Do legado à vanguarda: os family offices estão discretamente a transformar o capital de risco
Por Thijs Povel, fundador da Dealflow.eu e managing partner do Ventures.eu
O capital de risco tem sido, durante muito tempo, sinónimo de empresas sediadas em Silicon Valley, estruturas de fundos tradicionais e um modelo enraizado de LP/GP (parceiros limitados/parceiros gerais). Mas estamos a assistir a uma revolução silenciosa. Os family offices, outrora vistos como gestores conservadores de patrimónios multigeracionais, estão cada vez mais a aventurar-se na vanguarda do investimento de risco. E estão a fazê-lo nos seus próprios termos.
Historicamente, os family offices operavam nos bastidores, preferindo a discrição à visibilidade pública. Hoje, muitos estão a contornar por completo o modelo de fundos, optando por investimentos diretos em vez de compromissos passivos. Esta mudança não é apenas tática, é filosófica. Os family offices, livres dos ciclos de vida dos fundos e das exigências institucionais de reportar, são guiados por uma visão a longo prazo, alinhamento estratégico e, muitas vezes, uma missão pessoal.
Essa autonomia permite-lhes apoiar projetos que se alinham com os seus valores, seja em inovação sustentável, tecnologia profunda (deep tech) ou agricultura regenerativa. Ao contrário da maioria dos fundos de capital de risco tradicionais, que operam em ciclos de sete a dez anos para demonstrar retornos, os family offices têm a liberdade temporal de pensar em décadas. Estão a financiar aquilo que muitas vezes as instituições não conseguem: apostas arrojadas em tecnologia climática, inovações negligenciadas em saúde e infraestruturas de longo prazo para a inteligência artificial — categorias onde a paciência e a convicção pesam mais do que a taxa interna de retorno.
A partir da nossa posição, no cruzamento entre a criação de negócios e a descoberta de investidores, vemos esta tendência a acelerar. As startups procuram cada vez mais estes “parceiros de capital silencioso” por mais do que apenas financiamento. Procuram compromisso, confiança e uma rede que acompanhe o ritmo dos fundadores. Por sua vez, os family offices valorizam o fluxo de oportunidades cuidadosamente selecionadas, a transparência operacional e investimentos que estejam alinhados com o seu legado ou identidade emergente.
Um catalisador crítico para esta dinâmica em evolução? Os eventos de networking, como o 28th Family Office and Investment Forum, que se realiza na Suíça, o London Family Office Forum, em Londres, e o Ventures.eu Forum, na Bélgica. Fóruns presenciais, cimeiras e encontros temáticos desempenham um papel fundamental na aproximação entre family offices, investidores em early-stage e startups. Estes espaços fomentam não apenas negócios, mas relações. A confiança, tão central à mentalidade dos family offices, é muito mais provável de se construir à volta de uma mesa do que numa folha de cálculo.
Enquanto os Parceiros Limitados (LPs) continuam a reavaliar as suas posições em fundos tradicionais, o próprio modelo de Parceiro Geral (GP) está sob pressão para se adaptar. No entretanto, os family offices estão, de forma discreta, a moldar uma abordagem alternativa ao capital de risco, baseada na flexibilidade, relações diretas, alinhamentos significativos e numa definição mais holística de valor.
Não se trata da transformação ruidosa e mediática que alguns previram. É mais discreta, mais pessoal — e talvez mais duradoura.