos indicam que sociedades lideradas por mulheres adotam mais frequentemente práticas sustentáveis, incluindo redução de emissões de carbono, maior eficiência energética e adesão a princípios de economia circular.
No campo social, a diversidade de género promove a igualdade de oportunidades, a inclusão de grupos minoritários e a melhoria das condições de trabalho.
No que se refere à governança, a presença de mulheres fortalece a transparência, a ética e a responsabilidade na gestão, reduzindo a probabilidade de corrupção e fraudes.
Neste sentido, o Artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 133/2013 obriga empresas públicas a adotarem práticas de responsabilidade social, incluindo a promoção da igualdade de género.
As sociedades que implementam políticas de ESG bem-sucedidas têm demonstrado resultados positivos, não só ao nível reputacional, mas também da atração de investidores e da fidelização de clientes.
O direito societário desempenha um papel fundamental na promoção da governança no feminino e na integração dos critérios ESG nas empresas.
A legislação societária portuguesa e europeia, como a referida Diretiva 2014/95/UE, que exige que as empresas divulguem informações não financeiras sobre questões ambientais, sociais e de governança, estabelece requisitos e incentivos para a adoção de práticas responsáveis.
O direito societário pode facilitar a criação de instrumentos financeiros, como títulos verdes e fundos de investimento socialmente responsáveis, que incentivam as empresas a adotar práticas de ESG e a promover a diversidade de género.
Além disso, fortalece os mecanismos de fiscalização e de responsabilização dos administradores em caso de descumprimento das normas de ESG e de igualdade de género.
Apesar dos avanços alcançados, a ascensão das mulheres aos órgãos de gestão e administração ainda enfrenta muitos obstáculos, como estereótipos de género, falta de políticas de apoio à maternidade e à conciliação entre a vida profissional e familiar e ausência de redes de apoio.
Para superar esses desafios, podem ser adotadas algumas estratégias, tais como a implementação de políticas de trabalho flexível (ex.: teletrabalho e horário flexível); a exigência de transparência nos relatórios ESG, exigindo-se às sociedades que divulguem dados sobre diversidade de género; o incentivo de investidores e fundos de investimento a privilegiar sociedades com boas práticas de igualdade.
A crescente consciencialização sobre os benefícios da diversidade de género e da sustentabilidade, bem como a pressão dos investidores e da sociedade civil, criam oportunidades para a promoção da governança no feminino e da integração dos critérios ESG nas sociedades, que devem ser aproveitadas.
A governança no feminino é um elemento essencial para a construção de sociedades mais sustentáveis, éticas e socialmente responsáveis.
A promoção da liderança feminina deve ser uma prioridade para sociedades, governos e investidores que procuram construir um futuro empresarial mais justo, equitativo e sustentável.