Por José Galamba de Oliveira, Presidente da APS
A estas três grandes alavancas estruturais de mudança, adicionamos nos últimos anos uma nova dimensão, as profundas alterações geopolíticas e macroeconómicas em vários pontos do globo, que implicaram uma capa de complexidade adicional quando analisamos o perfil de risco das sociedades atuais e as perspetivas de evolução futura das mesmas.
Independentemente deste contexto de grande incerteza, aonde as seguradoras já hoje operam, o setor no seu todo desenvolve cenários de evolução dos vários riscos da sociedade em geral, das famílias e dos negócios em particular, de modo a poder antecipar tendências e necessidades e, assim, poder continuar a adaptar e a inovar a sua oferta de produtos e serviços que acrescentem valor e que ajudem os clientes a terem vidas seguras e prósperas.
A novas tecnologias e em especial a emergência e rápida disseminação de soluções baseadas em algoritmos de inteligência artificial estão a provocar disrupções nas cadeias de valor das várias atividades e na vida pessoal e profissional das pessoas. No setor segurador, os dados e o seu tratamento são fatores decisivos para a sua atividade e, nesse sentido, a utilização de todas estas novas tecnologias mais disruptivas, é já determinante na forma como as seguradoras inovam, distribuem, subscrevem, gerem sinistros, competem e comunicam com os clientes. Mas, embora os clientes queiram, cada vez mais, adquirir produtos de seguros online e através de dispositivos inteligentes, é também importante que o nosso setor continue a apoiar os consumidores não digitais, que podem ter dificuldade em utilizar os novos serviços digitais ou, simplesmente, preferir não o fazer. Isto significa que a utilização de novas tecnologias e dados, juntamente com a utilização de técnicas e métodos de trabalho tradicionais, requer boa regulação e enquadramento, adequados a este novo ambiente em evolução, que suporta diferentes modelos de negócio.
As alterações climáticas são uma das alavancas estruturais de mudança da sociedade e representam um enorme desafio para todos. Estudos recentes mostram uma maior frequência e severidade de eventos extremos, como incêndios, tempestades ou inundações, e demonstram que a recuperação da atividade económica para “níveis normais” após um evento climático natural é um processo que pode durar cerca de dois anos nos países desenvolvidos e até oito nos menos desenvolvidos, sem referir que alguns poderão nunca conseguir recuperar. É, por isso, que os governos de todo o mundo estão cada vez mais conscientes dos benefícios socioeconómicos das ferramentas de partilha de riscos, como os seguros, e, por outro lado, estão a integrar estratégias e técnicas de gestão de riscos no planeamento e orçamento do desenvolvimento nacional. Em Portugal, vivemos uma realidade idêntica, e o setor segurador tem defendido ser necessário iniciar um diálogo com o governo português e as autoridades reguladoras para construir uma parceria público-privada eficaz no desenvolvimento de um programa sustentável de partilha de riscos para fazer face a catástrofes naturais, e que pode e deve incluir um pilar focado na resposta para fenómenos sísmicos, já que a exposição do nosso território a este risco é elevada.
O envelhecimento generalizado das populações resultante do aumento da esperança de vida e da queda das taxas de fertilidade nos países desenvolvidos, está a exercer uma pressão sem precedentes sobre os sistemas de pensões estatutários. E os governos estão a introduzir reformas para tornar os seus sistemas mais sustentáveis, aumentando as idades de reforma, limitando o acesso à reforma antecipada e reduzindo a generosidade dos benefícios. O resultado é apenas um: pensões mais baixas.
Esta é a realidade a que assistimos também no nosso País e é, por isso, fundamental criar as condições para que as pessoas aumentem o montante que poupam em regimes de pensões privados e capitalizados. Esta necessidade está bem identificada pela nova Comissão Europeia e é um dos focos da União da Poupança e dos Investimentos (SIU). No nosso País, o desenvolvimento dos pilares complementares no sistema de pensões é também crucial, porque o rendimento que um produto de pensões individual pode proporcionar é, muitas vezes, a diferença entre poder, ou não, levar uma vida independente e digna após a reforma. E o setor segurador pode desempenhar aqui um papel central. O programa do atual governo reconhece esta necessidade parecendo privilegiar mecanismos de 2º pilar com contribuições, das entidades empregadoras e dos trabalhadores, para soluções novas assentes em contas de poupança e contas de investimento, que, até um certo nível, ficariam livres de IRS, salvo se e quando forem distribuídas, pagas ou, de qualquer forma, resgatadas pelos respetivos titulares.
Uma palavra, também, sobre o recrudescimento dos riscos geopolíticos e macroeconómicos, decorrentes, por um lado, dos conflitos armados no leste da Europa e no Médio Oriente e por outro, de políticas económicas que apontam para um retrocesso da globalização e para a criação de blocos económicos mais fechados. Todos estes fatores adicionam incerteza às famílias e às empresas, mas também abrem novas oportunidades para o setor segurador, um setor particularmente bem preparado para enfrentar este ambiente de maior incerteza, quer no seu papel de tomador de riscos quer no papel de grande investidor institucional à escala global.
A indústria seguradora desempenha um papel central na construção de sociedades resilientes sob o ponto de vista económico e social, fornecendo proteção financeira para uma grande abrangência de riscos em permanente evolução decorrente de alavancas como as novas tecnologias, alterações climáticas, e evolução demográfica, com o objetivo de reduzir os gaps de proteção existentes mas reconhecendo-se, ao mesmo tempo, que as seguradoras não podem enfrentar os desafios sozinhas. O progresso sustentado depende de políticas e ambientes regulatórios coordenados e favoráveis que permitam inovação, mitigação de riscos e acesso equitativo ao seguro.
Nota: O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico.
Artigo publicado na Revista Executive Digest n.º 235 de Outubro de 2025




