Como pode a reabilitação combater as carências habitacionais que continuam a existir no nosso país?

Por Catarina Crespo, Responsável de Marketing da MELOM e QMACO

Apesar de vivermos numa era de crescente modernização urbana, Portugal continua a enfrentar um problema estrutural que, ano após ano, resiste a soluções definitivas: as carências habitacionais. Num país onde mais de 65 mil famílias vivem em condições indignas e onde há, simultaneamente, centenas de milhares de imóveis devolutos ou subutilizados, é inevitável questionar se não estaremos a procurar as respostas no lugar errado. A reabilitação urbana, tantas vezes secundarizada face à construção nova, pode – e deve – assumir um papel central no combate a esta realidade.

Reabilitar não é apenas restaurar fachadas ou renovar interiores. É, acima de tudo, um ato de inteligência urbanística e responsabilidade social. Ao optar por recuperar o que já existe, reduz-se o consumo de solo, evita-se o desperdício de recursos e responde-se a uma necessidade urgente: garantir habitação condigna para todos. Mais do que uma opção estética ou económica, a reabilitação é uma ferramenta de justiça social e de coesão territorial.

Temos hoje instrumentos e programas que já demonstraram ser capazes de canalizar apoios para projetos de reabilitação com impacto. No entanto, os entraves continuam a ser muitos: processos burocráticos morosos, financiamento de difícil acesso para os pequenos proprietários e, por vezes, uma excessiva rigidez regulamentar. Para que a reabilitação possa verdadeiramente responder às carências habitacionais, é urgente simplificar, descomplicar e, sobretudo, priorizar.

Não basta legislar; é preciso operacionalizar. Não basta anunciar investimentos; é necessário garantir que estes se traduzem em resultados visíveis nas ruas, nos bairros, nas vidas das pessoas. E para isso, é fundamental envolver os municípios, as comunidades locais e os próprios cidadãos, numa lógica de participação ativa que vá além da mera execução técnica dos projetos. A reabilitação urbana deve ser vista como uma oportunidade de regeneração humana e não apenas física.

Num tempo em que se discute tanto a sustentabilidade e o futuro das cidades, é paradoxal continuar a assistir à degradação do nosso património habitacional, enquanto se promovem construções novas que, muitas vezes, não respondem às reais necessidades da população. A resposta não está apenas em construir mais, mas sim em reabilitar melhor.

Portugal precisa de um novo olhar sobre o seu edificado. Um olhar que reconheça o valor do que já existe, que respeite a história dos bairros, mas que também se comprometa com o futuro das famílias que os habitam. A reabilitação, se encarada com ambição, estratégia e sensibilidade social, pode ser a chave para resolver um dos problemas mais persistentes do nosso país.

Porque, no fundo, reabilitar é cuidar – e Portugal precisa urgentemente de cuidar da sua casa.