Separação de freguesias avança após veto de Marcelo: o que muda e quais os próximos passos?

A Assembleia da República prepara-se para confirmar o diploma da desagregação das freguesias, depois do veto do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa recusou promulgar o diploma, argumentando que existem dúvidas sobre a sua exequibilidade a tempo das eleições autárquicas de Outono, além de criticar falta de transparência no processo legislativo. No entanto, os partidos já anunciaram que vão confirmar a lei, garantindo que a separação das freguesias avançará conforme previsto.

Mas como se chegou até aqui? Quantas freguesias serão criadas? Como será feita a transição? E o mapa ficará finalmente estabilizado? Explicamos tudo.

Quantas uniões de freguesias querem separar-se?
No total, 188 pedidos de desagregação deram entrada na Assembleia da República. Desses, 135 foram aprovados, o que significa que 135 uniões de freguesia vão ser separadas e voltarão ao modelo pré-2013.

Quantas freguesias serão criadas?
A separação destas uniões resultará na criação de 302 novas freguesias, que voltarão a ter a mesma configuração que tinham antes da reforma administrativa de 2013. Essa reforma, conhecida como Lei Relvas, reduziu o número de freguesias em Portugal de 4260 para as atuais 3092.

Como foi feita a análise e aprovação dos processos?
O processo legislativo seguiu vários passos:

  • As assembleias de freguesia aprovaram a intenção de desagregação.
  • Os processos foram enviados para as assembleias municipais, que também deram o seu aval.
  • Os pedidos foram remetidos para o Parlamento, onde passaram pela análise de uma comissão técnica especializada e de um grupo de trabalho parlamentar.
  • Inicialmente, a lista aprovada continha 124 uniões e 274 freguesias, mas os partidos decidiram alargar o número de casos aprovados.
  • A versão final da lei, com 135 uniões e 302 freguesias, foi votada a 17 de janeiro de 2024 e aprovada com os votos favoráveis do PS, Bloco de Esquerda, PCP e Livre, a abstenção do Chega e o voto contra da Iniciativa Liberal.

Porque é que Marcelo Rebelo de Sousa vetou o diploma?
Na mensagem enviada à Assembleia da República a 12 de fevereiro, Marcelo Rebelo de Sousa apontou três razões para o veto:

  • Dúvidas sobre a implementação do novo mapa a tempo das eleições autárquicas de Outono.
  • Falta de transparência no processo parlamentar, com alterações de última hora feitas pelos partidos.
  • Falta de envolvimento das autarquias na definição do novo modelo de governação das freguesias.

Apesar destas críticas, os partidos decidiram não alterar o diploma e avançar com a confirmação do texto original.

O Parlamento pode ignorar o veto presidencial?
Sim. De acordo com a Constituição, quando o Presidente da República veta uma lei, a Assembleia pode confirmar o diploma com maioria absoluta (116 votos). Se isso acontecer, Marcelo Rebelo de Sousa será obrigado a promulgar a lei no prazo de oito dias.

Quando será votada a confirmação da lei?
A votação final deverá ocorrer a 28 de fevereiro. O PS, Bloco, PCP e Livre já anunciaram que vão confirmar o diploma. O PSD, que inicialmente mostrou dúvidas, também já declarou que votará a favor, garantindo a maioria necessária.

O Chega, apesar de criticar o processo, disse que só votaria a favor se a lista fosse reduzida à versão inicial — o que não vai acontecer. A Iniciativa Liberal mantém o voto contra.

Quando é que as novas freguesias começam a existir?
As freguesias só passam a existir oficialmente quando forem eleitos os novos órgãos autárquicos, nas eleições autárquicas do Outono. O governo ainda não marcou a data exata, mas a lei determina que o sufrágio decorra entre 22 de setembro e 14 de outubro de 2024.

Como será feita a transição?
Até às eleições, os atuais executivos das uniões de freguesias mantêm-se em funções. Serão criadas comissões de extinção e de instalação para gerir a separação das uniões e a criação das novas freguesias.
A comissão de extinção será responsável por encerrar as uniões de freguesia. A comissão de instalação preparará o funcionamento das novas freguesias até à tomada de posse dos novos eleitos.
Ambas as comissões serão presididas pelo atual presidente da união de freguesias e terão representantes de todos os partidos locais e cinco cidadãos da nova freguesia.

Que critérios permitiram a separação?
As uniões de freguesia tiveram de cumprir um conjunto de requisitos para serem desagregadas, incluindo:

  • Mínimo de eleitores: Pelo menos 750 eleitores por freguesia desagregada (ou 250, no caso de territórios do interior).
  • Critérios territoriais: A freguesia não pode ter mais de 25% da área do município e, no caso das freguesias urbanas, não pode ter menos de 2%. Além disso, o território deve ser geograficamente contínuo.
  • Sustentabilidade financeira: Demonstração de viabilidade económica e equilíbrio orçamental.
  • Infraestruturas mínimas: A nova freguesia tem de ter pelo menos quatro equipamentos públicos, como escolas, parques, associações culturais ou centros de apoio a idosos.
  • Recuperação da identidade anterior: As freguesias desagregadas devem recuperar os mesmos limites geográficos e o nome original.

Quem poderá candidatar-se à presidência das novas freguesias?
A lei da limitação de mandatos continua a aplicar-se. Um presidente de uma união de freguesias que está a cumprir o terceiro mandato consecutivo não poderá candidatar-se à presidência de uma das freguesias desagregadas.

Depois desta desagregação, o mapa de freguesias fica definitivo?
Não necessariamente. A Assembleia da República já criou um grupo de trabalho para analisar novos pedidos de separação, que foram entregues ao abrigo do regime geral.

Atualmente, existem oito processos em análise, e os deputados comprometeram-se a tentar resolvê-los a tempo das autárquicas. Caso contrário, essas freguesias terão de esperar mais quatro anos, uma vez que não há eleições intercalares para estes casos.

O que esperar nos próximos meses?
Com a confirmação do diploma pelo Parlamento, a desagregação das freguesias vai avançar e as 302 novas freguesias serão oficialmente criadas nas eleições autárquicas de setembro ou outubro de 2024.

Nos próximos meses, os trabalhos estarão focados em garantir a transição administrativa e operacional das uniões de freguesia que vão ser separadas. Ao mesmo tempo, o debate sobre o mapa autárquico poderá continuar, com novas freguesias a pedir separação e possíveis mudanças futuras.