A fome já está a desenrolar-se em Gaza e poderá provocar “mortes generalizadas” se não forem tomadas medidas imediatas, advertiu esta terça-feira a Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar (IPC), o principal organismo global de monitorização da fome, apoiado pela ONU. “O pior cenário possível de fome está atualmente a ocorrer na Faixa de Gaza”, lê-se no alerta, que destaca o aumento dramático da desnutrição, doenças e mortes relacionadas com a falta de alimentos.
Apesar de o comunicado não constituir uma declaração formal de fome, a IPC confirma que vários dos seus critérios técnicos já foram ultrapassados, incluindo em termos de consumo alimentar e malnutrição aguda. A situação agravou-se após quase dois anos de guerra entre Israel e o Hamas, marcada por bloqueios, destruição de infraestruturas e uma assistência humanitária que continua a falhar no terreno.
“A evidência acumulada mostra que a fome generalizada, a malnutrição e as doenças estão a provocar um aumento das mortes relacionadas com a fome. A inação levará inevitavelmente a mortes generalizadas em grande parte da Faixa de Gaza”, lê-se no relatório. A Comissão de Revisão da Fome da IPC, que valida de forma independente estes dados, apoiou as conclusões e confirmou que, apesar das limitações de acesso, os indícios de colapso alimentar são inegáveis.
Segundo a Organização Mundial da Saúde e o Programa Alimentar Mundial, um em cada três habitantes de Gaza passa dias sem comer. Os hospitais relatam um aumento acentuado de mortes por fome em crianças com menos de cinco anos, e mais de 2 milhões de pessoas continuam cercadas numa região onde os serviços essenciais colapsaram.
Israel tem sido duramente criticado por restringir a entrada de ajuda humanitária desde o início da guerra. Em março, chegou a cortar totalmente o fornecimento de alimentos, medicamentos e combustível, alegando que o Hamas usava a ajuda internacional para fins militares. Apesar de algumas medidas de alívio anunciadas em maio e da introdução de um novo sistema de entrega apoiado pelos EUA, os bloqueios, o caos e os saques continuam a dificultar a distribuição.
“88% de Gaza está sob ordens de evacuação ou em zonas militarizadas”, alerta o relatório, que sublinha que “o acesso à comida é agora extremamente irregular e perigoso”. Embora Israel diga não impor limites à entrada de camiões de ajuda, as organizações humanitárias garantem que os atuais esforços são insuficientes para conter o agravamento da crise.
O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, afirmou recentemente que “ninguém está a morrer de fome em Gaza” e que a ajuda enviada seria suficiente “caso contrário, não haveria gazenses”. Contudo, o presidente dos EUA, Donald Trump, contrariou essa versão. “Há fome real em Gaza”, disse esta segunda-feira, durante uma visita à Escócia. Trump prometeu criar centros de distribuição de alimentos abertos e apelou a que Israel facilite o acesso à ajuda.
Entretanto, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, informou que o número de mortos provocados pela guerra ultrapassa agora os 60.000 palestinianos. Israel, por seu lado, contabiliza cerca de 900 soldados mortos desde o início do conflito, sem especificar números relativos a civis ou combatentes do Hamas.














