Bem prega frei Tomás: Faz o que ele diz, não faças o que ele faz
Por Pedro Alvito, professor da AESE Business School
Quando no séc. XVI o pobre frei Tomás pronunciou esta frase mal imaginaria como a mesma iria ser uma verdade que atravessa todos os tempos. E por isso se tornou, hoje em dia, uma verdade inquestionável da política, da vida social e infelizmente até da vida das nossas empresas. Somos bons a sugerir aos outros comportamentos e práticas que nós pura e simplesmente ignoramos e não praticamos. E isto é verdade não só nos comportamentos mais simples como nas práticas mais elaboradas, senão vejamos.
1. Exigimos constantemente que nos ponham as coisas por escrito para saber com o que contar, mas nós não pomos nada por escrito. Numa determinada empresa o procedimento é X, toda a gente o conhece, mas nunca ninguém o viu escrito. Uma vez disseram-me que o que eu tinha feito era contra os procedimentos. Como os desconhecia pedi que me os enviassem por escrito. Até hoje…
2. Exigimos pontualidade a tudo e a todos, fornecedores, funcionários e demais relações. Ficamos agastados porque ninguém é pontual connosco. Mas somos nós pontuais nas nossas responsabilidades e compromissos?
3. É sempre urgente aquilo que precisamos nas nossas empresas (e na nossa vida). Eu diria mais, só temos um critério para os outros – urgente! Mas nós temos uma versão do tempo que, para nós, é flexível e elástica. Quantas vezes pedimos ao nosso fornecedor uma proposta urgente que ele para a conseguir apresentar nem dorme (obrigação dele, dizemos) mas depois demoramos meses para responder. Os casos são inúmeros.
4. Gostamos de ter toda a atenção aos nossos assuntos porque se o assunto é nosso é de certeza importante, aliás muito importante. Já quanto ao que preocupa os outros somos bastante mais liberais o que é o mesmo que dizer, talvez um dia se tivermos tempo…
5. Gostamos de receber boas notícias e achamos que as más noticias devem ser-nos dadas com cuidado e preparação. Somos rápidos na nossa empresa a dar boas notícias, chamamos as pessoas e fazemos disso um momento. Já para dizer que não, preferimos não falar, nada dizer ou ficamo-nos por uma mensagem, email ou telefonema. Ainda há pouco tempo um familiar meu que estava em fim de contrato foi despedido por telefone pela responsável de recursos humanos em que com grande alegria lhe comunicou que iria receber um email com as contas. Nunca tinha visto tal pessoa e nem o seu chefe direto com quem tinha falado e
trabalhado todo o dia lhe disse nada… Somos bons a anunciar boas práticas na nossa empresa, mas depois quando toca a ser corretos nas nossas práticas pomos as nossas “teorias” na gaveta. Os acontecimentos e a nossa preservação pessoal são sempre mais importantes. É muito fácil desculparmo-nos.
O mundo precisa de verdadeiros líderes. A teoria todos nós a sabemos, assistimos a várias formações ao longo da vida, lemos ótimos livros sobre boas práticas e temos fantásticos manuais e certificações de ESG. Mas tal como o pobre frei Tomás somos melhores a dizer do que a fazer. Aliás somos muito bons a exigir tudo isto para nós, mas esquecemos tudo quando toca aos outros. Talvez valha a pena um esforço e perceber que temos urgentemente de começar por nós.