Quanto tempo ‘aguentaria’ a humanidade após o nascimento do último bebé? A ciência responde

Num mundo onde, subitamente, deixassem de nascer bebés, quanto tempo duraria a espécie humana? Essa é a questão que Michael A. Little, professor emérito de Antropologia da Universidade de Binghamton (State University of New York), explora num artigo publicado originalmente na The Conversation, no qual traça um cenário inquietante sobre o desaparecimento gradual da humanidade.

Segundo o autor, a esperança média de vida da maioria das pessoas não ultrapassa os 100 anos. Por isso, se cessassem todos os nascimentos, seria previsível que a população mundial desaparecesse ao longo de um século. Contudo, o declínio não seria imediato: “Mesmo que todos os nascimentos cessassem de um momento para o outro, esta diminuição começaria de forma lenta”, explica Little.

Com o passar das décadas, a ausência de jovens adultos disponíveis para exercer funções essenciais — desde a produção de alimentos ao fornecimento de cuidados de saúde — provocaria o colapso das sociedades. A escassez alimentar surgiria, apesar de haver menos bocas para alimentar, e a civilização acabaria por ruir. “Provavelmente não restariam muitas pessoas dentro de 70 a 80 anos, devido à falta de alimentos, água potável, medicamentos e tudo aquilo de que hoje dependemos para sobreviver”, sublinha o especialista.

Embora um cenário destes pareça improvável, Little admite que um desastre global poderia precipitar o fim da reprodução humana. O professor recorda o romance Galápagos, de Kurt Vonnegut, onde uma doença altamente contagiosa torna inférteis todas as pessoas em idade reprodutiva. Outra hipótese seria uma guerra nuclear sem sobreviventes — uma ideia já explorada em inúmeros livros e filmes de ficção científica.

Little destaca ainda duas obras que retratam futuros distópicos marcados pela infertilidade: The Handmaid’s Tale, de Margaret Atwood, e The Children of Men, de P. D. James. Ambas desenham um mundo de sofrimento e desordem, onde a impossibilidade de ter filhos conduz à perda de liberdade e esperança.

Curiosamente, o autor recorda que nos anos 60 e 70 do século passado o receio era o oposto: o medo de que o crescimento populacional excessivo conduziria à catástrofe, cenário que também inspirou obras distópicas.

A população mundial continua a crescer, mas o ritmo abranda
Atualmente, o número de habitantes do planeta continua a aumentar, embora a um ritmo mais lento. As projeções indicam que a população mundial atingirá um pico de 10 mil milhões na década de 2080, comparando com os cerca de 8 mil milhões atuais e os 4 mil milhões registados em 1974.

Nos Estados Unidos, por exemplo, vivem hoje cerca de 342 milhões de pessoas — mais 200 milhões do que na década de 1930, quando Michael A. Little nasceu. Em 2024, nasceram 3,6 milhões de bebés no país, menos do que os 4,1 milhões registados em 2004. Em contrapartida, o número de óbitos subiu de 2,4 milhões em 2002 para 3,3 milhões em 2022.

Para o antropólogo, o equilíbrio entre jovens e idosos será cada vez mais crítico: “Os jovens são frequentemente o motor da sociedade. São eles que implementam novas ideias e produzem tudo o que utilizamos. Ao mesmo tempo, muitos idosos precisam da ajuda dos mais novos para atividades básicas como cozinhar ou vestir-se”, afirma.

Queda das taxas de natalidade e desafios da fertilidade
Em várias regiões do mundo, as mulheres optam por ter menos filhos do que as gerações anteriores. Esta tendência é particularmente acentuada em países como a Índia e a Coreia do Sul. Para Little, o declínio populacional resultante pode ser atenuado através da imigração, embora barreiras culturais e políticas frequentemente dificultem esse caminho.

Paralelamente, o investigador alerta para um fenómeno crescente: o aumento dos problemas de fertilidade masculina, que poderá agravar ainda mais a queda da natalidade caso se acentue.

A lição dos Neandertais e os riscos da extinção
O professor recorda que, apesar de a espécie Homo sapiens existir há pelo menos 200 mil anos, nenhum ser vivo está imune ao risco de extinção. O exemplo dos Neandertais, nossos parentes próximos, é elucidativo: surgiram há cerca de 400 mil anos e desapareceram há 40 mil anos. Alguns investigadores sugerem que o sucesso reprodutivo superior dos humanos modernos terá contribuído para o desaparecimento dos Neandertais.

Se a humanidade se extinguisse, surgiriam oportunidades para outras espécies prosperarem. Contudo, Michael A. Little lamenta essa possibilidade: “Seria triste ver desaparecer todas as grandes conquistas da humanidade, desde as artes às ciências”, diz.

Para evitar esse desfecho, o especialista defende medidas concretas: “Precisamos de controlar as alterações climáticas, evitar guerras e valorizar a biodiversidade, que é essencial para um planeta saudável para todos os seres, incluindo os humanos.”