“Sou um grande defensor da inovação”, diz CEO do grupo Ageas Portugal

O CEO do grupo Ageas Portugal considera que as empresas precisam de desenvolver um elemento de criatividade e de inovação nas suas estruturas.

Nesta entrevista à Executive Digest, Steven Braekeveldt considera que o Grupo Ageas não é apenas um grupo segurador e tem cada vez mais a intenção de estar presente nos momentos importantes da vida dos clientes. Os objetivos e a estratégia da companhia, os desafios do sector, a importância da Inteligência Artificial e a responsabilidade social foram outros temas abordados. 

Quais os objetivos do Grupo Ageas em Portugal para 2022?
No Grupo Ageas Portugal, temos um plano até 2030. Fazemos uma primeira paragem em 2024, e depois 2027 e 2030. Mas nesse primeiro período, até 2024, temos definido o que deve acontecer nos próximos três anos. E 2022 envolve uma preparação de várias coisas em certos pilares que são extremamente importantes. Nada de falsos ambientalismos. Acabámos de nos mudar para um novo edifício em Lisboa, que é também já um exemplo dos nossos elevados padrões de sustentabilidade, mas também incluímos muitas iniciativas com impacto social no edifício, por isso não somos só conversa. Queremos implementar e introduzir, nos nossos produtos e processos, essa sustentabilidade e acreditamos que esse é o caminho a seguir. Mas os nossos clientes, os portugueses, também estão mais atentos. Há cada vez mais secas, os peixes estão intoxicados com microplásticos. Por isso, enquanto empresa, temos de assumir a nossa responsabilidade no design dos produtos e nos processos. É nisso que nos vamos focar, juntamente com muitas outras coisas. 

A empresa está a saber lidar bem com o atual contexto?
Acho que o país, a população e as empresas têm lidado bastante bem com esta pandemia inesperada.
Observo também que os colaboradores estão extremamente satisfeitos com a forma como cuidámos deles, com a forma como cooperamos, com a forma como estivemos presentes sempre que precisaram de nós. É claro que, em certos momentos, o ramo dos seguros teve algumas vantagens com a COVID-19. Mas tal como numa peça de teatro existem vários actos também há a parte negativa deste contexto. O que estou a dizer é que, por exemplo, na área da saúde, durante a pandemia, muitas pessoas deixaram de ir ao hospital fazer consultas de rotina, rastreios oncológicos, muitas outras coisas e estamos a ver uma enorme complexidade de casos, porque não fizeram o que deviam ter feito. Mas sabe tão bem quanto eu que agora estamos a lidar com outra crise, uma ainda mais importante do que a da COVID-19. Por isso passámos de uma crise para a outra. 

Certo, e qual é a importância da inovação na área seguradora?
É enorme. Na realidade, sou um grande defensor da inovação. É isso que nos leva a diferentes setores. Acho que é disto também que Portugal precisa numa escala global: muito mais inovação.
O país tem pessoas muito talentosas e com formação e precisamos de desenvolver, em todas as empresas, um elemento de criatividade e de inovação. Se visitar o nosso edifício poderá ver que até o design foi concebido de forma às pessoas se reunirem, a quebrarem barreiras, a encontrarem-se, a serem criativas, a terem ideias inovadoras, e acho que é esse o futuro. Porque não somos apenas um grupo segurador, mas temos cada vez mais a intenção de estar presentes nos momentos importantes da vida dos nossos clientes. E, para isso, precisamos de ideias mais criativas, não podemos focar-nos só nos seguros.  

E relativamente à Inteligência Artificial, como é que esta tecnologia está a ser utilizada no vosso negócio?
Está a infiltrar-se gradualmente nas diversas áreas da nossa empresa. Temos os chatbots que estão a aprender sozinhos através das perguntas que lhes são feitas, temos um Avaliador de Sintomas na área da saúde, que também se baseia em Inteligência Artificial. Temos robótica, que ainda não é inteligente, mas é robótica que é usada para tarefas rotineiras. Não estou a dizer que estamos no topo do mercado no que toca à Inteligência Artificial em seguradoras, mas aquilo que vejo é que a mentalidade está a mudar e que, primeiro, queremos eliminar os aspetos mais rotineiros do trabalho e fazer as pessoas usar os seus cérebros e a sua criatividade para fazerem os seus trabalhos e, gradualmente, passamos à Inteligência Artificial em processos mais complexos. Mas é um progresso contínuo e ainda estamos longe de lhe ver o fim. 

Que tipo de problemas é que as seguradoras enfrentam atualmente e que ainda não têm uma solução?
Acho que estamos a ser confrontados com um enorme risco de inflação. Ainda teremos de ver como nos adaptamos a isso. Existe um risco de inflação que poderá possivelmente continuar se a crise na Ucrânia continuar e estou a falar em múltiplas vertentes. Portanto, estou a ver isto a um nível macroeconómico.
Previa-se que a Índia substituísse a Ucrânia no fornecimento de alimentos e de trigo, mas, devido às secas, a agricultura na Índia também parou. Isso significa que o custo de vida vai aumentar muito. Já tem estado a aumentar gradualmente, mas acredito que, em 2023, vai aumentar ainda mais.
A inflação na área da saúde vai aumentar, o custo dos carros, das peças de reposição, tudo aquilo em que conseguir pensar, vai sofrer esse impacto. E quando as pessoas veem, na sua conta corrente, que estão quase a aproximar-se do 0 e que existe uma inflação de 7%, as pessoas estão a perder 7% de poder de compra todos os anos. Aquilo que tem um valor de 100 euros hoje, até ao final do ano, vai ter um valor de 93 euros.
No ano seguinte, será ainda mais baixo. Isto é um problema enorme ao qual temos de nos adaptar, de novo, porque apareceu de repente devido à crise na Ucrânia. Se esta inflação já estivesse lentamente a surgir na sociedade… Mas agora temos um crescimento exponencial desta inflação e, de novo, temos de nos adaptar e ver o que podemos fazer para gerir todos estes impactos nos diferentes ramos de negócio, não só na nossa, mas na totalidade da economia. É um novo desafio para todos nós. 

Qual a importância da cultura e da responsabilidade social para a Ageas?
Acho que não é uma questão de importância, elas são sinónimos. O Grupo Ageas Portugal significa sustentabilidade e impacto social. E isto está intrínseco no nosso ADN. Queremos que isto faça parte dos nossos genes, que faça parte de cada reflexão. De novo, se vier ao nosso edifício, verá que o recanto do café é gerido pelos parceiros da nossa Fundação Ageas, o Café Joyeux; o restaurante é gerido pela Crescer, outra ONG; a nossa horta comum é gerida pela Semear. Portanto, isto não é tudo uma coisa teórica, está enraizado no ambiente quotidiano da nossa empresa. Por isso, queremos refletir e consciencializar-nos.
Não há nada de mal em vender um produto com uma avaliação de 0/10 em termos de sustentabilidade, mas temos de ter consciência disso e aumentar essa consciencialização de não haver nada de mal num produto com uma avaliação de 0/10 em inclusão, as pessoas é que têm de ser informadas de que recebeu um 0/10. E aumentar essa consciencialização significa que as pessoas estarão mais conscientes de que têm de tentar escolher mais produtos que tenham melhores avaliações no que toca à sustentabilidade e à inclusão. Acho que é uma mudança cultural, e sabe tão bem quanto eu que mudar uma cultura leva tempo. Estamos a chegar lá, estamos mesmo, mas é preciso tempo para mudar a mentalidade geral. 

Como é que a sua companhia pretende ser mais sustentável nos próximos anos? Falou do vosso edifício…
Creio que temos de combinar princípios regenerativos com princípios rentáveis. E assim, gradualmente, o que queremos ter em mente é que crescer só por crescer não é algo desejável, queremos ter um crescimento com um propósito e os indicadores financeiros devem seguir essa mesma direção. Dou-lhe um exemplo: investimentos. Temos certas metas para investimentos sustentáveis.
Essa é uma parte da equação. No que toca ao crescimento… podemos combinar esse crescimento com potenciais impactos sustentáveis, por isso isolar os objetivos financeiros e dizer: «Estes são os nossos objetivos financeiros e, já agora, estes são os da sustentabilidade», acho que isso não vai resultar no futuro. Tem de haver uma união e estes indicadores devem estar intrinsecamente ligados aos elementos sustentáveis. E é por esse caminho que estamos a seguir. 

Como é que foi ser CEO em tempo de pandemia? Mudou alguma coisa na sua forma de liderança?
Francamente, só posso transmitir o que penso e acho que não. Talvez poucas pessoas o saibam, mas quando a pandemia começou, não havia ninguém nas estradas. Portanto, os colaboradores da área dos sinistros, e até mesmo das restantes áreas, estavam com pouco trabalho. E o que fizemos de imediato – é assim que penso enquanto CEO –, contactei o presidente da Associação de Hotelaria e pedi-lhe todos os lençóis dos hotéis que não estivessem a ser usados. Marquei reuniões com uma empresa de máquinas de costura e pedi-lhes para comprar várias máquinas ao preço de fabrico e tornámo-nos numa empresa têxtil. Portanto, todas as pessoas que tinham tempo livre estavam a fazer máscaras, porque Portugal não tinha máscaras: não havia nos lares, nem nos hospitais, e, no final, estávamos a produzir 3000 máscaras por semana. Por isso, esta é uma forma de agir enquanto CEO. Temos de estar sempre a pensar no que podemos fazer para ajudar a sociedade, porque se já temos as pessoas então podemos fazer alguma coisa. Agimos depressa, com um propósito. Não podemos ficar sentados à espera. Não é aceitável. 

 

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