
Putin já tem plano para a mesa de negociação com Trump… e ninguém vai gostar
A chamada do presidente americano Donald Trump a Vladimir Putin foi vista como um sucesso pelo próprio presidente russo. É o que sempre quis: falar com Trump em nome de todos os europeus e ucranianos. Os dois líderes vão conversar cara a cara num tipo de reconhecimento da Rússia semelhante ao de 1945, quando Estaline conversou com Franklin D. Roosevelt em Yalta para decidir o futuro da Europa.
Disso mesmo deu conta a imprensa russa, dependente do Kremlin, com manchetes como “Zelensky entra em pânico: Trump prepara-se para estripar a Ucrânia como se fosse um arenque” (‘Moskovsky Komsomolets’); “Este diálogo permitirá atingir os objetivos que traçámos no início da Operação Militar Especial” (‘Rbk’); ou “Putin conseguiu derrubar a cortina de ferro que o Ocidente colocou sobre a Rússia« (‘Ura’).
Resta saber se o resultado final das negociações será igualmente frutífero para a Rússia, mas é interessante tentar compreender como o Kremlin está a abordar a negociação em si, o que ajudará a compreender as próximas semanas.
De acordo com o jornal espanhol ‘El Confidencial’, na mesma mensagem em que Trump anunciou a conversa com Putin, estabeleceu também a composição da equipa negociadora americana: o secretário de Estado, Marco Rubio, o diretor da CIA, John Ratcliffe; o conselheiro de segurança nacional Michael Waltz; e o enviado especial para o Médio Oriente, Steve Witkoff, que esteve em Moscovo na semana passada e conseguiu a libertação de Marc Fogel, um professor americano que estava preso na Rússia há mais de três anos. É revelador que Keith Kellogg, o enviado dos EUA à Rússia e à Ucrânia, não tenha sido incluído, uma vez que assumiu uma posição mais dura em relação a Moscovo – uma pequena concessão a Moscovo.
É provável que nos próximos dias vejamos pequenos sinais de Moscovo que, com esforço mínimo, mantenham os americanos numa posição construtiva em relação à Rússia, o que já contribuiu para alcançar os objetivos de Putin na Ucrânia. Por exemplo, com mais trocas de prisioneiros, libertando prisioneiros de guerra ucranianos e, talvez no futuro, enviando alguém ‘de baixo escalão’ para negociações com Zelensky.
Assim, de acordo com alguns especialistas, a intenção pode passar por anunciar um acordo durante as celebrações do 80º aniversário do Dia da Vitória, a 9 de maio, com um simbolismo extremo para um Putin obcecado pelo fardo histórico. Ou então, continuar as hostilidades.
Entre a equipa de negociadores poderá estar Yuri Ushakov, diplomata veterano que serviu como embaixador nos Estados Unidos de 1998 a 2008, e que hoje é conselheiro do Kremlin em questões de política externa, e que poderá substituir Vladimir Medinsky, o ‘escritor fantasma’ dos discursos de Putin, que liderou as negociações de 2022. A sua posição era absolutamente ideológica, em linha com a visão de Putin sobre a história, a Rússia e a Ucrânia. Outros analistas consideraram-no um propagandista sem autoridade ou influência, um sinal de que Putin não pretendia realmente negociações de paz com a Ucrânia.
Mas Putin não aposta tudo nas negociações. Afinal, não se afastou dos seus objetivos maximalistas: uma Ucrânia absolutamente subordinada à Rússia (com soberania apenas no nome), a sua capacidade militar eliminada, a sua Constituição reescrita e com garantias de não admissão na NATO. Uma posição que Trump, por mais que acene com a cenoura, pode acabar por não aceitar.
Donald Trump quererá um cessar-fogo e um acordo que deixe de lado a questão da Ucrânia durante algum tempo. Mas “a sua visão ainda difere radicalmente da de Putin. E não se engane, Putin está totalmente preparado para o fracasso destas negociações”, sublinhou Tatiana Stanovaya, investigadora do think tank ‘Carnegie Russia Eurasia Center’.
“Do ponto de vista do Kremlin, não há nada que o Ocidente possa fazer para reverter os ganhos territoriais da Rússia e evitar o colapso a longo prazo da Ucrânia. Com a ajuda de Trump, este processo poderia ser acelerado; sem a sua ajuda, isso acontecerá mais cedo ou mais tarde. Entretanto, Putin continuará a persuadir e apaziguar Trump, oferecendo concessões que ele apresentará como um grande sucesso e um negócio maravilhoso. Mas estas concessões (como um cessar-fogo) não impedirão a Rússia de atingir o seu objetivo final”, concluiu Stanovaya.