A transformação digital da justiça é um desafio coletivo

Por Joana Miranda, Responsável de Administração Pública da Minsait em Portugal

Na Era Digital em que vivemos, é imperativo incorporar soluções tecnológicas que agilizem o contacto entre os cidadãos, as empresas e os serviços públicos. A Justiça, como serviço público, deve estar preparada para se adaptar à evolução da sociedade e à exigência de proximidade e transparência que a Administração Pública deve satisfazer. E por esse motivo, é essencial dotá-la de todos os meios necessários para garantir e aumentar o acesso ao sistema judicial, agilizar a resolução de processos e melhorar qualitativa e quantitativamente o serviço.

A transição digital é a principal prioridade do Plano Justiça + Próxima, implementado entre 2016 e 2019 que apresentou a visão de transformação digital da Justiça e cujo objetivo foi a aplicação de medidas tecnológicas, administrativas e legislativas para aproximar a Justiça dos cidadãos. Mais recentemente, Portugal e Espanha assinaram um memorando de entendimento sobre a digitalização e inteligência artificial na Justiça, que visa promover uma cooperação bilateral para o incremento da utilização de tecnologias e ferramentas digitais. Adicionalmente, cerca de 26 milhões de euros do PRR serão utilizados para desenvolver a primeira Estratégia de Govtech, centrada na aplicação de Inteligência Artificial para transformar a Justiça.

Está claro que a transformação digital chegou também à Administração da Justiça. Mas temos de ser conscientes que é essencial colocar as pessoas no centro do processo de transformação, uma vez que são um elemento essencial que, graças à sua participação e compromisso, tornam possível alcançar os objetivos traçados. E aqui falamos não apenas de cidadãos, mas também dos profissionais que colaboram no setor da Justiça, aos quais devem ser fornecidas as ferramentas necessárias à adaptação. Um dos principais requisitos é a disponibilidade de espaços permanentes de formação: as atuais Plataformas Digitais para a gestão da aprendizagem, de e-learning e do ciclo completo de avaliação, combinam diferentes técnicas para melhorar a aprendizagem baseada em tecnologias avançadas, como assistentes virtuais. Dotadas de conteúdos de formação de qualidade, estas vão permitir aumentar as competências digitais, bem como reforçar e ajustar as competências genéricas e específicas necessárias para melhorar o desempenho dos profissionais da Justiça, como utilizadores do ecossistema digital. Algo que vai seguramente ter um impacto direto e fundamental na eficiência e eficácia do serviço, bem como na qualidade dos dados e produtividade.

O próximo passo será a criação progressiva de um Ecossistema Digital Integrado de Justiça para a partilha de dados e a exploração de múltiplas fontes, internas e externas à Administração da Justiça, com uma utilização intensiva da tecnologia Big Data. Devido às características e idiossincrasias próprias do Serviço Público de Justiça, que conferem um contexto único aos dados nele gerados e processados, é necessário criar um ambiente de trabalho de Justice Data Analytics para facilitar a extração do máximo valor possível do enorme data lake representado pelo Serviço Público de Justiça. A automatização e a Inteligência Artificial estarão incorporadas transversalmente neste ecossistema digital integrado da Justiça.

Por outro lado, a cibersegurança é um elemento transversal da digitalização, com particular relevância num serviço público tão importante e crucial para a sociedade, como é o caso da Justiça. O objetivo é a segurança das pessoas, das infraestruturas, da informação e do próprio serviço público da justiça, que deve ser protegido contra os ciberataques, garantindo a sua estabilidade e continuidade.

A tecnologia servirá como um meio de agilizar os procedimentos judiciais, reduzindo erros e custos, aumentando a disponibilidade e otimizando os recursos do serviço público graças à Automação Judicial Inteligente, assegurando que o tempo das pessoas é utilizado em momentos-chave e com a assistência necessária através da Inteligência Artificial para potenciar as suas capacidades. O processamento de Linguagem Natural e a mineração de texto, que atualmente já estão a fornecer resultados muito fiáveis na exploração de dados extraídos de documentos, serão em breve o mecanismo predominante para obter conhecimentos a partir dos milhões de documentos disponíveis no Serviço Público de Justiça. A sua combinação adequada com Inteligência Artificial possibilitará a criação de ferramentas que ofereçam apoio aos juízes, procuradores e ao corpo de assessores jurídicos da Administração da Justiça na tomada de decisões inerentes às suas funções e responsabilidades.

Este é um momento-chave no processo de transformação digital da Administração da Justiça. Todos somos conscientes que não se trata de uma estratégia isolada e que precisa de estar conectada às mudanças sociais, económicas, ambientais, educativas, tecnológicas, entre outras. Mas também somos conscientes que são necessários investimentos em tecnologia e em medidas de segurança e privacidade para garantir que a digitalização da justiça seja uma realidade em Portugal. Finalmente, é fundamental que haja um compromisso de todos os envolvidos no setor judicial (juízes, advogados e demais profissionais da justiça), mas também outras administrações, operadores jurídicos e cidadãos, para que a transformação seja consistente e alcance o seu objetivo primordial – uma justiça mais ágil e eficiente. Porque a transformação digital da Justiça não é um desafio da Justiça, mas sim de todos.

Ler Mais

Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.