Roubos, revendas e…frangos: O mistério dos cereais ucranianos que nunca chegaram a bom porto

O navio cargueiro Razoni, sob a bandeira da Serra Leoa, atracou no dia 2 de agosto na entrada norte do estreito do Bósforo para ser inspecionado pelas autoridades turcas, ao abrigo de um acordo traçado entre a Rússia e a Ucrânia, com o respaldo da Turquia e das Nações Unidas, para recuperar o fluxo de cereais ucranianos para os mercados mundiais.

Depois de receber luz verde, terá zarpado para o porto de Trípoli, no Líbano, onde descarregaria 26 mil toneladas de cereais. Contudo, depois de retomar a navegação, o Razoni ficou retido a Sul da Turquia, e o embaixador ucraniano em Beirute, capital libanesa, anunciou que o Líbano tinha recusado a carga por o envio ter chegado com um atraso de cinco meses, conta o jornal ‘El Confidencial’.

Depois da recusa, o Razoni acabou por dirigir-se, a 11 de agosto, ao porto turco de Mersin, onde terá descarregado apenas 1.500 de um total de 26 mil toneladas. Um comunicado da empresa de transportes marítimos Toros apontava que uma empresa turca teria comprado 5% do total de cereais do Razoni, para serem depois revendidos, e que a restante carga seria transportada agora para o Egipto.

Contudo, um especialista contou à mesma publicação espanhola que se suspeita que o destino final do navio seja, afinal, a Síria.

Yörük Isik salienta que “é muito possível que a carga se tenha deteriorado, por ter estado durante tantos meses em condições de humidade”, quer a bordo dos navios, quer nos silos nos portos de Odessa, na Ucrânia, onde estiveram retidos desde o início da guerra a 24 de fevereiro. E essa terá sido a razão pela qual o Líbano recuso o carregamento de cereais.

Ainda, outro problema que está a perturbar a navegação do Razoni será o roubo da sua carga. “Há quantidades massivas de cereais ucranianos roubados que navegam pelo Bósforo, até portos turcos e outros portos do Mediterrâneo oriental, sobretudo para a Síria”, diz o especialista.

Fontes contam à agência ‘Reuters’ que, no domingo, o Razoni se aproximava do porto de Tartous, na Síria, depois de estar há já vários dias a navegar sem o sistema de comunicações ativo. A Ucrânia já tinha acusado o governo sírio de estar a comprar cereais que teriam sido roubados dos portos ucranianos.

Em junho, Kiev e Damasco cortaram relações diplomáticas, depois da Síria ter reconhecido a independência das regiões pró-russas de Luhansk e Dontetsk, nas regiões orientais da Ucrânia que estão sob ocupação dos militares da Rússia.

Nenhum país parece querer assumir a responsabilidade dos navios cargueiros a partir do momento que eles deixam os portos ucranianos.

As promessas do acordo que o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, descreveu como “um farol de esperança no Mediterrâneo” parecem estar por cumprir, uma vez que os 16 navios que até hoje já saíram da Ucrânia carregados com centenas de toneladas de cereais não chegaram a nenhum dos países que lutam contra a fome das suas populações, como a Somália, a Etiópia e o Afeganistão, aponta o ‘El Confidencial’.

A maior parte dos cereais estarão a ser direcionados para a indústria da exploração animal, por exemplo, para fazer rações para alimentar produções de frangos, e não para mitigar diretamente as ameaças de fome que se abatem cada vez mais sobre as populações mais vulneráveis. Reduzir os preços dos cereais nos mercados mundiais está a assumir prioridade sobre a alimentação das pessoas em risco de fome, avança o mesmo órgão de comunicação.

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