As empresas e os governos populistas

Por Tiago Cruz GonçalvesProfessor de Finanças do ISEG, Universidade de Lisboa

A investigação empírica sobre governos populistas identifica impactos consistentes no ambiente empresarial. A análise de Funke, Schularick e Trebesch, que cobre 51 casos desde 1900, mostra que, quinze anos depois da posse, o PIB per capita é cerca de dez por cento mais baixo, a dívida pública dez pontos mais alta e a inflação praticamente duplica, repercutindo-se nas decisões de gestores e investidores.

No plano fiscal surgem duas fases. Na primeira, o executivo implementa uma significativa disciplina orçamental para manter o crédito externo, como na Hungria (2010-2013) ou no México (pós-2018). A seguir, quando o partido consolida apoios ou se aproximam eleições surgem aumentos de despesa social, promoções salariais no sector público e cortes fiscais dirigidos, fenómeno visível na Hungria, Polónia e Itália, onde a despesa primária superou em média entre um e dois pontos do PIB a tendência de vizinhos não populistas.

Em paralelo, a política monetária perde parte das amarras institucionais. A substituição dos governadores do banco central na Índia, em 2018, e na Turquia, entre 2019 e 2021, foi seguida por moedas mais fracas e spreads soberanos maiores, encarecendo a dívida das empresas financiadas em dólares ou em euros. A intenção de relocalizar produção, erguer tarifas e instituir quotas nacionais reduz a abertura externa. Entre 2014 e 2023, a quota das importações no PIB dos países populistas recuou cerca de 4% e as entradas de investimento direto estrangeiro diminuíram cerca de 11%. A produtividade avançou muito menos do que em economias mais abertas.

Face a este cenário, as empresas diversificam geografias produtivas, reforçam mecanismos de conformidade para diminuir litígios e recorrem a ação coletiva ou arbitragem para conter medidas discriminatórias.

A solidez institucional continua a ser o melhor amortecedor. Em países com uma maior proeminência do Rule of Law, a quebra na captação de capital externo é sensivelmente metade da verificada onde se degrada a independência do banco central.

Nos mercados financeiros, as cotadas de países populistas registam retornos anuais, em média, entre um e dois pontos percentuais mais baixos e maior volatilidade, enquanto os estudos sobre dívida corporativa apontam para um prémio de risco externo que costuma situar-se no intervalo 50–80 pontos base, penalidade que o FMI associa a um investimento privado mais fraco.

Num plano mais microeconómico, o favoritismo político materializa-se em redes clientelares. Um conjunto de estudos mostra que as empresas politicamente ligadas possuem entre 18% e 32% mais probabilidade de ganhar contratos junto do Estado do que concorrentes sem essas ligações. No entanto, essas empresas operam, em média, com margens mais baixas, sinal de ineficiência gerada pela proteção. Em paralelo, evidência de painel para mais de quarenta economias revela que, após uma viragem populista, a despesa privada em I&D recua tipicamente entre 6% e 10% nos cinco anos seguintes, reduzindo o ritmo de inovação e de ganhos de produtividade de longo prazo.

Também os custos de conformidade aumentam, sobretudo para PMEs. Inquéritos aos gestores mostram um acréscimo no tempo dedicado a procedimentos administrativos e a inspeções inesperadas, consequência de um quadro regulatório mais volátil, causando atrasos no lançamento de produtos e maior dependência de liquidez de curto prazo. Para multinacionais cotadas, a Moody’s tem vindo a registar vários casos de degradação de risco regulatório logo no primeiro ano após transições populistas.

A estas pressões junta-se a fuga de capital humano. A Eurostat calcula que, entre 2013 e 2020, a emigração líquida de diplomados aumentou de forma marcada em países como a Hungria, fenómeno que o Institute of Labor Economics relaciona com expectativas de progressão limitadas num contexto onde as decisões económicas parecem cada vez mais dependentes de critérios partidários.

Em suma, tudo indica que o populismo tende a conceder alívios imediatos a grupos específicos, mas instala para a comunidade empresarial um ambiente de incerteza regulatória, crédito mais caro e menor integração internacional que trava o investimento e o crescimento. A severidade do impacto depende da resiliência institucional e da capacidade das empresas para diversificar riscos, reforçar governação interna e incorporar métricas de estabilidade política nas suas decisões estratégicas.