Portugal ‘vira costas’ aos F-35 produzidos pelos EUA e já está a negociar novo caças Gripen com empresa sueca

A fabricante sueca de defesa Saab confirmou que está em conversações com o Governo português para uma possível venda dos caças JAS 39 Gripen, no âmbito da substituição da frota nacional de F-16, atualmente em fim de vida útil. A revelação foi feita por Micael Johansson, presidente executivo da empresa, numa entrevista ao jornal sueco Dagens Industri, onde adiantou que Portugal está a avaliar o Gripen como uma alternativa viável aos F-35 norte-americanos.

“Estamos em discussões com Portugal e vamos apresentar o que a Saab pode oferecer. Depois, veremos se consideram o Gripen uma alternativa viável”, afirmou Johansson, confirmando assim que as negociações decorrem numa altura de crescente incerteza geopolítica e reposicionamento estratégico por parte do Ministério da Defesa português.

A abertura de Portugal a opções europeias surge na sequência de declarações do ministro da Defesa, Nuno Melo, que em março expressou reservas quanto à aquisição dos F-35 da Lockheed Martin, apontando a imprevisibilidade crescente da política externa dos Estados Unidos, sobretudo num cenário de eventual regresso de Donald Trump à presidência.

“A recente posição dos Estados Unidos, no contexto da NATO e no plano geoestratégico internacional, tem de nos fazer pensar as melhores opções, porque a previsibilidade dos nossos aliados é um bem maior a ter em conta”, afirmou Nuno Melo ao Público, acrescentando que “há várias opções que têm de ser consideradas”, sobretudo “no contexto de produção europeia”.

O ministro sublinhou ainda que a continuidade operacional dos F-35 poderá enfrentar “limitações na utilização, na manutenção, nos componentes”, apontando para uma crescente dependência tecnológica e logística dos Estados Unidos, que considera incompatível com a autonomia estratégica desejada por Portugal.

Projeto de renovação da Força Aérea
Até agora, tudo indicava que Portugal iria avançar com a compra de 27 caças F-35A, num contrato avaliado em 5,5 mil milhões de euros a ser pago ao longo de 20 anos. A Lockheed Martin promoveu diversos workshops no país e manteve um contacto estreito com a Força Aérea, procurando alinhar as especificações do caça de quinta geração com as necessidades operacionais nacionais.

Contudo, as recentes alterações no panorama internacional e o discurso de Nuno Melo abriram espaço à avaliação de três alternativas europeias: o Dassault Rafale francês, o Eurofighter Typhoon (consórcio de empresas europeias) e o Gripen sueco. O fator do retorno económico e industrial é uma das variáveis decisivas para o Governo português, que tem insistido na importância do envolvimento da indústria nacional no processo de fabrico e manutenção dos novos caças.

A Saab tem procurado destacar-se precisamente neste ponto, através da oferta de parcerias industriais com transferência de tecnologia. Um exemplo paradigmático é o contrato assinado com o Brasil em 2014, que previa a venda de 36 aeronaves Gripen. A colaboração com a Embraer resultou na instalação de uma linha de montagem local, com forte envolvimento de técnicos e engenheiros brasileiros na produção das aeronaves.

Este modelo de cooperação pode beneficiar o chamado cluster aeronáutico português, caso Portugal opte pela proposta sueca. A Saab tem-se mostrado disponível para replicar este modelo de parceria em novos contratos, o que pode funcionar como argumento decisivo para Lisboa.

Gripen vs. F-35: vantagens e limitações
O JAS 39 Gripen é um caça multifunções da geração 4.5, destacando-se pela sua elevada versatilidade, custos de aquisição e operação mais baixos, e por um avançado sistema de guerra eletrónica. A aeronave pode transportar mísseis com alcance até 200 quilómetros e apresenta uma forte relação custo-benefício quando comparada com os F-35, cuja tecnologia furtiva os torna praticamente invisíveis aos radares, sendo uma plataforma de quinta geração.

Apesar disso, o Gripen também apresenta fragilidades. Cerca de um terço dos seus componentes provêm de empresas norte-americanas, incluindo o motor — fabricado pela General Electric — o que poderá expô-lo a eventuais restrições de exportação dos EUA, especialmente num cenário de tensões políticas ou comerciais.

Até ao momento Ministério da Defesa não confirmou oficialmente as negociações com a Saab. O silêncio do Governo mantém em aberto todas as hipóteses, numa altura em que as decisões sobre a modernização da Força Aérea portuguesa entram numa fase crítica.

Ao mesmo tempo, outros países aliados da NATO, como o Canadá, também têm ponderado a aquisição de caças europeus, após episódios de tensão diplomática com os EUA, como as tarifas aduaneiras de 25% impostas por Donald Trump e declarações controversas sobre a soberania canadiana.

A decisão portuguesa sobre os caças que substituirão os F-16 poderá, assim, marcar um ponto de viragem na política de defesa nacional e no alinhamento estratégico do país face aos seus parceiros internacionais.