Diversidade no topo: Perceções sobre igualdade de género ainda dividem os conselhos de administração em Portugal

Por Maria João Guedes, Professora do ISEG, Lisbon School of Economics and Management e Coordenadora do POWER (Portuguese Women’s Equality Observatory)

Apesar dos avanços nas políticas de diversidade, os conselhos de administração continuam a refletir visões distintas entre homens e mulheres que os compõem, sobre o papel e o valor da igualdade de género nas lideranças. Esta é a principal conclusão do estudo intitulado “On the same page? Differences between male and female board members on the benefits of a gender-balanced representation”.

Este estudo inquiriu mais de 200 membros de conselhos de administração em Portugal com o objetivo de investigar até que ponto os administradores e as administradoras partilham perceções semelhantes sobre a representatividade feminina ao nível da gestão de topo.

Com base na teoria da expectativa-valor, o estudo explora três dimensões essenciais: (1) a perceção da competência das mulheres para liderar (valência), (2) o valor atribuído a um conselho equilibrado em termos de género, e (3) a importância reconhecida à lei de quotas como mecanismo de transformação das perceções sobre igualdade de género.

Os resultados mostram diferenças claras: as administradoras tendem a atribuir maior competência às mulheres, a ver mais valor na presença feminina nos conselhos de administração e a considerar as quotas como ferramentas essenciais para corrigir desequilíbrios históricos. Já os administradores, embora geralmente não se oponham à diversidade, mostram-se mais céticos quanto à eficácia das quotas e menos convencidos de que uma maior representação feminina produza benefícios tangíveis para a organização.

Este desalinhamento entre géneros não é apenas teórico. Segundo o estudo, tem também implicações práticas: pode travar o progresso de políticas internas de diversidade e dificultar a integração plena das mulheres nos processos de decisão estratégica. Deste modo, quando não há consenso dentro dos próprios conselhos de administração, as quotas correm o risco de serem vistas apenas como imposição legal e não como oportunidades de melhoria organizacional.

Além disso, o estudo evidencia que, para as mulheres, a perceção de competência das administradoras influencia diretamente o valor que atribuem à diversidade no desempenho empresarial. Nos homens, essa relação é mais ténue — o que pode sinalizar diferentes modelos mentais sobre mérito e representação.

O estudo também aponta que é necessário ir além do cumprimento formal das quotas. Embora a legislação portuguesa exija que empresas cotadas em bolsa e do setor público empresarial tenham pelo menos 33Nacional% do sexo sub-representado (tradicionalmente as mulheres) nos seus conselhos de administração, a eficácia deste tipo de medidas depende da aceitação e do envolvimento ativo de todos os membros do conselho de administração. Ou seja, a diversidade só é transformadora quando é valorizada internamente e integrada na cultura da organização.

Em suma, o estudo conclui que as diferenças de perceção entre homens e mulheres sobre igualdade de género nos conselhos de administração ainda são significativas — e que reconhecer essas divergências é fundamental para que políticas de diversidade sejam verdadeiramente eficazes e sustentáveis no tempo.

On the same page? Differences between male and female board members on the benefits of a gender-balanced representation. Corporate Governance: The International Journal of Business in Society23(3), 514-533.

Disponível em: https://doi.org/10.1108/CG-01-2022-0032