Saneamento: consumidor pode pedir a partir de hoje compensação se serviço não for cumprido

Saúde pública e meio ambiente são os dois grandes valores a proteger por um eficaz serviço de saneamento de águas residuais. A condução de água potável até às nossas habitações é um direito humano, reconhecido pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Mas a evacuação segura para os seres humanos e os ecossistemas, depois do uso doméstico, é uma prerrogativa inseparável. Desde 2010 que o saneamento é também considerado um direito humano.

O uso do serviço de saneamento depende do pagamento de um valor calculado em função do volume de água mensalmente consumida, o que faz todo o sentido. Quanto mais água potável for usada, maior volume será descartado e precisará de ser tratado. O custo do saneamento vem discriminado na fatura mensal, tal como os dos serviços de abastecimento e tratamento de resíduos sólidos urbanos. Na soma das três parcelas, o saneamento tem, em regra, um peso entre 30% e 40% do total pago todos os meses.

Em outubro de 2024, entrou em vigor o novo regulamento da qualidade dos serviços de águas e resíduos. As entidades gestoras ficam obrigadas a cumprir um conjunto de critérios. Em caso de falha, a partir deste sábado,, indicou a DECO PROteste, têm de compensar financeiramente o consumidor. Mas este deve reclamar por escrito.

Chuva paga como água residual?

Enterrados nos solos dos meios urbanos, os coletores de águas residuais escapam, muitas vezes, à atenção dos cidadãos, ainda que tenham impacto direto na sua qualidade de vida. Recolhidas em nossas casas e conduzidas a estações de tratamento, as águas residuais podem retornar ao meio hídrico, onde serão novamente captadas e preparadas para uso humano.

Neste ciclo, cabe, contudo, uma importante nova etapa. À saída das estações de tratamento de águas residuais (ETAR), uma parte deveria ser aproveitada para a indústria, a agricultura, a lavagem de espaços públicos e de carros ou a rega de jardins e campos de golfe. Nestes usos, não é necessário recorrer a água potável, que implica um tratamento e, assim, um custo adicional. É, aliás, irracional usar água potável em tais atividades, que tanta falta faz em regiões assoladas por secas persistentes, como o Algarve.

Há um enorme porém. No nosso país, ainda é ínfimo o volume de água residual tratada com vista a estes contextos alternativos. Em 2023, segundo informação da Entidade Reguladora do Serviço de Águas e Resíduos (ERSAR), foram recolhidos 698 milhões de metros cúbicos de águas residuais nas casas dos portugueses. Mas só 13 entidades gestoras, das centenas que atuam nos municípios, prepararam águas residuais para reutilização. Falamos de 6,6 milhões de metros cúbicos, que representaram cerca de 0,4% de toda a água residual tratada em ETAR nesse ano.

Acontece que, em 2023, como em anos anteriores, algumas estações tiveram de tratar um volume superior ao recolhido nas casas dos portugueses, o que sugere infiltrações provenientes da chuva. Na maioria dos municípios, não existem coletores separados para águas residuais e pluviais, pelo que as últimas acabam por ser transportadas até às ETAR, onde recebem o mesmo tratamento. Uma tal infiltração implica um aumento de custos para as entidades gestoras, que a DECO PROteste espera não acabar refletido na fatura imputada ao consumidor doméstico.

Prioridade máxima à reabilitação da rede de saneamento

Apesar da cobertura equilibrada do País pela rede de saneamento, e de o serviço ter genericamente qualidade elevada, persistem algumas preocupações, sublinhadas no Plano Estratégico para o Abastecimento de Água e Gestão de Águas Residuais e Pluviais (Pensaarp), que, face ao incumprimento de muitas metas para 2020, traça novos desígnios a atingir até 2030.

O documento alerta para a persistência de descargas industriais sem pré-tratamento, devido à ausência de regulamentos ou ao seu incumprimento, o que causa problemas nas redes e nas ETAR. Reconhece ainda a existência de outras descargas indevidas, que dificultam o trabalho das ETAR e são focos de poluição. E revela inquietação perante novos poluentes, como substâncias farmacêuticas, cujos reais efeitos nos ecossistemas não estão ainda estudados.

Fixado o diagnóstico, o plano aponta prioridade máxima a dez objetivos, de que se destacam a reabilitação de coletores e a redução de inundações com origem na rede de drenagem, que estão intimamente ligados. Como? A degradação dos coletores pode levar a ruturas propiciadoras de inundações de águas residuais não tratadas, pondo em risco a saúde pública e os ecossistemas, mas também a integridade de pessoas e bens. Imagine-se o rebentamento de uma conduta. Aluimento de terras, desmoronamento de edifícios, acumulação de poluentes, libertação de fortes odores e acidentes pessoais são cenários possíveis.

A reabilitação de coletores e a ocorrência de inundações por águas residuais são critérios que as entidades gestoras estão obrigadas a cumprir, mas que têm obtido nota “insuficiente” nas análises da ERSAR. E, quanto mais as entidades gestoras adiarem o investimento em reabilitação, mais provável se torna o cenário de inundações por águas residuais não tratadas.

Em que situações pode o consumidor pedir uma compensação?

Além do Pensaarp 2030, outros instrumentos foram desenhados para melhorar o setor. Em março, o Governo apresentou a estratégia Água que Une, com medidas, a introduzir nos próximos anos, para a reabilitação de infraestruturas, incluindo de saneamento, e o reforço do investimento com vista ao aumento da reutilização de água residual tratada. No Algarve, a última medida é considerada prioritária, com execução até 2026, a fim de mitigar a escassez hídrica.

Mas não é tudo. Ainda em outubro de 2024, entrou em vigor o novo regulamento da qualidade dos serviços de águas e resíduos, que obriga as entidades gestoras ao cumprimento de um conjunto de critérios. A partir de 19 de abril deste ano, a falha na sua concretização pode traduzir-se numa compensação financeira ao consumidor, desde que este reclame por escrito.

Alguns exemplos? O consumidor pode reclamar se, na fatura, não vierem discriminados todos os serviços que lhe são prestados, como o de saneamento, e a respetiva tarifa.

Também pode fazê-lo na eventualidade de lhe ser cobrado um volume de águas residuais superior ao de água potável gasta – deve verificar os consumos na fatura.

Uma terceira possibilidade decorre da ausência do serviço de saneamento. Quando este não está disponível para o consumidor, não pode ser aplicada a tarifa fixa. Somada à tarifa variável, que depende do consumo de água, conduz ao preço final apresentado ao consumidor.

Este pode ainda reclamar se, após pedir o serviço de limpeza de fossas séticas, a entidade gestora não o executar num máximo de dez dias.

Mais um cenário? A queixa é cabível se, face a uma inundação no sistema público – prédios ou habitações particulares estão excluídos –, for solicitada a intervenção da entidade gestora e esta não acorrer em quatro horas.

Como reduzir as águas residuais em casa

Quanto mais água gastar, mais pagará de saneamento. Siga as dicas para poupar a carteira e o ambiente.

Não desperdiçar

Instale redutores de caudal nas torneiras. Feche a torneira enquanto lava os dentes ou se ensaboa. Tome duches rápidos em vez de banhos. Limpe os orifícios de saída de água do chuveiro: o calcário aumenta o consumo de energia para aquecer a água. Conserte autoclismos e torneiras que pinguem.

Reutilizar

Recolha a primeira água do duche até chegar a quente: use-a para lavar o chão ou regar plantas. Faça o mesmo à água usada para lavar fruta e legumes.

Descartar os resíduos no lixo ou no ecoponto

Não deite na sanita produtos químicos, restos de comida, cabelos, cotonetes, algodão, pensos, fraldas, toalhetes, areia de gato, medicamentos, cigarros, óleo e azeite, tintas ou papel comum. Evita um gasto desnecessário de água potável para descartar estes resíduos e problemas nas estações de tratamento de águas residuais.