ESG: Conformidade ou transformação estratégica? O desafio real das empresas portuguesas

Por César Santos, Fundador & CEO da Wellow Network

Nos últimos anos, o acrónimo ESG (Environmental, Social, Governance) deixou de ser uma nota de rodapé nos relatórios de sustentabilidade para ocupar lugar de destaque nas salas de decisão das grandes empresas. A dúvida que agora se impõe é mais profunda: será que as organizações portuguesas estão verdadeiramente a integrar o ESG como um motor de transformação estratégica? Ou continuam a tratá-lo como uma exigência regulatória que importa apenas “cumprir”?

O mais recente estudo Tendências que Moldarão o Futuro das Organizações oferece-nos pistas valiosas. É positivo ver que metade das organizações portuguesas (50,4%) já afirma dar prioridade a políticas ESG integradas. Este dado, por si só, sugere uma crescente maturidade e uma perceção clara de que os três pilares – ambiental, social e de governance – não podem ser tratados isoladamente. Ainda assim, quase 15% das empresas continuam a priorizar apenas a dimensão de governance, geralmente associada à gestão de risco e conformidade. E cerca de 5% admitem não ter planos para integrar o ESG de forma estratégica até 2030.

Estes números revelam um país empresarial a várias velocidades. Se, por um lado, algumas organizações — sobretudo grandes empresas com acesso a financiamento e forte pressão dos seus stakeholders — já incorporam o ESG como parte do seu posicionamento estratégico, por outro, a parte substancial do tecido empresarial nacional, composto por PME e microempresas, continua a ver o tema como um complexo desafio regulatório, caro e, por vezes, distante da sua realidade operacional.

É, no entanto, encorajador constatar que o principal fator que motiva o investimento em ESG é o alinhamento com a estratégia de negócio (44,4%). Isto demonstra que muitas empresas compreendem o ESG como alavanca de inovação, eficiência e diferenciação no mercado. No entanto, a reputação e imagem da marca (33,6%) e a vantagem competitiva (35,5%) reforçam essa percepção e dão-lhe um toque mais instrumental do que identitário. Mas, é na reduzida a importância atribuída ao acesso a financiamento sustentável (7,84%) ou às exigências de investidores (13%) que devemos ter a maior preocupação — aparenta que, para muitas empresas, o mercado de capitais e os instrumentos financeiros verdes continuam pouco acessíveis ou mal compreendidos.

Importa também olhar para os obstáculos. O alinhamento de expectativas dos diferentes stakeholders (45,9%), a falta de conhecimento interno (29,1%) e a resistência à mudança (32,1%) surgem como as principais barreiras. A transição para um modelo mais sustentável exige mais do que uma decisão do conselho de administração: requer capacitação, envolvimento transversal e, sobretudo, tempo para reinventar uma nova cultura organizacional.

É aqui que os bons exemplos fazem a diferença. Casos como os da EDP, SONAE, NOS, Delta ou AGEAS demonstram que é possível integrar o ESG de forma sistémica e gerar valor económico, ambiental e social. Em todos, o papel da liderança executiva foi e será determinante. Mas o desafio futuro passa por democratizar esta visão, garantindo que o ESG não permanece apenas ao nível do C-Level, mas se traduz em práticas consistentes em todas as funções da organização.

Para as PME e microempresas, a integração do ESG continua a depender de mais apoio técnico, incentivos públicos e parcerias estratégicas. São estas empresas que mais sentem os constrangimentos de recursos e expertise, mas também são elas que mais podem beneficiar de soluções adaptadas à sua escala. E, principalmente, de formação dos seus quadros para implementar pequenas mudanças que têm um grande impacto.

Em conclusão, o ESG em Portugal está a deixar de ser apenas uma questão de compliance para se tornar um verdadeiro fator de diferenciação e de criação de valor sustentável. Mas, para isso, é necessário aprofundar o conhecimento, reforçar a capacitação e fomentar uma cultura de liderança sustentável. O caminho está traçado, agora é tempo de o interiorizar.