Professores envelhecidos e com salários a ‘encolher’, investimento estagnado, e menos alunos sem Ensino Secundário: OCDE traça retrato da Educação em Portugal

O relatório Education at a Glance 2024, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que é hoje apresentado, oferece uma análise detalhada sobre os sistemas educativos de vários países, incluindo Portugal, com um foco específico na equidade educacional. O documento sublinha avanços importantes no contexto português, ao mesmo tempo que identifica desafios persistentes, desde o nível de qualificação da população até às desigualdades regionais e questões associadas ao corpo docente.

Redução da população sem ensino secundário
Uma das conclusões principais do relatório é a redução da percentagem de jovens adultos portugueses sem conclusão do ensino secundário. Entre 2016 e 2023, a proporção de adultos entre os 25 e os 34 anos sem qualificação de ensino secundário diminuiu 12 pontos percentuais, situando-se agora em 18%. Apesar de este valor ainda estar 4 pontos percentuais acima da média da OCDE, representa um progresso considerável nos últimos anos. No entanto, o relatório alerta para as grandes disparidades regionais, com algumas áreas a registarem diferenças de até 30 pontos percentuais entre as regiões com maior e menor número de adultos sem qualificação de ensino secundário.

Impacto da qualificação no mercado de trabalho
A falta de qualificação tem um impacto significativo no mercado de trabalho. Em Portugal, 72% dos adultos entre os 25 e os 34 anos sem o ensino secundário estão empregados, um valor superior à média da OCDE, que é de 61%. Entre aqueles que completaram o ensino secundário ou pós-secundário não superior, a taxa de emprego é de 85%. No entanto, quem não possui estas qualificações enfrenta o risco de auferir salários baixos. Cerca de 9% dos trabalhadores com menos do que o ensino secundário em Portugal ganham menos de metade do rendimento mediano (aproximadamente 953,70 euros por mês), em comparação com 6% dos trabalhadores com ensino secundário e 3% dos licenciados.

Participação no mercado de trabalho e a desigualdade de género
Apesar dos progressos, persiste uma clara desigualdade de género. Embora as mulheres superem os homens em resultados educativos, enfrentam piores condições no mercado de trabalho. No grupo etário dos 25 aos 34 anos, 89% das mulheres com ensino superior estão empregadas, comparado com 87% dos homens. Porém, as mulheres continuam a ganhar, em média, apenas 80% do salário dos seus colegas masculinos com a mesma qualificação. Esta diferença salarial de género é especialmente pronunciada entre mulheres e homens com qualificações superiores.

Correlação entre a educação dos pais e o sucesso dos filhos
Outro dado relevante destacado pelo relatório é o forte impacto do nível educativo dos pais no sucesso académico dos filhos. Em Portugal, 79% dos adultos cujos pais têm uma licenciatura também alcançaram uma qualificação de ensino superior. No entanto, apenas 21% dos adultos cujos pais não completaram o ensino secundário conseguem concluir uma licenciatura. Estes valores são consistentes com as médias da OCDE, que são de 72% e 19%, respetivamente.

Desigualdades no acesso à educação infantil
Portugal é elogiado por não ter um “gap” significativo entre o fim da licença parental paga e o início da educação infantil gratuita. No entanto, o relatório chama a atenção para a menor participação de crianças de famílias com baixos rendimentos em serviços de creche. Apenas 45% das crianças entre 0 e 2 anos de famílias no terço inferior de rendimento frequentam cuidados infantis, comparado com 70% das crianças do terço superior. Esta diferença de 25 pontos percentuais é maior do que a média da OCDE, que é de 19 pontos.

A participação em educação infantil é crucial para reduzir as desvantagens no desenvolvimento antes da entrada no ensino primário. Em Portugal, 100% das crianças de 5 anos estão matriculadas no pré-escolar, uma taxa superior à média da OCDE de 96%.

Taxas de repetência e conclusão do ensino superior
Portugal apresenta taxas de repetência ligeiramente superiores à média da OCDE. No ensino primário, 2,2% dos alunos repetem de ano, enquanto 2,8% o fazem no ensino secundário inferior e 3,6% no secundário geral. Estes valores são superiores à média da OCDE, respetivamente 1,5%, 2,2% e 3,2%.

Quanto à conclusão do ensino superior, 75% dos estudantes com pelo menos um dos pais com licenciatura completam os seus estudos no tempo previsto, comparado com 72% daqueles cujos pais têm menos do que o ensino secundário. Este dado reforça a importância do ambiente familiar no sucesso educativo.

Investimento financeiro na educação
O relatório revela que Portugal investe 5% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em instituições educativas, o que está em linha com a média da OCDE. O gasto anual por estudante em Portugal é de 11.752 dólares, inferior à média da OCDE de 14.209 dólares. A despesa por aluno varia consoante o nível de ensino: 10.469 dólares no ensino primário, 12.511 no ensino secundário e 12.252 no ensino superior.

Além disso, 89% do financiamento para o ensino primário provém de fontes públicas, ligeiramente abaixo da média da OCDE, que é de 93%. No ensino pré-escolar, a percentagem de financiamento público é de 67%, comparado com uma média da OCDE de 86%. No ensino superior, o financiamento público cobre 61% dos custos, também abaixo da média de 68%.

Desafios na carreira docente
O relatório destaca ainda vários desafios que afetam os professores em Portugal. Entre 2015 e 2023, os salários nominais dos professores do ensino secundário inferior com 15 anos de experiência aumentaram 14%. No entanto, este aumento não foi suficiente para acompanhar a inflação, resultando numa diminuição real de 4% no valor dos salários. Este contraste é notável em relação à média da OCDE, onde os professores registaram um aumento real de 4% no mesmo período.

O tempo de ensino também varia significativamente. Em Portugal, os professores do ensino secundário inferior têm uma carga horária anual de 616 horas, abaixo da média da OCDE de 706 horas. Esta diferença reflete-se nas condições de trabalho e, por vezes, na qualidade do ensino.

Outro dado preocupante é o envelhecimento do corpo docente em Portugal. Em 2023, 57% dos professores do ensino secundário inferior tinham 50 anos ou mais, um aumento significativo face aos 33% registados em 2013. Este envelhecimento é muito superior à média da OCDE, onde apenas 36% dos professores estão nessa faixa etária.

Conclusão
O relatório da OCDE Education at a Glance 2024 revela que, apesar dos avanços significativos no sistema educativo português, como a redução da população sem ensino secundário e a diminuição da taxa de jovens NEET, continuam a existir desafios substanciais. Entre eles, destacam-se as desigualdades regionais no acesso à educação, a disparidade de género no mercado de trabalho, e o impacto do nível educacional dos pais nos resultados dos filhos.

Além disso, o envelhecimento do corpo docente e a perda de poder de compra dos professores em termos reais são questões críticas que necessitam de atenção urgente para garantir a sustentabilidade e a qualidade do sistema educativo em Portugal.

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